O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Quando as geadas abalavam a economia

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Publicado em 27/07/2021 às 16:54

Alterado em 29/07/2021 às 18:18

Gilberto Menezes Cortes CPDOC JB

Até meados dos anos 70, antes da soja plantada, primeiro no Rio Grande do Sul nos anos 60, se espalhar pelo país, qualquer geada no Paraná abalava a economia brasileira. O estado era o celeiro agrícola do país (superando o RS e São Paulo), com recordes de produção de café, trigo, milho, algodão e carnes suínas e de aves. O café representava mais de 50% das receitas de exportações do país e nas “ruas” dos cafezais de PR e SP (maiores produtores do país) colonos plantavam milho, feijão e mandioca em regime de meia ou terça. Outro alimento básico, o arroz vinha do RS e Santa Catarina.

Quando comecei na Economia do JORNAL DO BRASIL, em agosto de 1972, notícias sobre geadas mexiam nas cotações nas bolsas de commodities (os negócios futuros estavam engatinhando). Geadas no Paraná e São Paulo eram péssimas para as contas cambiais do Brasil (super dependente do café por mais de um século) e danosas à inflação. Além das hortaliças e legumes, a produção de feijão, milho e mandioca era afetada. Se geadas atingiam laranjais da Flórida (EUA), produtores de Matão e Sertãozinho (SP) festejavam a alta.

Até que veio a super geada de julho de 1975 que mudou o mapa agrícola do Brasil. Os cafezais de SP e Paraná foram queimados pelo frio. Os fazendeiros resolveram erradicar de vez os cafezais, substituindo-os pela rentável soja, colhida no fim do verão e que dava lugar ao rodízio com o milho e o trigo (tudo mecanizado). Sem uma cultura permanente, os fazendeiros liberaram os colonos (cujas numerosas famílias plantavam com enxadas nas ruas do café e dividiam a receita com os donos das terras).

Uma boa parte acabou sendo inscrita no Funrural, a partir de 1976. O teto de meio salário mínimo “abrigou” os cabras dos fazendeiros do Nordeste e áreas que nunca tiveram geadas. E total de segurados do Funrural saltou de 400 mil para 4,4 milhões. Isso deu origem ao rombo no INSS, que duplicou quando a Constituição definiu que ninguém poderia ganhar menos de um salário mínimo.

A fuga da população rural para as cidades, tornou o Brasil (sem o necessário preparo) um “país urbano (confiram os dados do IBGE de 1970 e 1980). De um lado, tivemos um inchaço de mão de obra. Parte virou boia-fria nas lavouras de cana-de-açúcar e laranja que tomaram terras paranaenses e sobretudo de SP. O café (arábica) migrou para o Sul de Minas e o Triângulo Mineiro, enquanto o Espírito Santo aumentava a produção do café conilon (robusta).

Nas grandes cidades, inchadas por populações que antes plantavam parte de sua alimentação, ocorreram sucessivas crises de abastecimento de 1975 até meados dos anos 80 (o que ajudou a turbinar a hiperinflação). A reportagem de Economia tinha de acompanhar a produção de feijão de Irecê (Noroeste da Bahia), que ganhou muita importância após o desmonte do sistema do colonato em São Paulo e Paraná.

A conquista do cerrado do Planalto Central pela tecnologia da Embrapa, criou novos horizontes para a soja, o milho, o feijão, o arroz e o algodão. Tudo avançou com a mecanização das lavouras, que incluiu a colheita de cana. Mas os avanços se deram ao longo de três décadas. Mato Grosso se tornou o maior produtor de soja, milho, feijão algodão, carne bovina, superando o Paraná. A soja (no seu conjunto – grão, farelo e óleo), e se levarmos em conta que a carne de frango e de suínos é soja e milho convertidos em proteína animal em 40 ou 180 dias, tem mais receita que as vendas de minério de ferro ou de petróleo.

O fato importante é que geada no Sul do Brasil até São Paulo, Sul de Minas e Sul de Mato Grosso não tem as perspectivas de estrago nas lavouras como há 50 anos e muitos menos impactos tão graves na balança comercial, no balanço de pagamentos em conta corrente ou na inflação. Todos os cálculos indicam uma pressão de alta. Mas não tão drástica como o desastre de 1975.

O ranking do café

A propósito do café, PR e SP há muito não estão na liderança da produção do país. Minas Gerais é de longe o maior produtor da variedade arábica (que tem na Colômbia o 2º maior exportador. O ES é grande produtor da variedade conilon (cuja liderança mundial é do Vietnã). O incrível é que o Vitenã assumiu o 2º lugar da exportação mundial de café, à frente da Colômbia. A Indonésia vem em 4º e Honduras em 5º.

Mas a Alemanha, que apenas importa produtos de todos esses países e mais de países africanos (Etiópia, berço do café, e Quênia são relevantes) aparece como um dos seis maiores exportadores de café, reprocessados com misturas de arábica e robusta nas indústrias em torno do porto de Hamburgo e revendidos para grandes consumidores da grande Europa. Chega a ser pueril a negociação do Brasil com a União Europeia (EU). Em troca da redução violenta das alíquotas de importação a um número fixo, mas expressivo de automóveis made in EU, o Brasil teria isenção (daqui a alguns anos) na atual alíquota de 9% de taxação no café solúvel. Ocorre que as vendas de café solúvel pelo Brasil hoje não chegam a US$ 300 milhões e dificilmente irão dobrar.

De olho nos balanços

Os investidores estão de sobreaviso esta semana com a safra de balanços do 2º trimestre, inaugurado pela divulgação da TIM nesta 2ª feira, 26 de julho. Amanhã, pela manhã, será a vez do Santander divulgar seus números no Brasil e no mundo. No 1º trimestre, os resultados do Brasil, que sempre lideraram os ganhos do conglomerado de Ana Botin, murcharam e foram superados pelos dos Estados Unidos. Na noite de amanhã será a vez da Vale. Há projeções de lucros em torno de US$ 10 bilhões.

No dia 29 será a vez da Ambev apresentar seus números. O Itaú mostra o desempenho do 2º trimestre no dia 2 de agosto e o Bradesco e o Banco do Brasil, no dia 4.

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