O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Déficit nominal chega a R$ 1 trilhão

Publicado em 07/03/2024 às 13:10

A forte arrecadação de janeiro, quando entraram no caixa do Tesouro novas receitas da taxação sobre fundos exclusivos e houve reoneração de impostos federais sobre combustíveis, energia elétrica e comunicações, produziu o maior superávit primário, de R$ 102,1 bilhões (receitas menos despesas, sem contar os juros da dívida), desde 2001, quando o Banco Central iniciou a série do setor público consolidado. Em janeiro de 2023, o superávit foi de R$ 99 bilhões. No fim de 2023, o setor público fechou com déficit de R$129,573 bilhões. Em 12 meses até janeiro o setor público teve déficit de R$ 246 bilhões.

Entretanto, quando se considera os juros nominais do setor público consolidado, a conta muda: eles somaram R$ 79,9 bilhões em janeiro de 2024, contra R$ 52,3 bilhões em janeiro de 2023. As perdas de R$ 10 bilhões do Banco Central em operações de swap cambial em janeiro agravaram o peso dos juros (a baixa da Selic, de 11,75% para 11,25% ocorreu em 31 de janeiro, com validade para fevereiro; em janeiro de 2023 o BC teve ganho de R$ 16,1 bilhões em swaps). No acumulado em 12 meses, os juros nominais alcançaram R$ 745,9 bilhões (6,82% do PIB) em janeiro de 2024, contra R$ 621,0 bilhões (6,11% do PIB) nos 12 meses até janeiro de 2023.

O peso dos juros no déficit

Segundo o Banco Central, a dívida liquida total (a dívida bruta em títulos excluída a carteira do Banco Central para operações de compra e venda de títulos no “open market”) somava R$ 6,565 trilhões em janeiro. Do total, R$ 4,661 trilhões estavam indexados à taxa Selic, quase R$ 2 trilhões a índices de preços (IPCA, IGP-M e IGP-DI) e R$ 1,473 trilhão em juros pré-fixados.

Explica o Banco Central que cada baixa de 1 ponto percentual na Taxa Selic, reduz, ao longo de 12 meses, em R$ 48,9 bilhões os custos da dívida. Cada redução de 1 p.p. nos índices de inflação alivia em R$ 18,8 bilhões os custos anuais da dívida. Já a desvalorização de 1 p.p. na taxa de câmbio reduz em R$ 8,1 bilhões no horizonte de 12 meses. Do lado inverso, o movimento de alta encarece a dívida praticamente na mesma proporção.

Gráfico: Banco central
Quando se considera o resultado nominal do setor público consolidado, que inclui o resultado primário e os juros nominais apropriados, janeiro produziu quase um milagre: superávit de R$ 22,2 bilhões. Mas, no acumulado em 12 meses, o déficit nominal chegou a R$ 991,9 bilhões (9,06% do PIB), ante déficit nominal de R$ 967,4 bilhões (8,90% do PIB) em dezembro de 2023. Ou seja, mesmo com a redução da Selic em 2 de agosto de 2023, os custos dos juros aumentaram R$ 24,5 bilhões no período. O endividamento só não piorou porque o PIB cresceu. Mas o crescimento do PIB depende da baixa dos juros.

Autonomia com prejuízo?

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, defendeu esta semana proposta para ampliar a independência do BC, incluindo autonomia financeira, com uso dos recursos da “senhoriagem”, que é o lucro com a emissão e distribuição de papel moeda e outras taxas exclusivas. O objetivo é ter independência para fixar quadro salarial à margem do funcionalismo, para evitar a fuga de funcionários atraídos pelo setor privado.

Mas em janeiro deste ano, mês em que o Tesouro Nacional teve de cobrir R$ 36,5 bilhões em prejuízos do Banco Central referentes a 2022, o resultado primário líquido do BC foi negativo em R$ 145 milhões. O custo de juros foi de R$ 19,113 bilhões, gerando um déficit nominal final de R$ 19,258 bilhões. No ano passado o rombo primário foi de R$ 645 milhões.

Superávit na balança

Ao analisa o superávit de US$ 5,447 bilhões na balança comercial em fevereiro, embora abaixo dos US% 5,9 bilhões que esperava, o Itaú assinala que as exportações seguem em patamar elevado (US$ 23,5 bi), acima do registrado nos últimos anos e impulsionadas pelo desempenho do setor de petróleo. Importações (US$ 18,1 bi) vieram próximas do nível visto em 2022-23, mostrando sinais de aceleração na margem. O saldo em 12 meses ficou próximo de US$ 106 bilhões. A média móvel de três meses dos dados dessazonalizados e anualizados (MM3M SAAR) da balança segue em ritmo forte, próximo de US$ 120 bilhões na leitura do 2º mês do ano.

Para o Itaú, “a balança comercial começou o ano de 2024 em ritmo forte, acima do padrão sazonal para janeiro e fevereiro (...) com bom desempenho das exportações, enquanto as importações começam a dar sinais de alguma melhora na margem (destaque para aumento do Quantum de bens de capital e bens de consumo), o que tende a acomodar o superávit em 12 meses.

O Itaú projeta que o ritmo robusto do comércio exterior deve se manter nos próximos anos, com melhora estrutural da balança comercial brasileira. O banco projeta superávit de US$ 85 bi em 2024 e US$ 70 bi em 2025.

OLM