Capital Group perde R$ 1,3 bi nas Americanas
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Com a demora do trio controlador das Americanas – Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, que detinham 30,13% das ações ON da companhia e quatro das sete vagas do Conselho de Administração – em definir o que farão para salvar a empresa, após a recuperação judicial de R$ 43 bilhões aprovada 5ª feira, 19 de janeiro, o Capital Group, o 2º maior investidor estrangeiro na empresa enviou comunicado às Americanas, no dia 20, informando que aproveitou a crise para vender 26,6 milhões de ações ordinárias (42,2775% do total), reduzindo a participação de 7,04% para 4,07% no capital. Mas a perda deve ter sido grande, pois as ações ON das Americanas, que chegaram a valer R$ 21 no dia 6 de outubro, foram excluídas do Ibovespa e estão cotadas hoje a R$ 0,77 (perda de 96%). Em setembro, o Capital Group chegou a deter 9,91% das ações ON.
Embora o comunicado tenha sido recebido pela Americanas na 6ª feira, 20, como relata o atual presidente e diretor de relações com investidores, João Guerra, em Fato Relevante que só comunica a informação ao mercado hoje, 2ª feira, às 8:48. Como o pronunciamento do trio controlador só ocorreu ontem, por meio de nota oficial, que não consta de nenhum Fato Relevante da companhia, parece claro que nos bastidores, os grandes investidores internacionais não estão nada satisfeitos e devem estar preparando munição contra o trio, que acabou rompendo o silêncio no domingo.
Perdas bilionárias
Virou piada nos meios econômicos a comparação com as ações das Americanas com o preço do chocolate Kit-Kat, que está valendo mais. Os próprios bilionários controladores das Americanas, em resposta às queixas dos acionistas nacionais e estrangeiros, que também participam das empresas que controlam no exterior (Burger King, Kraft-Heinz, além da Ambev e da Inbev (parceria da Ambev com a belga Interbrew, que gerou o maior grupo cervejeiro do mundo), dizem que também sofreram perdas bilionárias. Dá para medir.
No caso da Capital Group, se eles tinham um máximo de 63,414 milhões de ações ON (que estavam cotadas a R$ 21 no dia 6 de outubro), o patrimônio estava então avaliado em RF$ 1,331 bilhão. Não se sabe o preço médio das vendas feitas pelo grupo, desde o comunicado do então presidente, Sérgio Rial, de que haviam sido encontradas “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões, no dia 11 de janeiro, mas a posição de 20 de janeiro, reduzida a 36,770 milhões de ações ON valia apenas R$ 21,3 milhões, perda de R$ 1,3 bilhão, só nesse lote. Mas o grupo chegou a ter 9,91% das ON em setembro.
O fundo Blackrock, que detinha 5,05%, segundo a posição de setembro, pode ter tido perdas de R$ 700/800 milhões. E o trio controlador? Se não reduziram a posição (30,13%, ou pouco menos de 272 milhões de ações ON), o montante que chegou a valer R$ 57 bilhões em 6 de outubro, ficou reduzido a R$ 217,1 milhões na cotação de R$ 0,80, hoje, quando os papéis sobem mais de 14%.
Ou seja, para recuperar esse capital e, sobretudo, a reputação no mundo global das finanças (que é um ativo muito mais valioso – o trio é parceiro de Warren Buffet na Kraft-Heinz e já cogitou uma tomada de controle da Coca-Cola, da qual o bilionário de Omaha é um dos maiores acionistas), o trio terá de aportar pelo menos 10% das perdas (ou o dobro, dizem os especialistas) para dar liquidez às Americanas e recuperar sua credibilidade junto aos bancos, acionistas, fundos de investimentos e aos 16 mil fornecedores.
Anéis ou falsos brilhantes?
E não está afastada a possibilidade de venda de alguns anéis para salvar os dedos. A operação mais citada seria a venda da Hortifruti Natural da Terra. Mas a sinergia da empresa com as vendas online estimuladas pelo site das americanas.com seria exercida por quem? Pela Magalu? Os anéis têm o valor de antes da crise ou são olhados com a desconfiança de falsos brilhantes?
Uma questão interessante é medir os efeitos da crise das americanas nas atividades do fundo Blackrock. Parceiro na Americanas, onde tinha 5,05% do capital votante, o Blackrock era sócio, como o 3G Radar (um outro veículo de investimento do trio da 3G Capital) na Eletrobrás, na qual tiveram papel decisivo na privatização no ano passado, quando a União não compareceu à chamada de aumento de capital (“pediu mesa”), sua posição ficou em 33.05% das ações ON, o BNDES manteve 3,67% das ações ON, a BNDESPar, outros 3,16%, perfazendo 7,25% e o Fundo Nacional de Desenvolvimento controla outros 2,31%.
A fatia do governo ficou reduzida a 42,60% e o setor privado passou a dar as cartas com 57,40%, mas a União perdeu a representação proporcional às suas ações no Conselho de Administração. Nada menos de 50,71% do capital com direito a voto da Eletrobrás estão espalhados por investidores não identificados no mapa de controle acionário.
O 3G Radar tem 0,05% das ações ON (0,04% do capital total) e 10,88% das ações PN (1,32% do capital total), somando 1,36% do capital total. O Blackrock tinha a maior posição individual (4,68%) entre os acionistas com direito a voto (ONs), correspondendo a 4,11% do capital total e 4,65% das ações PN (0,57% do capital total), somando 4,68%. Há suspeitas de operações combinadas entre os dois acionistas para aplicar na Eletrobras o método do grupo 3G para extrair o máximo de rentabilidade dos capitais investidos. Mas qual o método? Com fraude ou sem fraude?
Como evitar retalhar a Eletrobras
No desenho da consolidação do Sistema Eletrobrás, após as operações da Itaipu Binacional e da Eletronuclear ficarem de fora do bolo, absorvidas pela Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional (Enbpar), as subsidiárias Furnas Centrais Elétricas S.A. (o ativo mais valioso do sistema), Centrais Elétricas do São Francisco (Chesf) e Eletronorte ficariam sob domínio da “holding” que centralizaria todas as operações. Cada uma das empresas teria apenas três diretorias básicas: operacional, de administração e financeira, para manter a contabilidade. Tudo o mais ficaria na “holding”.
Com o enorme enxugamento do quadro de pessoal, que atingira 8.500 colaboradores antes da privatização, os sindicatos ligados à Eletrobrás querem ficar pendurados na Enbpar (o que parece também utópico). Nos planos da “holding”, que tinha 500 empregados, o contingente deve multiplicar por quatro ou cinco. Os demais que não aderiram ao PDV seriam demitidos. Em princípio, há garantia de emprego até meados de abril.
Quando era líder da minoria no Senado, o senador Jean Paul Prates (PT-RN) defendeu a manutenção estratégica da Eletrobrás sob controle da União para atender aos desafios da transição energética. Chegou a sugerir sua fusão com a Petrobras para fazer uma grande holding do setor energético, seguindo o desenho de algumas grandes nações produtoras de petróleo (Arábia Saudita, Catar, Malásia, e grandes petroleiras de atuação global.
Prates deve ser aprovado esta semana pelo Comitê de Elegibilidades da Petrobras, dentro do prazo máximo de oito dias úteis, para integrar o Conselho de Administração e assumir a presidência da Petrobras. Quem sabe, com a necessidade do trio controlador das Americanas levantar dinheiro para capitalizar a empresa, não se junta a fome com a vontade de comer do governo Lula, na direção de uma robusta empresa para gerar sinergias na transição energética?