O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Preços da Petrobras puxam inflação

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Publicado em 10/11/2021 às 16:21

Alterado em 11/11/2021 às 08:23

Gilberto Menezes Cortes CPDOC JB

O presidente Jair Bolsonaro já tinha avisado: “Petrobras é um problema”. De fato, os preços praticados pela estatal brasileira do petróleo, na qual a União tem 50,50% do controle das ações ordinárias com direito a voto, para internar para o mercado doméstico a escalada dos preços do petróleo e do gás no exterior, atualizados pela cotação do dólar, têm puxado a inflação brasileira para patamares crescentes.

Mas nada será resolvido com uma eventual privatização, como defende o ministro da Economia, Paulo Guedes. Para que os preços não subam tanto, é preciso combinar com os russos e árabes (maiores produtores) e os americanos, chineses, europeus e japoneses (maiores consumidores). E que o Banco Central consiga evitar a alta do dólar. Mas aí, Guedes e Bolsonaro têm de moderar os gastos (e rombos fiscais).

Como estamos com a campanha de reeleição na rua, fica difícil. O mais provável é que a fumaça dos ataques à Petrobras seja a justificativa para intervir no controle de preços da gasolina, diesel e GLP.

Lula e Dilma fizeram isso e se reelegeram em 2006 e 2014. Mas cavaram bilionários prejuízos à estatal. Será que os 49,5% outros acionistas aceitam?

 

As pressões dos combustíveis

Na inflação de outubro do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgado hoje pelo IBGE, com alta recorde de 1,25% (1,16% em setembro) e maior variação para o mês desde outubro de 2002, que elevou a taxa acumulado do ano para 8,24% e a taxa em 12 meses para 10,67% (a maior desde fevereiro de 2016), os preços dos combustíveis da Petrobras lideraram as altas: em Transportes, item que subiu 2,62% e contribuiu com 0,55 pontos percentuais do IPCA, os combustíveis aumentaram (na coleta de 29 de setembro a 28 de outubro) 3,21%, com alta de 3,10% da gasolina. Foi a 6ª alta seguida nos preços da gasolina, que subiu 38,29% em 2021 e 42,72% em 12 meses. A retomada das atividades de turismo e lazer impactou, com a alta do querosene de aviação, as passagens aéreas, que subiram 33,86%.

Como a Petrobras promoveu o novo reajuste a partir do dia 26 de outubro, na gasolina e no diesel, a última alteração dos combustíveis quase não foi captada no IPCA de outubro e impactará a taxa de novembro. No IPCA de outubro houve elevações também nos preços do óleo diesel (5,77%), do etanol (3,54%) e do gás veicular (0,84%). No ano, a gasolina já subiu 73% nas refinarias da Petrobras e nas bombas. O IPCA de outubro registra alta acumulada de 39,63% dos combustíveis no ano e de 45,26% em 12 meses. Somente neste ano, nas refinarias, a gasolina subiu 71,6%, com 13 aumentos; o diesel 64,5%, com 14 altas; e o GLP 47,7%, com 7 reajustes.

Com o temor de novas altas em novembro e dezembro - a inflação em 12 meses só tende a cair em dezembro, porque a taxa mensal foi de 1,35% em dezembro de 2020 -, os analistas está acreditando que a ameaça do Banco Central de aplicar dose mais forte que a alta de 1,50 pontos percentuais na taxa Selic na reunião de 8 de dezembro vai se cumprir. Já vem tarde.

Inflação generalizada

Todos os grupos de produtos e serviços pesquisados apresentaram alta em outubro. Depois dos Transportes, a maior contribuição (0,24 p.p.) veio de Alimentação e bebidas (1,17%), enquanto a segunda maior variação veio do grupo Vestuário (1,80%). Destacam-se ainda os resultados de Habitação, com alta de 1,04% e 0,17 p.p. de impacto, e Artigos de residência, que variou 1,27%, contribuindo com 0,05 p.p. no índice do mês. Os demais grupos ficaram entre o 0,06% de Educação e o 0,75% de Despesas pessoais.

Em Habitação há também forte influência dos combustíveis. Com a crise hídrica e o crescente acionamento de termoelétricas movidas a gás natural ou óleo (combustível ou diesel), para evitar o colapso das hidroelétricas, a energia elétrica aumentou 1,16% em outubro (menos que os 6,47% de setembro, quando entrou em vigor a bandeira Escassez Hídrica, que acrescenta R$ 14,20 na conta de luz a cada 100 kWh consumidos.

Ainda nas residências, outra grande pressão que se refletiu no índice de Habitação, foi o aumento de 3,67% no gás de botijão, cujos preços subiram pelo 17º mês consecutivo, acumulando alta de 44,77% desde junho de 2020.

A pressão dos combustíveis teve efeito no aumento de 33,86% nas passagens aéreas em outubro. E também nas tarifas dos Transporte por aplicativo. Eles haviam subido 9,18% em setembro e foram majorados em 19,85% em outubro, com os motoristas se queixando da perda da margem de lucros, que provou a devolução em massa dos automóveis alugados junto a locadoras de veículos.

 

Em alimentos, alívio na carne

No grupo Alimentação e bebidas (1,17%), a alta de 1,32% na alimentação no domicílio deve-se, especialmente, ao tomate (26,01%) e à batata-inglesa (16,01%). Outras pressões vieram do café em pó (4,57%), do frango em pedaços (4,34%), do queijo (3,06%) e do frango inteiro (2,80%). A alimentação fora do domicílio subiu 0,78% em outubro, impactado pela alta de 1,31% no lanche.

Na alimentação, vale registrar a 2ª queda seguida nos preços da carne, como resultado da suspensão das exportações para a China, após o surgimento de alguns casos da doença da “vaca louca” no plantel brasileiro. Após cair 0,21¨% em setembro, a carne baixou mais 0,04% para o consumidor. No ano, entretanto, a carne acumula alta de 8,38%, acima dos 8,24% da inflação e da variação de 7,08% da Alimentação e Bebidas. Em 12 meses, a carne ainda sobe 19,94%, contra 10,67% do IPCA e 11,17% da Alimentação e Bebidas.

Espera-se que a queda da carne alivie a pressão sobre as aves e ovos, alimentos alternativos de proteínas animais. No ano a alta é de 22,24% e de 28,92% em 12 meses.

 

Não está fácil para ninguém

Por falar em inflação, na China houve uma grita (até certo ponto, devido ao controle PCC no país) com o salto da inflação anual para o produtor (o equivalente aos preços no atacado aqui) para 13,5% nos 12 meses encerrados em outubro, após 10,7% em setembro.
Como a China é a origem de muitos produtos da cadeia mundial de suprimentos industriais, isso vai ter reflexos para os consumidores de diversos países.
Nos Estados Unidos, os preços ao consumidor subiram 0,9% em outubro, acumulando alta de 6,1% em 12 meses. Como se vê, há fortes pressões. Mas nada se compara ao Brasil.

 

Planos de saúde dão alívio

Se em anos anteriores eles lideravam as altas sobre os consumidores, na faixa de dois dígitos, os planos de saúde, que tiveram as mensalidades reduzidas, a partir de outubro, pela ANS aliviaram o bolso em 2021. Subiram só 2,44%.

Já os remédios aumentaram 4,93% no ano e 4,87% em 12 meses. Pelo visto, o IBGE não pesquisou nas farmácias de Ipanema e Leblon... Por sinal, pesquisa nacional da associação nacional das farmácia e drogarias revela que 88,4% dos consumidores de farmácias não costumam pesquisar preços. Assim fica mais difícil.

 

Açaí barato, só em Belém

Uma das poucas capitais brasileiras a não ser ainda alcançada pela inflação de dois dígitos, Belém, que acumula 9,27% em 12 meses pelo IPCA e 8,39% pelo INPC (que mede as despesas das famílias com renda até cinco salários mínimos – R$ 5,5 mil – deve parte do alívio à principal riquezas culinária do Pará. O preço do açaí (produzido principalmente no Pará e no Maranhão) caiu 8,77% em outubro. No mês passado, a Alimentação e Bebidas subiu apenas 0,38% em Belém (contra 1,17% na média nacional).

O problema é que para Ver o Peso (e o Preço) do verdadeiro açaí, que é quase uma sopa e não é servido com a polpa congelada no Rio e demais pontos do país, fica muito caro. Cabe apenas reclamar se o dono da loja de sua preferência tentar reajustar os preços (culpa dos combustíveis).

 

Brasília, a ilha da fantasia

Afora Belém, entre as 16 capitais e regiões metropolitanas pesquisas pelo IBGE, 12 estão com inflação de dois dígitos. Brasília fez jus ao apelido de “ilha da fantasia”, onde se passa ao largo dos problemas do Brasil. A inflação acumulada em 12 meses pelo IPCA (renda até 40 salário mínimos R$ 44 mil) ficou em apenas 9,30%. No INPC ela chegou a dois dígitos (10,05%).

No Rio de Janeiro, onde a família Bolsonaro tem residência, o IPCA subiu 9,36% e o INPC, 10,19%. Além delas só Aracaju (SE) tinha inflação domesticada (9,58% no IPCA e 9,32% no INPC).

O alívio na capital do país veio da diminuição na cobrança de PIS/COFINS, que também ocorreu em outras regiões. Apesar de ter sofrido reajuste de 11,69% nas contas de luz a partir de 22 de outubro, Brasília teve queda de 1,68% no valor mensal. Em Campo Grande (MS), a redução de 2,46%, ganhou a ajuda da diminuição da alíquota de ICMS, aplicada desde 1º de outubro.

Na ponta oposta, a maior inflação do país no IPCA é de Curitiba, com 13,54%. No INPC, a capital paranaense acumula inflação de 14,13%. Vitória (ES) tem a 2ª maior inflação no IPCA (12,22%) e 12,81% no INPC. São Paulo registra 10,22% pelo IPCA e mais de um ponto a mais (11,32%) pelo INPC.

 

Abear reclama do querosene

Antes que seja acusada pela alta de 33,86% nas passagens aéreas em outubro, a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), que congrega as companhias aéreas do país (as principais Gol, TAM, Azul, a novata ITA e empresas de aviação regional) lembra que o preço do querosene de aviação (QAV) sobe mais do que gasolina e gás de cozinha em 2021.

No 2º trimestre, preço do QAV subiu 91,7% frente ao mesmo período de 2020 e acumula aumento de 47,7% de 4 de janeiro a 25 de outubro, de acordo com os dados disponíveis da ANP.

Segundo a Abear, a escalada do preço do QAV em 2021 supera em 4,2 pontos percentuais a variação de 43,5% registrada pela gasolina no mesmo período. Já em relação à alta de 36,1% no gás de cozinha, o valor do litro do QAV ficou 11,6 pontos percentuais acima.

A associação alerta que a alta acelerada dos custos pode comprometer retomada do setor aéreo. Em outras palavras, se o turismo de negócios tão cedo não dá sinal de vida (empresas e empresários gostaram das facilidades e reduções de custos com as videoconferências) e a retomada do turismo internacional só volta a girar plenamente em 2023, o lazer doméstico também vai ficar difícil.

É que se não bastassem os altos custos do querosene de aviação, ele sofre forte incidência de ICMS. Quando os voos internacionais estavam firmes, as companhias se equilibravam nas despesas, pois se cobra ICMS nas rotas internacionais. Mas no turismo doméstico, com o ICMS, o custo do QAV representa de 35% a 37% do valor do bilhete aéreo, segundo o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz.

A entidade negocia com o Confaz, o conselho dos secretários estaduais de Fazenda, uma redução da alíquota do ICMS. Mas o acordo ainda não decolou.

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