
O OUTRO LADO DA MOEDA
Pacote da eleição só deflaciona em julho
Publicado em 18/07/2022 às 19:30
Alterado em 18/07/2022 às 21:17

O governo Bolsonaro driblou a Constituição, a Lei de Responsabilidade Fiscal, fez caridade com recursos dos Estados e Municípios (reduzindo o ICMS de energia Elétrica, Telecomunicações Combustíveis e estourou mais uma vez o teto dos gastos para seduzir o eleitor com um pacote de Bondades de mais de R$ 42 bilhões liberados diretamente nos bolsos dos brasileiros), mas a avaliação dos bancos e consultorias ouvidos pelo Banco Central na pesquisa Focus é de que a redução geral de impostos só dará uma trégua no IPCA em junho, quando ficaria negativo em 0,58%.
Em agosto, embora bem menor que a taxa do ano passado, já haveria alta de 0,12% no IPCA, por pressão dos alimentos e serviços. A rigor, o pacote de bondades terá como efeito reduzir para pouco mais de 1% a alta acumulada até o fim do ano no grupo de preços administrados (os visados pelo pacote), mas a pressão dos alimentos e dos preços industriais, além dos serviços, vai fazer o IPCA fechar o ano na casa dos 7,50%. Logo após o pacote de serviços, o Itaú chegou a prever deflação de mais de 1% em junho, mas a pressão de consumo exercida pela injeção de recursos na economia tende a pressionar outros bens e serviços, anulando parte do pacote deflacionário.
Qual a duração do efeito eleitoral?
A brevidade do impacto deflacionário do pacote de bondades, ainda que as taxas mensais esperadas para este segundo semestre sejam bem inferiores às de igual período do ano passado, é a questão que intriga os analistas econômicos e políticos, pois poderá determinar a sorte das eleições.
O governo Bolsonaro jogou todas as fichas na sedução dos eleitores, para que muitos mudem de posição, até aqui majoritariamente hostil ao governo.
Mas não se sabe se a elevação do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 (+50%), a duplicação do vale-gás, que será mensal, o alívio nas bombas de combustíveis, e a distribuição de bônus para várias categorias – tudo isso, por enquanto, até 31 de janeiro, evidenciando o interesse eleitoreiro – vai sensibilizar o eleitor.
Espera-se uma batalha de narrativas. Um primeiro ensaio não funcionou como o governo esperava: a entrega pelo governo Bolsonaro, dos pouco mais de 10% restante das obras de transposição das águas do São Francisco, para levar água aos habitantes do semi-árido nordestino, não alteraram muito a simpatia dos eleitores do Nordeste pelo presidente Bolsonaro e Lula mantém confortável vantagem no Nordeste.
Santander vê alta recorde da Selic
Os mercados financeiros globais seguem abalados pelos números elevados da inflação dos Estados Unidos em junho (1,3% e 9,1% em 12 meses) que pode levar o banco central americano, o Federal Reserve Bank, a elevar fortemente as taxas de juros na reunião de 26 e 27 de julho (uma semana antes da reunião do Copom, que deveria fazer o último aumento da Selic para 13,75% ao ano). Mas há sinais preocupantes no horizonte. Houve uma forte desaceleração da economia chinesa, com queda do PIB de – 2,6% no segundo frente ao primeiro trimestre de 2022, o que aumenta a probabilidade de que o objetivo de crescimento do PIB chinês em 2022 (5,5%) não seja alcançado. Nos EUA e na Europa, teme-se uma recessão a partir do último trimestre. Na expectativa de alta de juros nos EUA, o dólar reagiu em forte alta no mercado internacional, atingindo o nível mais elevado em mais de 20 anos, o euro atingiu o nível mais baixo no mesmo período, voltando à paridade em relação ao dólar, o real variou em torno de R$ 5,40/US$ 1,00, os preços das ações entraram em forte trajetória de queda e as taxas de juros em elevação, no Brasil e no resto do mundo.
Para o Santander, diante desse cenário, e tendo como pano de fundo a robustez da demanda doméstica e do mercado de trabalho nos EUA, o Federal Reserve deve elevar novamente os Fed Funds em 75 p.b. na reunião de julho, antes de desacelerar para um ritmo de 50 p.b. por reunião até fevereiro de 2023, quando o Fed encerraria o ciclo em 4,5% ao ano, “num dos apertos monetários mais intensos nas últimas décadas”.
Para o banco espanhol, a combinação de políticas monetárias mais apertadas e crescimento global mais fraco deve gerar um ambiente global desafiador para as economias emergentes, com os exportadores de commodities (como o Brasil) podendo mostrar maior resiliência por mais tempo devido aos efeitos macroeconômicos dos preços de matérias-primas em patamar elevado.
O Santander acredita que o caráter até aqui temporário do pacote tende a impulsionar a economia (elevou de 1,2% para 1,9% a previsão do PIB deste ano), mas também pressionará os bens que ficaram fora do pacote, fazendo repicar a inflação para 2023, que reajustou de 5,3% para 5,7%. Para 2023, entretanto, o banco acredita que a reversão do cenário interno, agravado pelos déficits fiscais e a possível recessão global, vai fazer o PIB encolher 0,6%.
E o efeito mais pernicioso de pressões de preços e de gastos fiscais pode levar o Banco Central, em meio a um cenário “cercado de incerteza e volatilidade acima do usual” (...) e, diante de ”um contínuo aumento nas expectativas de inflação, uma deterioração adicional no balanço de riscos (com novos impulsos fiscais para a demanda doméstica) e evidências de redução adicional da ociosidade econômica (com fortes números de emprego), a intensificar o aperto monetário”.
Na análise do Departamento de Estudos Econômicos do Santander, comandado pela ex-secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, para a “rápida desinflação projetada pelos modelos da autoridade, o BCB deve usar uma estratégia de suavização da taxa de juros (ou seja, evitando um pico mais acentuado neste ciclo, mas mantendo os juros mais altos por mais tempo)”.
Ainda assim, o Santander identifica a necessidade de um aperto adicional na taxa Selic para que o BCB (em sua ótica) possa trazer a inflação mais perto do centro da meta em 2023. A filial brasileira do banco de Ana Botin projeta agora “uma taxa Selic terminal de 14,25% no ciclo (com duas altas de 0,50 p.p. em agosto e setembro), ante nossa projeção anterior de 13,50%”.
E também adiou a expectativa para o início do processo de cortes de juros em 2023 (antes prevista para junho) e vislumbra uma convergência mais lenta para o nível estrutural de 7% (2025). O banco revisou a trajetória esperada para a Selic para 12,00% ao fim de 2023 (antes: 10,50%) e 9,00% ao fim de 2024 (antes: 8,00%).