O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Petrobras cai sem a farra de dividendos

Publicado em 08/03/2024 às 15:40

As ações da Petrobras despencaram mais de 10% na B3 e na Bolsa de Nova Iorque depois que a companhia anunciou o lucro de R$ 31,043 bilhões no 4º trimestre, com alta de 16,6% sobre o 3º trimestre e redução de 28,4% sobre o último trimestre de 2022. Com a baixa do barril do Brent em 18,14% de 2022 para 2023, e o “abrasileiramento” dos preços domésticos, com abandono do PPI e uso mais intenso do petróleo mais leva do pré-sal nas refinarias, os preços domésticos da gasolina e do diesel caíram 20,1% no ano passado.

Isso explica a retração de 33,8% no lucro líquido anual, que atingira o recorde de R$ 188,328 bilhões em 2022, mas recuou para R$ 124,606 bilhões em 2023, quando a companhia, não só deu uma trava na liquidação de ativos, como decidiu reinvestir, sobretudo na transição energética do parque de refino e na extração de petróleo, visando reduzir a emissão de CO2 e produzir combustíveis mais limpos. Uma das metas é a produção de hidrogênio verde.

Diante de um plano consistente de investimentos, a companhia vinha anunciando ao longo do ano que seria mais conservadora na distribuição de dividendos. A Política de Remuneração aos Acionistas, aprovada em 28 de julho de 2023, prevê que, em caso de endividamento bruto igual ou inferior ao nível máximo de endividamento definido no plano estratégico (atualmente US$ 65 bilhões), a empresa deverá distribuir aos seus acionistas 45% do fluxo de caixa livre.

Acionistas reclamam

Por isso, como lucrou R$ 31,043 bilhões no 4º trimestre, o Conselho de Administração da Petrobras aprovou a distribuição de R$ 14,2 bilhões do lucro referente ao último trimestre de 2023. Exatamente 45,74% do lucro do período. Assim do lucro anual de R$ 124,606 bilhões (33,8% menor que o de 2022) a estatal vai distribuir um total de R$ 72,4 bilhões. Após os dividendos, a companhia fez reservas legais de R$ 43,9 bilhões. Mas a queda frente aos exorbitantes R$ 194,6 bilhões distribuídos em 2022, de 62,8% na distribuição de dividendos, como era de se esperar, desagradou aos acionistas.

Na votação da proposta na reunião do Conselho de Administração da companhia que aprovou o resultado do trimestre, a discussão da proposta de distribuição menor de dividendos dividiu o Conselho. O presidente da companhia, Jean Paul Prates, que tinha proposta a distribuição de 50% (temendo o abalo nas cotações da estatal) acabou se abstendo, quando os cinco membros que representam o governo deram maioria de votos à proposta do Ministério das Minas e Energia. Os quatro representantes dos acionistas minoritários ficaram contra a redução da remuneração, claro.

A reunião criou tantos ruídos que a Petrobras só anunciou o balanço, em Fato Relevante ao mercado e à Comissão de Valores Mobiliários, às 23:12 da quinta-feira. Em condições normais, o balanço e a proposta da distribuição de dividendos seriam anunciados entre 19 e 20 horas, após o fechamento dos mercados no Brasil e em Nova Iorque, onde está listada. Hoje, às 13 horas as ações PN, que tinham fechado na véspera a R$ 40,39, e despencaram na abertura para a mínima de R$ 35,10, em queda de 11,12% no dia, reagiram para R$ 36,59, amenizando o tombo para 9,23%. Já as ações ON eram cotadas a R$ 37,14, com queda de 10%.

A farra de Bolsonaro

Em 2022, na ânsia de fazer caixa para cobrir os bilhões de reais em benesses eleitorais (aumento do Auxílio Brasil de R$ 400 para 600, seis mesadas de R$ 1 mil para taxistas e caminhoneiros até 31 de dezembro de 2022), o governo Bolsonaro forçou as estatais sob seu controle (sobretudo Petrobras, Banco do Brasil e outros bancos oficiais, como BNDES e Banco do Nordeste) a anteciparem ao máximo a distribuição de dividendos.

Na Petrobras, cujo lucro deu um salto com a escalada dos preços do petróleo e dos derivados, após a invasão da Ucrânia pela Rússia (o que trouxe dor de cabeça para Bolsonaro, até cortar os impostos federais e estaduais dos combustíveis a partir de 1º de julho) houve uma farra sem precedentes na distribuição de dividendos. Para um lucro inflado de R$ 188,328 bilhões (salto de 76,6% sobre os R$ 106,668 bilhões de 2021) a estatal distribuiu o recorde de R$ 194,6 bilhões em dividendos. Mais do que a soma de todas as demais companhias negociadas na B3.

O principal fator de aumento do lucro foi a alta de 43,1% no preço do Brent (referência ao petróleo exportado pela companhia e à fixação de preços dos derivados no mercado interno pelo sistema de paridade de preços internacionais). O PPI levava em conta a variação do dólar (teve queda de 4,4% em 2022, frente à média de 2021, e os preços internacionais, que dispararam, sobretudo após o boicote ao petróleo e gás russos pelos países integrantes da OTAN). Assim, os preços dos derivados faturados pela Petrobras nas refinarias subiram 51,9%.

Mas o “lucro” da estatal foi engordado pela acelerada venda de ativos. Além de poços e campos de petróleo em terra e água rasas, de alto custo, com a decisão estratégica de concentração na exploração dos campos gigantescos do pré-sal e em águas ultra profundas, com custos de extração bem mais baixos, a Petrobras, por decisão do governo Bolsonaro, que sonhava em privatizar a companhia caso fosse reeleito, pôs à venda redes de gasodutos e 50% do seu parque de refino. Entre as grandes refinarias, a venda mais expressiva foi da pioneira Landulpho Alves (BA), pela bagatela de US$ 1,65 bilhão ao fundo soberano Mubadala, dos Emirados Árabes Unidos.

Lula prometeu 'abrasileirar' os preços

Como é sabido, na campanha eleitoral, enquanto Bolsonaro prometia privatizar as estatais, como a Petrobras e o Banco do Brasil (em seu governo já tinha privatizado a Eletrobras, pedindo mesa no aumento de capital que facilitou aos acionistas aportar recursos no aumento de capital e assumir o controle), assim como na BR Distribuidora (antes controlada pela Petrobras), Lula prometi utilizar as estatais para promover o desenvolvimento e o bem estar da população.

No caso da Petrobras, a proposta era “abrasileirar” os preços dos combustíveis, com a substituição do PPI pelo uso do petróleo do pré-sal, que a Petrobras extrai a custos totais inferiores a US$ 30 por barril e a utilização mais intensa das refinarias. O pré-sal produziu o equivalente e 2,27 milhões de barris dia (em petróleo e gás), com aumento de 10% sobre 2022, e aumentou a participação na produção nacional para 78%. Já a utilização da capacidade instalada das refinarias chegou a 92% (88% em 2022).

O efeito para o consumidor foi uma queda de 20,1% nos preços dos derivados que tanto atazanaram a paciência de Bolsonaro que trocou cinco presidentes da Petrobras e acabou por cortar impostos federais e o ICMS dos combustíveis, energia elétrica e comunicações para ampliar suas chances de reeleição. Mas o eleitor preferiu Lula. E o seu governo está pondo a Petrobras em benefício do país e não apenas dos acionistas.

Distribuição dos dividendos

Se a AGO de 25 de abril aprovar a proposta do Conselho de Administração (a União tem maioria das ações com direito a voto), a proposta de distribuição de R$ 14,2 bilhões em dividendos equivalentes a. Caso haja aprovação da AGO, considerando o que já foi antecipado pela companhia ao longo de 2023, ajustados pela Selic, os dividendos totais do exercício de 2023 totalizarão R$ 72,4 bilhões.

Os dividendos propostos já levam em consideração o valor de ações recompradas no quarto trimestre de 2023 de R$ 2,7 bilhões e a correção pela SELIC sobre as antecipações de dividendos e JCP relativos ao exercício social de 2023, no valor de R$ 1,1 bilhão, que foram descontados do total da remuneração aos acionistas, conforme o disposto na Política e no Estatuto Social, respectivamente.

Os dividendos complementares do 4º trimestre serão pagos em duas parcelas iguais nos meses de maio e junho de 2024: Valor a ser pago: R$ 1,09894844 por ação preferencial e ordinária em circulação, sendo que: 1ª parcela, no valor de R$ 0,54947422 por ação preferencial e ordinária; e 2ª parcela, no valor de R$ 0,54947422 por ação preferencial e ordinária. As ações da Petrobras serão negociadas ex-direitos na B3 e na Bolsa de Nova Iorque a partir de 26 de abril.

O pagamento para os detentores de ações de emissão da Petrobras negociadas na B3 será realizado no dia 20 de maio e o da 2ª parcela em 20 de junho. Os detentores de ADRs receberão a partir de 28 de maio e 27 de junho, respectivamente. Os valores serão atualizados pela variação da taxa Selic de 31 de dezembro de 2023 até a data de cada pagamento.

OLM