
O OUTRO LADO DA MOEDA
IPCA: alívio na energia; pressão nos alimentos
Publicado em 09/02/2022 às 19:03
Alterado em 09/02/2022 às 19:03

Vilã da inflação de 10,06% do IPCA em 2021, a energia (elétrica residencial, do GLP e do gás natural, e dos combustíveis para transporte público e particular) começou o ano eleitoral de 2022 em queda, por redução política dos preços. Mas isso não foi suficiente para neutralizar a alta dos alimentos, devido aos impactos climáticos (seca no Sul e parte do Centro Oeste afetando a safra de grãos) e excesso de chuvas no Sudeste e na Bahia, que afetou a produção de café, hortaliças, legumes e frutas. O IPCA subiu 0,54% em janeiro, maior alta mensal desde 2016 e elevou a taxa em 12 meses para 10,38%.
Se o item Transporte subiu 21,03% em 2021, tendo a maior contribuição na inflação, seguido pelos 13,05% da Habitação (sob influência do GLP, gás natural e energia elétrica) e pela alta de 13,13% dos Artigos de Residência, enquanto a variação de Alimentos e Bebidas ficou em 7,94%, abaixo da inflação, o ano de 2022 começou com os dois primeiros itens em queda e os alimentos em alta. Transportes teve baixa de 0,11% em janeiro, reduzindo a variação em 12 meses para 20,41%. Na Habitação, a queda de 1,07% na tarifa de energia elétrica e de 0,35% no GLP, fez o item ter a 2ª menor variação no mês +0,16%, com variação de 14,45% em 12 meses.
Com as pressões de altas das frutas (3,40%) e as carnes (1,32%, com a continuidade das exportações de carne bovina para a China), embora tenham registrado altas menos intensas em relação ao mês anterior (8,60% e 1,38%), de 4,75% do café (a 11ª seguida, com variação de 56,87% em 12 meses), da cenoura (27,64%), da cebola (12,43%), da batata-inglesa (9,65%) e do tomate (6,21%), mesmo com as quedas de 2,66% no arroz, de 0,85% no frango inteiro e de 0,71% no frango em pedaços, o item Alimentação e bebidas subiu 1,11% em janeiro (mais do que o dobro dos 0,54% da inflação geral) e a alimentação no domicílio passou de uma alta de 0,79% em dezembro para 1,44% em janeiro, quase dobrando também.
Curiosamente, a Alimentação fora do domicílio subiu apenas 0,25% desacelerando em relação aos 0,98% de dezembro. A alta da refeição passou de 1,08% em dezembro para 0,44% em janeiro, enquanto o lanche que subira 1,08% em dezembro variou 0,41% em janeiro. O risco é haver repasse das altas em fevereiro. Tradicionalmente, a recomposição das safras de legumes, hortaliças e verduras demora de três a quatro meses. Portanto o primeiro trimestre ainda terá pressão nos alimentos.
Com alta de 1,82% o item Artigos de residência pesou 0,06% no IPCA, influenciado pela aceleração dos eletrodomésticos e equipamentos (2,86%), mobiliário (2,41%) e TV, som e informática (1,38%), que haviam subido em dezembro 1,77%, 2,07% e 0,70%, respectivamente.
Após subir 2,06% em dezembro, o grupo Vestuário variou um ponto menos em janeiro (1,07%), com altas nas roupas masculinas (1,64%), calçados e acessórios (0,97%) e menores em roupas femininas (0,78%). Minha mulher relatou, indignada, que a roupa que comprara em dezembro, estava sendo ofertada por menos 69% no fim de janeiro. São as trapaças da moda.
Preços administrados em baixa
Com exceção das comunicações, que subiram 1,05% em janeiro, os preços administrados, que subiram 16,9%% no ano passado, começaram o ano dando alívio (o Copom espera alta de 6,6%, acima da meta de inflação - de 3,5% + 1,50 p.p. de tolerância = 5% de teto). Os planos de saúde tiveram, queda de 0,69% em janeiro, reduzindo a 0,95% o reajuste em 12 meses.
Com a queda de 1,07% em função da redução do PIS/Cofins, a tarifa de energia elétrica residencial, que havia subido 0,74% em dezembro, aliviou o item Habitação, subindo apenas 0,16%. Outra redução importante foi a de 0,73% do gás de botijão, após 19 meses de alta. Mas o gás encanado subiu 3,13%, em função do reajuste de 17,64% em São Paulo (5,46%), vigente desde 10 de dezembro.
A queda no grupo dos Transportes (-0,11%) é consequência principalmente do recuo nos preços das passagens aéreas (-18,35%) e dos combustíveis (-1,23%). Além da gasolina (-1,14%), também houve queda nos preços do etanol (-2,84%) e do gás veicular (-0,86%). O óleo diesel (2,38%) foi o único a subir em janeiro. Entre os demais subitens do grupo, os destaques foram os transportes por aplicativo (-17,96%) e o aluguel de veículo (-3,79%).
PEC Kamikaze pressiona déficit e juros
No afã de reduzir os preços mais sensíveis da economia, que têm impacto no ânimo do eleitor, o setor político do governo está apostando na aprovação da PEC dos Combustíveis, que zera impostos (PIS/Cofins e ICMS) de combustíveis. O alívio na espiral dos preços administrados (em fevereiro e março haverá impacto do reajuste das mensalidades escolares) pode abrir um rombo fiscal da ordem de R$ 75 bilhões a R$ 100 bilhões.
Se uma coisa não aliviar a outra - ou seja se o alívio nos preços administrados não compensar a pressão atual dos alimentos e a inflação continuar aquecida até maio, próxima da casa dois dígitos -, a área econômica pode viver o pior dos mundos: haverá pressão pela manutenção dos juros elevados para além de maio (quando a Selic pode passar de 12,25%) e há quem preveja queda da Selic só em 25 de outubro ou na reunião de dezembro.
Neste cenário, as contas públicas seriam pressionadas por queda na arrecadação (de resto pelo baixo crescimento do PIB e menor variação de preços) e as despesas com juros se elevariam brutalmente, tornando os indicadores de endividamento mais críticos à rolagem da dívida pública. A manutenção da Selic numa taxa média próxima a 12% ao ano vai mais do que dobrar a elevação da despesa de juros sobre 2021.
Dentro deste contexto, após analisar a Ata do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) a LCA Consultores manteve “a projeção de que a Selic será elevada em 100 pontos na reunião do Copom de 16 de março, mas incorporamos um aumento adicional de 50 pontos-base na reunião de 04 de maio”, o que elevaria a taxa para 12,25% ao ano. O Itaú está prevendo IPCA de 0,83% em fevereiro, 0,54% em março e 0,56% em abril. Com estes números, só em março a taxa em 12 meses poderia cair abaixo de 10% (subiu 0,93% em março de 2021), mas voltaria acima de 10% se a alta de abril se confirmar (0,31% em 2021).
Vendas dão sinais de queda
O IBGE divulgou hoje dados preocupantes sobre o comércio. Em dezembro de 2021, o volume de vendas do comércio varejista nacional encolheu 0,1% frente a novembro, com ajuste sazonal. Na série sem ajuste sazonal, o comércio varejista caiu 2,9% frente a dezembro de 2020, a quinta taxa negativa consecutiva nessa comparação. Em 2021, o varejo avançou apenas 1,4%.
No comércio varejista ampliado, que inclui veículos, motos, partes e peças e de material de construção, o volume de vendas aumentou 0,3% sobre novembro, recuou 2,7% frente a dezembro de 2020 e avançou 4,5% em 2021.
Se for considerada o resultado da indústria em dezembro, quando houve expansão artificial de 1,9% sobre novembro, puxada pela indústria automobilística, que concentrou forte produção no final de 2021, porque a partir de 1º de janeiro vários tipos de motores, poluentes, terão de ser retirados de circulação (o que provocou redução de 31,1% na produção das montadoras em janeiro - o que deve ter impacto na cadeia produtiva de fornecedores da indústria automobilística), será prematuro e ilusório fazer projeções do desempenho da indústria e das vendas este ano com base no primeiro bimestre.
Ao analisar as perspectivas das principais organizações voltadas ao varejo, por vendas diretas ou através do e-commerce, a XP Investimento recomendou cautela aos investidores em relação aos resultados, pois as vendas podem se frustrar e serem bem mais modestas que as projeções anteriores.
Bradesco espera lucro do Itaú
O Bradesco divulgou 3ª feira à noite seu lucro líquido recorrente do 4º trimestre (R$ 6,613 bilhões, quedas de 2,8% frente a 4º trimestre de 2020 e de 2,3% sobre o 3º trimestre), mas o ganho acumulado do ano, de R$ 26, 215 bilhões foi 34,7% superior ao de 2020. Como até setembro, o Bradesco superou os ganhos da Itaú holding no Brasil (incluindo as operações na América Latina, o Itaú livra estreita vantagem), há grande expectativa sobre os resultados que o Itaú divulga amanhã, 5ª feira, após o fechamento dos mercados.
Os dois balanços já serão impactados pela alta da taxa Selic (piso do sistema bancário), que saiu de 2% ao ano em dezembro de 2020 para 9,25% ao ano em dezembro de 2021 (e tende a subir mais três pontos este ano). O Bradesco aproveitou o ganho de R$ 9,735 bilhões nas margens financeiras de 2021 (que deve ser ainda maior este ano) para reduzir em quase igual montante (R$ 7,211 bilhões) as provisões para devedores duvidosos. Com a alta dos juros, o Bradesco teve de fazer baixas contábeis de sua carteira de títulos, no 2º semestre de mais de R$ 4 bilhões, com boa parte envolvendo debêntures de empresas.
O banco também efetuou cessão de crédito de operação ativa, no montante de R$ 4.511.338 mil (2020 - R$ 1.076.953 mil), cujo valor de venda foi de R$ 1.021.264 mil (2020 - R$ 146.355 mil) e cessões de crédito de operações já baixadas para prejuízo, sem retenção de riscos e benefícios no montante de R$ 10.336.572 mil (2020 - R$ 7.348.109 mil), cujo valor de venda foi de R$ 761.917 mil (2020 - R$ 209.168 mil).
O Bradesco fechou 2021 com apenas 2.598 agências, uma redução de quase 450 agências em relação a 2020. Em boa parte, o banco aproveitou as restrições de circulação da pandemia para incrementar os canais digitais do próprio Bradesco e do banco Next, seu banco digital que superou 10 milhões de clientes. Mas em relação ao pico de 2017, quando o Bradesco terminava de incorporar o HSBC, e tinha 4.749 agências, houve encolhimento de 45% no número de agências, compensado com a transformação de algumas em postos de atendimento, que chegaram a 3.769 em 2021. Ao final do período, a o grupo Bradesco contava com 87.274 funcionários, sendo 75.622 do Banco e 11.652 de Empresas Ligadas. Entre os contratados havia 8.604 colaboradores e 2.010 estagiários.