Cai otimismo à queda da Selic em 2024
A última Pesquisa Focus, feita semana passada pelo Banco Central junto a 150 instituições financeiras, consultorias e institutos de pesquisa, manteve a projeção de que a Taxa Selic, atualmente em 12,75% (após duas reduções de 0,50 ponto percentual nas reuniões do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), vai fechar o ano em 11,75% ao ano (mais duas quedas) e em 9% a.a., em dezembro de 2024.
Mas as recentes turbulências nos mercados globais, depois que o presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, advertiu que pode promover nova alta ainda este ano, além dos atuais 5,25-5,50% estabelecidos na pausa de setembro, vem mexendo com a moedas em todo o mundo. Já há vozes no mercado financeiro brasileiro advertindo para o risco de a Selic não poder cair à faixa de um dígito em 2024.
Os países que encurtaram o diferencial entre os juros americanos e os domésticos, estão sofrendo mais. O Brasil tem uma diferença considerável – mas ela, que chegou a iniciar o ano na faixa de 10 p.p. está agora em 5,25%, com tendência a fechar o ano abaixo de 5%.
O vento que vem do Sul
As turbulências no mercado de câmbio brasileiro são amplificadas pelas pressões de compra de dólares vindas da Argentina, a menor de três semanas do 1º turno das eleições, que até agora tem o ultra radical de direita, o obscuro economista Javier Milei, à frente do ministro da Economia, Sérgio Massa, que não evitou uma inflação de 124%.
O argentino é um saudoso da maior renda per capita do mundo, na 1ª Guerra. Na época, como um dos grandes fornecedores de alimentos aos dois lados em batalha na Europa, aproveitou o acúmulo de reservas para construir sua infraestrutura (ferrovias e o metrô de Buenos Aires, que já concentrava a população do país).
Há mais de um século os argentinos se acostumaram a ter reservas em dólar (até embaixo do colchão. Seu mercado financeiro em pesos sempre foi pequeno, comparado com o do Brasil, quando se focaliza o giro diário de dólar. [A diferença advém da adoção da correção monetária, em meados de 1964. Criada para recuperar o crédito público e punir os devedores ao Fisco, a medida facilitou a expansão do crédito a longo prazo com moeda indexada (mas se tornou um forte fator de resistência à própria queda da inflação brasileira]. Mas, voltando à Argentina, a pequena escala da industrial do país (45 milhões de habitantes, menos de 25% do total do Brasil, por exemplo) foi definhando sua capacidade de competição no mundo, sobretudo com a globalização da economia provocada pela explosão econômica da China.
Como o ministro da Economia do governo de Alberto Fernández não evitou o aprofundamento da crise argentina, um país bem mais vulnerável que o Brasil, que tem um forte mercado interno e uma pauta de exportação bem mais diversificada (produtos manufaturados “made in Brazil” são comuns na Argentina), e o país à beira de um novo calote geral - as indústrias brasileiras têm alguns bilhões a receber - bateu às portas do FMI, solicitando empréstimo de US$ 7,5 bilhões.
Isso fez crescer em parte da população, descrente do populismo peronista, a aceitação das propostas radicais de Milei, como a dolarização da economia e a extinção do Banco Central. Num país sem reservas e sem Banco Central, quem vai garantir a circulação de dólares na economia? À beira do abismo, os argentinos têm até o dia 22 para pensar se se atiram à direita ou à esquerda.
Como ficam as apostas da Selic
No mercado financeiro – amanhã se encerra uma nova rodada semanal da Focus, a ser conhecida na 2ª feira, 9 de outubro – com os dados da semana passada, a mediana do mercado previa a Selic caindo até 11,75% este ano e 9% em dezembro de 2024. O Bradesco previa 11,75% em 2023 e 9,25% em 2024.
Mas o Itaú chegou a prever (até aqui) uma redução mais acelerada numa das duas últimas reuniões do Copom este ano (1º de novembro e 13 de dezembro) para o ano fechar em 11,50% e 9,00% em 2024. A taxa cairia 9,50% na reunião de maio e a 9,00% ao ano na de junho.
Entretanto, duas vozes bem mais cautelosas partem do Santander e da Genial Investimentos. O Santander, cujo departamento de Estudos Econômicos é chefiado pela economista Ana Paula Vescovi, Secretária do Tesouro no governo Temer, prevê a Selic fechando este ano em 11,75, e esperava, até a semana passada, redução a 9,50% para o final de final de 2024.
Entretanto, com a mudança do cenário externo e as dificuldades de cumprimento das metas fiscais, o informe da semana passada (o desta semana ainda não foi divulgado) embora não descarte “uma aceleração no ritmo de cortes até o final de 2023/início de 2024, o banco espanhol está mais “cético quanto à probabilidade de uma Selic muito menor do que 9,5% a.a. em 2024”.
Genial vê cenário pior
Visão mais pessimista tem a Genial Investimentos, cujo economista chefe é José Márcio Camargo. Ele lembrou que “a trajetória de aumento dos juros dos títulos longos do governo americano e valorização do dólar tanto frente a moedas fortes quanto frente a moedas de países emergentes e exportadores de commodities, começa a preocupar os investidores e os gestores da política monetária nestes países”, como já ocorreu no Brasil esta semana.
Ele adverte que “este movimento parece longe de ter terminado” (..) e “deverá prevalecer pelo menos até que o Federal Reserve (...) sinalize com clareza que o processo de aperto da política monetária no país, ou seja, de aumento das taxas de juros, tenha chegado ao fim”. Neste sentido “o comportamento dos juros futuros e do câmbio, diminui o espaço para a continuidade deste processo de queda dos juros, na medida em que o diferencial da taxa de juros entre Brasil e Estados Unidos está se reduzindo mais rapidamente que o esperado anteriormente, o que pode gerar fuga de recursos do Brasil e desvalorização cambial ainda mais rápida. O resultado é um aumento do limite inferior da queda da Selic” por cautela do Copom com o impacto do câmbio na inflação.,
Para José Márcio Camargo, “o cenário fica ainda mais difícil devido ao aumento do preço do petróleo, em dólares, decorrente da redução de oferta da Rússia e da Arábia Saudita. Diante deste cenário, os analistas começam a projetar que o final do atual ciclo deverá ser interrompido antes de a Selic atingir um dígito”. Na visão do Itaú, a Selic desceria a 10% na reunião de 20 de março.
A conferir.