
O OUTRO LADO DA MOEDA
A estranha inflação da caneta em 2022
Publicado em 23/12/2022 às 13:24
Alterado em 23/12/2022 às 13:24

O IBGE divulgou hoje o IPCA-15, que é a prévia do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, que será divulgado em 10 de janeiro. A inflação de 2022 baixou a 5,90%, comparada aos 10,42% de 2021. A queda foi influenciada pela redução eleitoreira, a partir de julho, dos impostos (federais e do ICMS, estadual) de combustíveis, energia elétrica e comunicações, feita a canetadas do governo Bolsonaro nos preços mais críticos e de maior peso nos 377 itens pesquisados no IPCA, como a gasolina. Em dezembro, o IPCA-15 teve alta de 0,52%, 0,01 ponto percentual abaixo de novembro (0,53%). Em dezembro de 2021, o IPCA-15 foi de 0,78%.
Com isso, o item Transportes, que foi o grande vilão de 2021, quando registrou alta de 21,15%, caiu 1,01% no ano, puxado pela baixa de 23,69% dos combustíveis. Comunicações baixou 1,17% (alta de 1,04% em 2021). Já Habitação, que teve alta de 14,67% no ano passado, puxada pela energia elétrica, subiu só 0,24% (pela queda de 18,6% em energia elétrica, enquanto os combustíveis domésticos (GLP e gás natural) aumentaram apenas 7,84%.
Alimentação sobe o dobro da inflação
Na direção oposta, Alimentação e Bebidas, o item de maior peso no IPCA-15 (prévia do IPCA,), subiu 11,96%, mais do que o dobro da inflação geral e bem acima dos 8,68% de 2021. Um dos produtos que mais subiram em 2022 foi o leite longa vida (25,42%). As frutas subiram 30%, sendo superados pelos tubérculos (sobretudo batata inglesa), com alta de 37,05%, e farinhas e féculas (22,30%). Já com a queda da demanda pela China, os preços da carne bovina subiram, em média, apenas 2,45%, bem menos que os 7,77% de aves e ovos.
Mais aguda ainda foi a alta do Vestuário (18,39%), que liderou a carestia em 2022, quase dobrando o aumento de 9,39% em 2021. Saúde e Cuidados Pessoais vieram a seguir, com aumento de 11,24%, puxado pela alta de 13,83% de remédios e de 16,59% dos artigos de higiene pessoal. Apesar do reajuste autorizado de 15,50%, os planos de saúde subiram só 6,89%, porque os aumentos só foram absorvidos na base de 1/12 avos, a partir do fim do 1º semestre, pressão que vai continuar no começo de 2023.
Por sinal, esse é o desenho para os principais itens do IPCA para 2023. Espera-se pressões continuadas em combustíveis, energia elétrica e comunicações, sobretudo se houver recomposição (ainda que parcial) das alíquotas do ICMS sobre a cesta de produtos destes itens (o ICMS, que chegava a 30/32%, foi reduzido a 17%). Houve disseminação maior de altas em dezembro, no IPCA-15, frente a novembro.
De outra parte, com a baixa da inflação de 2022, no entanto, haverá menor pressão na indexação de preços corrigidos a cada 12 meses, caso dos aluguéis, dos pedágios, das tarifas públicas em geral e das mensalidades escolares e dos planos de saúde. O próprio reajuste dos salários tende a caminhar por índices de reposição menores que os deste ano, influenciados pela alta acumulada de 12,13% registrada pelo IPCA cheio em abril.
Em julho, quando começaram as canetadas, a taxa acumulada em 12 meses baixou para 10,07%, vindo de 11,87% em junho. No último trimestre a taxa acumulada em 12 meses caiu para 6,47% em outubro e 5,90% em novembro. Como em dezembro de 2021 a inflação do IPCA cheio foi de 0,73%, se o IPCA mantiver a tendência do IPCA-15 (0,52%), a taxa em 12 meses ficará abaixo de 5,70%. O que representará uma desinflação acentuada. A questão é que a baixa segue desigual, em alimentos, vestuário e no setor de serviços.
A inflação desigual de 2022 e 2021
Item 2021 / 2022
IPCA-15 10,42% / 5,90%
Alimentação e Bebidas 8,68% / 11,96%
Habitação 14,67% / 0,24%
Artigos de Residência 12,18% / 8,39%
Vestuário 9,39% / 18,39%
Transportes 21,25% / -1,01%
Saúde e Cuidados Pessoais 3,46% / 11,24%
Despesas Pessoais 4,61% / 7,54%
Educação 2,62% / 7,37%
Comunicações 1,04% / -1,04%
Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados, sete subiram em dezembro. Os maiores impactos foram de Transportes (0,85%) e Alimentação e bebidas (0,69%), com 0,17 p.p. e 0,15 p.p. respectivamente. A maior variação, por sua vez, ficou com Vestuário (1,16%), recordista do ano. Saúde e cuidados pessoais (0,40%) desacelerou em relação a novembro (0,91%). Já Habitação (0,40%) teve variação pouco menor que a do mês anterior (0,48%). Os demais grupos ficaram entre a queda de 0,46% dos Artigos de residência e a alta de 0,39% de Despesas pessoais.
O grupo dos Transportes acelerou de novembro (0,49%) para dezembro (0,85%), em função da alta nos preços das passagens aéreas (0,47%), que haviam recuado quase 10% no mês anterior. Os preços dos combustíveis (1,79%) seguiram em alta, embora com resultado abaixo dos 2,04% de novembro. Com alta de 1,52%, a gasolina contribuiu com o maior impacto individual no índice do mês, 0,07 p.p., enquanto o etanol (5,44%) teve a maior variação entre os combustíveis pesquisados. Óleo diesel (-1,05%) e gás veicular (-1,33%) tiveram quedas de preços em dezembro.
Porto Alegre tem menor inflação, Rio a maior
Em função dos calendários de ajuste das tarifas públicas, sobretudo em energia elétrica e de água e esgotos, além dos transportes urbanos, Porto Alegre foi a capital brasileira a registrar a menor inflação no IPCA-15 em 2022 (3,93%), entre as 11 capitais com preços pesquisados pelo IBGE no IPCA-15, seguido por Belo Horizonte, com 4,72%. Ficaram abaixo da média nacional, Goiânia (5,03%), Curitiba (5,15%), Belém (5,78%) e Fortaleza (5,85%).
A maior inflação acumulada no IPCA-15 ocorreu no Rio de Janeiro, com alta de 6,92%, seguido por Salvador, com alta de 6,83%. São Paulo acumulou alta de 6,55% e Brasília teve inflação de 5,91%, mesmo índice de Recife. Os preços foram coletados entre 14 de novembro e 14 de dezembro, com base nas despesas das famílias com renda até 40 salários-mínimos (R$ 48.480).
Salário-mínimo ainda terá troco
Com a projeção do IPCA-15 de 5,90%, o salário-mínimo de 2023 poderá ficar abaixo dos R$ 1.400 prometidos por Jair Bolsonaro na campanha (embora tenha reservado no PLOA 2023 verba para pagar apenas R$ 1.302).
Como o presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva decidiu conceder reajuste real de 2,7% (relativo à variação do PIB em três anos), o novo valor pode chegar a R$ 1.320. Um aumento de R$ 18 frente ao valor reservado no OGU-2023 por Bolsonaro, mas R$ 80 abaixo dos valores prometidos na campanha.