O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

[email protected]

O OUTRO LADO DA MOEDA

Mercado prevê inflação de dois dígitos até julho

...

Publicado em 02/05/2022 às 15:29

Alterado em 02/05/2022 às 15:29

Gilberto Menezes Cortes CPDOC JB

O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) se reúne amanhã, para decidir 4ª feira, a trajetória da taxa Selic, diante de um dilema. Na última reunião, em 16 de março, quando elevou a Selic a 11,75% ao ano, o Banco Central anunciou que promoveria novo aumento de 1 ponto percentual em 4 de maio e encerraria o ciclo de alta em 12,75%. Mas a greve dos servidores do BC, que será retomada amanhã, após trégua semanal, sem resolução das reivindicações salariais, suspendeu por várias semanas a divulgação de estatísticas fiscais, monetárias, de crédito e da área externa, além das pesquisas semanais Focus e indicadores mensais, como o IBC-Br, prévia do PIB.

Pois hoje uma série de estatísticas veio a público. Com muitas indicações contraditórias. Do lado da expansão da economia, o IBC-Br de fevereiro apontou crescimento de 0,338% (0,34%) sobre janeiro, com ajuste sazonal, abaixo da expectativa do mercado (+0,40%). Mas a medição, com ajuste sazonal, do desempenho dos dois primeiros meses de 2022, aponta queda de 0,4% frente ao último bimestre de 2021. Na comparação com o 1º bimestre de 2021, houve queda de 0,7%. Mas nos últimos 12 meses, sem ajuste semanal, o IBC-Br cresceu 4,8% (acima dos 4,7% de crescimento do PIB em 2021).

Para o Copom, que atua para também neutralizar as expectativas da sociedade, tendo em vista que o horizonte da política monetária é tentar influir no cenário de 9 a 18 meses adiante, os indicadores mais preocupantes foram revelados pela Pesquisa Focus encerrada 6ª feira e divulgada nesta 2ª feira. A percepção do mercado foi de que a inflação de 2022 segue crescente (7,89% na mediana de 131 respostas do mercado, e 7,95% nas respostas de 102 participantes nos últimos 5 dias úteis), o mesmo ocorrendo para 2023 (4,10% e 4,12%, na mesma métrica).

 

Com inflação maior, Selic subirá mais

O mercado está pessimista com relação à inflação de abril. A redução nas tarifas de energia elétrica, com o fim da bandeira hídrica extra, não vai aliviar muito a escalada do IPCA em 12 meses, que irá superar os 12%. Mesmo com expectativa, na mediana do mercado, de que subirá bem menos que os 1,62% de março, com o impacto dos reajustes dos combustíveis em 11 de março), o IPCA avançaria 0,94%. Como a taxa em 12 meses estava em 11,30% em março e o IPCA subiu 0,31% em abril de 2021, a taxa maior em 2021 levaria a taxa em 12 meses a 12,00%. Na previsão do Itaú (1,01%), a taxa iria a 12,07%.

Apesar de as previsões do mercado na Pesquisa Focus indicarem desaceleração nas taxas mensais (1,62% em março, 0,94% em abril, 0,28% em maio e 0,41% em junho), o Itaú espera 1,01% em abril, 0,29% em maio e 0,46% em junho) - em maio de 2021 a taxa foi de 0,83%, de 0,53% em junho, de 0,96% em julho e de 0,87% em agosto -, a taxa em 12 meses fecharia o 1º semestre acima de dois dígitos e só desceria deste patamar em agosto, se ficar a menos de 0,30% em julho e agosto. Isso completaria um ciclo de 12 meses de inflação anual rodando na casa dos dois dígitos.

Num país com forte indexação de preços administrados e contratos pela inflação passado, isso jogo um componente inercial resiliente à queda da inflação, o que forçará o Banco Central (já ameaçado pela escalada dos juros nos Estados Unidos lhe tirar a ajuda da taxa de câmbio como neutralizadora de impactos da inflação externa. O ciclo de ajuste terá de ser mais forte e duradouro.

Em função disso, o mercado espera que a Selic tenha um ciclo de aceleração de meio ponto percentual, fechando em 13,25% este ano (com novo aumento na reunião de 16 de junho). Isso se nada de extraordinário ocorrer até 3 de agosto. E o ciclo de 2023 se encerraria em 9,25% (de acordo com a medida e em 9,50%, conforme as respostas dos últimos cinco dias úteis - há duas semanas a expectativa era de que o ciclo de 2023 se encerraria em 9%. E a taxa final de 2024 aumentou para 7,50%.

 

Escalada de juros afetará dívida

Tanto a escalada dos juros quanto a da inflação vão ter impacto no custo da rolagem da dívida. Nas estatísticas de fevereiro, quando a Selic ainda estava em 10,75%, o gasto mensal com juros somou R$ 26 bilhões. Descontando os custos das dívidas interna e externa, compostas com taxas Selic e juros pós e pré fixados, além de indexadas ao câmbio (dólar, euro, etc), o resultado primário do setor público (receitas menos despesas) foi um superávit de R$ 3,5 bilhões. Quando se computam os gastos com juros o déficit nominal chegou a R$ 22,5 bilhões (R$ 299,1 bilhões em 12 meses).

A Dívida Bruta do Governo Geral chegou a R$ 7 trilhões em fevereiro, correspondendo a 79,2% do PIB, com redução frente aos 82,4% de outubro de 2021, principalmente devido ao crescimento do PIB. Já a Dívida Líquida do Setor Público era de R$ 5,047 trilhões, correspondendo a 57,1% do PIB (era de 62,5% em dezembro de 2020, quando o PIB contraiu-se 3,9%).

Pelas contas do Tesouro Nacional, cada aumento de 1 ponto percentual na inflação gera, ao fim de 12 meses, uma despesa de R$ 15,3 bilhões da Dívida Líquida do Setor Público (que exclui a parte de títulos que está na carteira do Banco Central, para operações “over night”) e de R$ 15,2 bilhões na Dívida Bruta do Governo Geral; 1 p.p. na Selic encarece em R$ 34,1 bilhões a DLSP e em R$ 33,4 bilhões a DBGG, se mantida por 12 meses. Já a desvalorização de 1% na taxa de câmbio economiza R$ 12,1 bilhões da dívida líquida e encarece em R$ 5,8 bilhões da dívida bruta.

O câmbio este ano ajudou a reduzir gastos, mas no mês de abril a retomada de alta do dólar pode ter afetado novamente as contas. Em fevereiro, os juros nominais da dívida bruta somaram R$ 110,8 bilhões, mas os ganhos cambiais economizaram R$ 38,9 bilhões. As operações de swap também têm influência.

Os juros nominais do setor público consolidado, apropriados por competência, somaram R$26,0 bilhões em fevereiro de 2022, comparados a R$29,2 bilhões em fevereiro de 2021. Em 12 meses, os juros nominais somam R$422,5 bilhões (4,78% do PIB) em fevereiro de 2022, frente a R$316,5 bilhões (4,18% do PIB) nos 12 meses até fevereiro de 2021. O resultado nominal do setor público consolidado, no acumulado em 12 meses alcançou déficit de R$ 299,1 bilhões (3,38% do PIB), ante déficit nominal de R$ 317,5 bilhões (3,62% do PIB) em janeiro de 2022.

Tags: