O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

gilberto.cortes@jb.com.br

O OUTRO LADO DA MOEDA

Planejamento só teve um banco: o BNDES

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Publicado em 28/12/2022 às 12:53

Gilberto Menezes Côrtes JB

Só pode ter nascido de mentes terraplanistas – e estas, creio eu, eram e continuam sendo apoiadores de Jair Messias Bolsonaro – a ideia de que a senadora e 3ª colocada no 1º turno, Simone Tebet, só aceitaria o Ministério do Planejamento, com o comando da CEF e do Banco do Brasil. Os dois jamais pertenceram à orbita do Planejamento. O único banco que já esteve sob a aba do ministério enfeixado na pasta de Economia por Paulo Guedes, a partir de janeiro de 2019, foi o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.

O BNDES, que teve o ex-coordenador da campanha de Lula, o ex-ministro Aloysio Mercadante, anunciado para o seu comando, foi deslocado ao recriado Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Comércio Exterior, que caberá ao vice-presidente, Geraldo Alkmin. [acredito que Alkmin será um ministro interino e entregará o cargo assim que Josué Gomes da Silva, resolver a crise de comando na Fiesp e a sua sucessão na Coteminas, o maior grupo têxtil do Brasil, fundado por seu pai, o saudoso José Alencar Gomes da Silva].

Desde os primórdios da República, o Banco do Brasil, que era o verdadeiro caixa do Tesouro até a criação do Banco Central do Brasil, em 31 de dezembro de 1964, pertencia ao Ministério da Fazenda. Quando o BC foi criado, o BB perdeu a faculdade de emitir dinheiro quando ampliava sua carteira de empréstimos. Mas, o BC só teve suas funções totalmente apartadas do BB e do Tesouro Nacional em 1988, após a Constituição determinar a plena separação, obra conduzida pelo secretário-adjunto do Tesouro, Pedro Parente.

Da mesma forma a Caixa Econômica Federal, a velha Caixa Econômica e Monte Socorro, fundada em 1861, por D. Pedro II, sempre foi vinculada à pasta da Fazenda. Muita gente faz confusão sobre o papel da CEF porque com a extinção do Banco Nacional de Habitação, cujas funções assumiu em 1986, no governo Sarney, a Caixa se transformou no grande banco da habitação.

Quando havia o BNH, ele estava na órbita do Ministério do Interior e sua atuação, vinculada ao uso dos recursos do FGTS, estava relacionada aos programas habitacionais e ao Plano Nacional de Saneamento (Planasa).

Ter BB e CEF era exorbitância

O Ministério do Planejamento, que é o responsável pela elaboração do Orçamento Geral da União e pelos Orçamentos Plurianuais de Investimento (no passado, nas gestões de João Paulo dos Reis Velloso, surgiram o I Plano Nacional de Desenvolvimento do governo Médici e o II PND do governo Geisel), tem sob sua órbita o IBGE e o Ipea.

O 1º colhe informações as mais variadas possíveis sobre a inflação, os índices econômicos (da agricultura, da indústria, do comércio e dos serviços), as taxas de desemprego e indicadores como o Censo, realizado há cada 10 anos (o de 2020 foi adiado para 2022 e ainda não terminou). Com base nos levantamentos do Censo e das projeções populacionais do IBGE, são calculadas anualmente as fatias de participação dos estados e municípios nas receitas federais e estaduais (que, como se sabe, são arrecadadas em cada município). Estes levantamentos do IBGE apontam áreas carentes que pedem maior atenção na formulação das políticas públicas.

O Ipea, antes de ser desvirtuado no governo Bolsonaro, que minimizou o papel do Estado, fazia estudos amplos para avaliar os efeitos das políticas públicas.

Mas a ambição de abiscoitar no Ministério do Planejamento a CEF, diante dos programas sociais que apoia, como o Minha Casa, Minha Vida e o plano de saneamento, parece ser exorbitância. Melhor seria pleitear o fatiamento da CEF, com a recriação do BNH e o uso do FGTS. Mas o BNH acabou com um rombo de bilionário porque o uso político do banco pelo então ministro do Interior, Mário Andreazza, que, ao ambicionar suceder o general Figueiredo, fez o governo abater, por dois anos seguidos (em 50%, em 1982 e 1983), a correção monetária dos saldos devedores da casa própria.

Andreazza perdeu para Maluf a indicação como candidato do PDS na eleição indireta no Colégio Eleitoral, em 1984. Deu Tancredo e o rombo ficou, como sempre acontece, para ser pago pelo contribuinte.

Para fechar este esqueleto do BNH, assim como outros esqueletos da Velha República e do regime militar (como estatais e contas mal fechadas do Tesouro Nacional) a carga tributária foi elevada no governo Fernando Henrique Cardoso da faixa de 23% do PIB para mais de 30% (hoje está em 35% do PIB).

Se queria ficar com a CEF, então era melhor Simone Tebet pleitear as cidades, pois é nas cidades (municípios) que surgem programas habitacionais e de saneamento, mesmo com o avanço da atuação do setor privado nessa área.

Tebet queria levar o PPI (Plano Plurianual de Investimentos, que faz parcerias público-privadas, e tinha sido deslocado à Casa Civil, sob a gestão de Ciro Nogueira) e vai continuar na Casa Civil com Lula. Para não ficar à margem do PPI, Simone vai integrar o Conselho Gestor do PPI, que terá participação de vários ministérios e o BNDES. Ou seja, terá de dividir o poder decisório.

Haddad não quer prorrogação de isenção a combustíveis

Segundo Fernando Haddad, o atual Ministro da Economia, Paulo Guedes, teria concordado em não adotar nenhuma medida que impacte no próximo governo. O futuro ministro da Fazenda também disse que no início de janeiro, o governo Lula irá analisar, junto com os governadores, a questão da oneração dos combustíveis que tem impactos na inflação e nas contas públicas em 2023.

É que os decretos eleitoreiros de Paulo Guedes para turbinar a reeleição de Bolsonaro também reduziram o ICMS de combustíveis, energia elétrica e comunicações, o que desfalcou a arrecadação de estados e municípios.

A LCA Consultores estima que só a volta da cobrança do PIS e Confins na gasolina, etanol e diesel, tem impacto de 0,8 ponto percentual no IPCA de 2023, tudo o mais constante. A receita fiscal que pode ser obtida será de R$ 53 bilhões (a renúncia fiscal estimada em 12 meses seria da mesma ordem). A LCA prevê no cenário para 2023, um IPCA de 5,2% e de um déficit primário de R$ 80 bilhões, já com a volta do PIS e Cofins.

A LCA prevê muita incerteza no campo fiscal em 2023. Isso levará o Banco Central a ser prudente na redução da taxa Selic (em 13,75%), porque como os principais bancos centrais estão elevando os juros para conter pressões inflacionária, a redução do diferencial de juros com o Brasil pode gerar fuga de capitais do país. A LCA estima que a Selic fechará 2023 em 12,50%.

Juros altos tolhem o crescimento

Após alta estimada de 2,9% para o PIB de 2022, a LCA está prevendo aumento de apenas 0,5% no PIB de 2023, com provável crescimento zero neste último trimestre de 2022 e risco de recessão nos dois primeiros trimestres de 2023. Tudo como reflexo de a economia ter sido turbinada para “bombar” nas vésperas da eleição, e o fôlego já ter acabado em outubro e a situação se estender para 2023.

Em condições normais, o PIB cresceria menos em 2022 e mais em 2023.

Mercado de trabalho desacelera

Outra consequência dos juros elevados será a desaceleração do ritmo da criação de empregos. A tendência se acentuou neste último trimestre de 2022. Hoje, o Ministério do Trabalho e Previdência divulgou os dados do Caged de novembro, com a criação líquida de apenas 135.495 empregos. Os números são os menores de todo o 2º semestre (só perdem no ano para os 97.488 de março). Em relação às 162.039 vagas de outubro houve queda de 16,36% e, frente a novembro de 2021, a queda passa de 56%.

A contabilização das vagas criadas no Caged deve atingir 2,125 milhões neste ano, nos cálculos da LCA. Entretanto, as previsões da LCA para 2023 são de que apenas 1.205 milhão de vagas sejam criadas. Uma redução de 43,3%.

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