O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Após pacote, Bradesco vê PIB zero em 2023

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Publicado em 04/07/2022 às 16:11

Alterado em 04/07/2022 às 16:11

Gilberto Menezes Côrtes JB

O mercado financeiro está fazendo revisões frenéticas para ajustar o cenário de 2022 e de 2023 ao pacote de bondades de mais de R$ 41 bilhões para tentar aliviar no bolso do eleitor os aumentos da energia elétrica, das telecomunicações e dos combustíveis, mediante redução de ICMS (estaduais), impostos federais, além de injeção de R$ 50 bilhões em recursos direcionados para várias categorias de eleitores. Tudo válido apenas até 31 de dezembro.

Devido ao corte dos impostos, bancos e consultorias reduziram as projeções de inflação deste ano e elevaram a projeção do crescimento do PIB de 2022. Mas o cenário de 2023 ficou prejudicado com o aumento das incertezas fiscais e pressões inflacionárias transferidas para o ano que vem. Todos elevaram a inflação esperada para 2023 e reduziram o crescimento do PIB.

A PEC dos benefícios fiscais, aprovada no Senado com só um voto contra (José Serra), a ser votada esta semana em 2º turno na Câmara, aumenta o valor mensal do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, cria um voucher caminhoneiro de R$ 1.000 por mês, e eleva o vale gás para famílias carentes, entre outros benefícios, tem um custo fiscal de aproximadamente R$ 50 bilhões, a ser pago fora do teto do gasto público. O efeito geral fragiliza o teto do gasto público e aumenta o risco fiscal do país

O resultado dessas idas e vindas do pacote, que começou com a intenção de reduzir impostos para derrubar a inflação e passou a embutir subsídios diretos a milhões de eleitores, alargando o risco fiscal, foi que a tendência à valorização do câmbio no início de 2022 (quando muitos achavam que a alta das commodities, provocada pela invasão da Ucrânia pela Rússia, beneficiaria o Brasil e países emergentes) se reverteu. Desde o começo da discussão da PEC no início de junho, o real se desvalorizou mais de 10%.

 

Itaú: cai a 7,5% em 2022 e sobe a 5,6% em 2023

O Itaú, que ainda não fez novas revisões sobre as projeções do PIB (a taxa deste ano foi elevada de 1% para 1,6% em meados de junho), reduziu de 8,7% para 7,5% a previsão do IPCA deste ano. Mas elevou a taxa do ano que vem de 4,2% para 5,6%, prevendo efeito bumerangue das medidas de redução de impostos, por sua validade acabar este ano. E manteve em 0,2% a previsão de crescimento do PIB em 2023.

A LCA Consultores está prevendo alta de 0,9% no 2º trimestre encerrado em 30 de junho, o que garantiria crescimento de 1,6% no PIB deste ano. Para o 2º semestre, a previsão é negativa: -0,4% neste 3º trimestre (julho a setembro) e queda mais acentuada de 0,7% no último trimestre de 2022. No 1º trimestre de 2023 (quando sempre há o impacto positivo da safra agrícola, colhida até março, com destaque para a soja), a LCA prevê aumento de apenas 0,1% (com o indicador sendo arrastado para baixo pelo desempenho negativo de indústria e serviços), A Consultoria espera que o PIB cresça só 0,8% em 2023, metade do previsto para este ano.

 

Queda dos ativos em junho

A Genial Investimentos considera que o cenário desenhado pelo pacote das bondades teve forte influência no desempenho dos diversos ativos no mês de junho, quando o mercado começou a precificar o aumento do risco fiscal no Brasil, diante da adoção de políticas expansionistas. A abertura da curva de juros pressionou para baixo a cotação dos ativos de risco. O Ibovespa teve queda de 11,5% no mês, quando o dólar subiu 10,5%. Mas a previsão de queda da inflação até o fim do ano e o 1º trimestre de 2023, reduziu na 6ª feira os juros do contrato do DI com vencimento em janeiro de 2023 para 13,69%, o para janeiro de 2025 cedeu a 12,63% e o de janeiro de 2027 recuou a 12,61%.

A escalada dos juros no cenário internacional mudou o cenário imaginado no 1º trimestre. Depois de atingirem recordes, as cotações das commodities, energéticas, agrícolas e minerais desceram ladeira abaixo, na razão inversa do cenário de elevação de juros pelos bancos centrais. Teme-se que a recessão atinja as economias do 1º mundo.

A aceleração generalizada da inflação na zona do euro para 8,6% ao ano em junho (8,1% em maio), da queda acima do esperado do PIB dos Estados Unidos no 1º trimestre de 2022 (-1,6%), da tomada da última cidade do leste da Ucrânia pelo exército russo e do afrouxamento das restrições à mobilidade urbana e “lockdowns” em Xangai e outras cidades chinesas, os preços dos ativos brasileiros na semana passada foi dominado pelo cenário interno.

 

Medo de recessão derruba preço do minério

Esse temor de uma forte desaceleração global tem afetado o minério de ferro (e as commodities de modo geral) com a redução da demanda. A China, maior consumidor de minério, vem reduzindo seus estoques de aço em reação à queda dos pedidos, que deixou várias de suas siderúrgicas ociosas. Com isso o preço do minério de ferro refinado com 62% de teor para entrega em agosto caiu para US$ 114,45%, baixa de 11,96% nesta 2ª feira.

 

Inflação sobe antes do pacote

O IPCA de junho será divulgado na 6ª feira, absorvendo o impacto dos últimos aumentos dos combustíveis nas refinarias da Petrobras, em 8 de junho, e o reajuste de 15,50% dos planos de saúde (rateado por 12 meses). No sentido baixista, continua atuando, com menor intensidade, a redução da bandeira hídrica para verde. O mercado espera alta de 0,65% para a inflação de junho. Como a taxa foi de 0,53% em junho do ano passado, haverá pequeno repique para cima na taxa de 12 meses do IPCA, que estava em 11,73% em maio.

A LCA consultores espera alta de 0,70%, o que elevaria o ICA em 12 meses para 11,92%. Já o Departamento de Estudos Econômicos dos Itaú prevê aumento de 0,73% no IPCA de junho, com a taxa em 12 meses alcançando 11,95%, com a leitura pressionada por alimentação no domicílio, bens e serviços, refletindo a dinâmica de inflação generalizada antes do pacote.

 

Bradesco prevê juros elevados

Ao analisar o cenário econômico em 1º de julho, o Departamento de Estudos Econômicos do Bradesco considerou que “o quadro fiscal ficou mais incerto nas últimas semanas (...) com “avanço de pautas que ampliam desonerações e dispêndios governamentais. Algumas medidas devem ficar restritas a 2022, mas outras têm caráter permanente, com consequências para a trajetória da dívida pública. As desonerações recentes reduzem a projeção de inflação para 2022, mas elevam a do próximo ano”. Mesmo com a mudança de preços relativos causada pelo pacote, o Depec não nota ”alteração do quadro inflacionário, que ainda requer atenção”.

Neste sentido, “a inflação exige que a taxa de juros permaneça elevada por um período mais prolongado”. A projeção do banco para Selic ao final de 2022 subiu de 13,25% para 13,75%. “Como o processo de desinflação será lento, o Banco Central só deverá reduzir os juros a partir do segundo semestre de 2023. Ao final do próximo ano, a taxa básica de juros deverá estar em 11,75%”.

É interessante notar que a piora prevista pelo Bradesco para o cenário internacional, com reflexos no desempenho da economia brasileira, não alterou a previsão de crescimento da economia mundial, que continua em 3,2% este ano e em 2023. Ou seja, além de reduzir pela metade o crescimento de 2023, o PIB brasileiro segue bem abaixo da economia global.

 

Comparação entre os cenários de junho e julho

Macaque in the trees
. (Foto: OLM)

 

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