O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

2021: mundo cresce e Brasil cai, com mais Covid-19,

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Publicado em 05/04/2021 às 18:04

Alterado em 05/04/2021 às 18:05

Gilberto Menezes Cortes CPDOC JB

Com a disparada dos contágios da Covid-19, diante da resistência da população mais jovem em seguir as determinações de isolamento e distanciamento social de governadores e prefeitos pelo Brasil afora – o diretor do Butantan (SP), Dimas Covas, alerta que abril pode ter intervalo de mortes diárias entre 4 e 5 mil –, os departamentos econômicos dos bancos e consultorias revisaram para baixo as projeções do PIB brasileiro para 2021.

Sobre o 1º trimestre há discordâncias: embora todas as previsões tenham sido reduzidas, o Itaú ainda acredita em alta de 0,4% (sobre o último trimestre do ano passado, porque a desaceleração só ocorreu do fim de fevereiro em diante), já o Santander, baixou de +0,4% para +0,2% a alta do PIB trimestral. E o Bradesco acredita em queda de 0,4% nos primeiros três meses do ano.

Para o 2º trimestre, todos convergem para uma queda: o Santander previa alta de 0,2% e agora espera queda de 0,4% no PIB do 2º trimestre, mesma baixa esperada pelo Itaú (que aposta em alta de 0,4% no 1º trimestre). O Safra espera queda de 0,9% no PIB do 2º trimestre e o mais pessimista é o Bradesco, que prevê queda próxima a 2% no PIB trimestral.

Na revisão feita pelos bancos no último dia 1º de abril, há um contraste tremendo na trajetória do PIB dos países desenvolvidos e o do Brasil. O Bradesco manteve em 7% o crescimento dos Estados Unidos e de 8,2% para a China, que deve crescer 17% no 1º trimestre. A área do Euro, também às voltas com a Covid-19, devido ao baixo suprimento de vacinas, cresceria 5,5%.

Enquanto isso, para o Brasil, o Bradesco reduziu de 3,6% para 3,3% a expectativa de crescimento do PIB de 2021 (e o de 2022 aumentaria apenas 2%); o Safra reviu de 3,5% para 3,2%; o Santander aumentou de 2,9% para 3% e a última previsão do Itaú previa alta de 3,8% para o PIB deste ano e de 1,8% em 2022, mas pode rever para baixo o dado de 2021.

Selic sobe atrás da Inflação

As projeções pioraram porque junto com o descontrole da Covid-19 (que exige mais restrições, com impacto na atividade econômica), a inflação segue explodindo, puxada pela alta internacional das commodities (sobretudo o petróleo, o que influi nas demais mercadorias agrícolas ou metálicas) e turbinada pela escalada do dólar. Em resposta ao estouro das metas de inflação (3,75% este ano e 3,50% em 2022), o Banco Central terá de promover fortes aumentos nas taxas de juros básicas (taxa Selic), hoje em 2,75% ao ano.

O Bradesco reviu de 3,9% (em fevereiro) para 5,04% a taxa do IPCA (inflação oficial) de 2021. Em função disso, espera que a Selic suba de 4% (previsão de fevereiro) para 5,25% em dezembro. Além da alta de 0,75% já anunciada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central em 6 de maio, o Bradesco prevê nova alta de 0,75 pontos percentuais em 16 de junho, para 4,25% ao ano. Em 3 de agosto, o Copom reduziria o ritmo de alta para 0,50 p.p., com a Selic indo a 4,75% a.a. E em 22 de outubro a taxa iria se estabilizar em 5,25%. Para 2022, o Bradesco espera alta de mais um ponto, para 6,25%.

O departamento econômico do Santander, comandado por Ana Paula Vescovi, que foi Secretária do Tesouro, elevou a projeção da Selic de 4% para 5,5% este ano (mesmo nível esperado pelo Itaú) e a 6% para 2022. O Santander espera inflação de 5% este ano. Também pessimista, o Safra elevou o IPCA de 4,4% para 4,9% e a Selic para 5%.

Inflação explode metas no 1º semestre

As últimas projeções do Boletim Focus, divulgadas hoje (5 de abril) pelo Banco Central apontam estouro crescente da inflação nos meses de março a junho. Neste período, no ano passado, em razão das medidas de isolamento no mundo, os preços do petróleo despencaram e aliviaram a inflação doméstica. Este ano, ocorreu o inverso. De janeiro a marco, o petróleo subiu 38% no mercado internacional, segundo a Petrobras.

Em março de 2020, o IPCA variou apenas 0,07%. O IBGE divulga os números em março na 6ª feira, 9 de abril. O mercado, segundo a Focus, espera alta de 0,95%. O Bradesco espera +0,98% e Santander estima alta de 1,08%. Isto deve levar a taxa acumulada em 12 meses dos 5,20% em fevereiro para 6,15% (pela Focus); para 6,16% nos cálculos do Bradesco e a 6,26% pelo Santander.

Mas o salto deve vir em abril (-0,31% em 2020) e maio (-0,38), sobretudo com o aumento de 39% no gás natural anunciado hoje pela Petrobras na revenda aos distribuidores em 1º de maio. Na Focus, o mercado espera alta de 0,46% no IPCA de abril, com o que a taxa em 12 meses saltaria de 6,9 a 7,1%. Para maio (as previsões são anteriores ao reajuste do gás natural), a elevação de 0,26% no IPC, elevaria a taxa anual para a faixa de 7,6% a 7,80%. Com risco de superar os 8% se a inflação de abril e maio ficaram acima do esperado. Em junho de 2020 o IPCA subiu 0,26%.

Choque do gás de Guedes foi ao contrário

Nos últimos dois anos, para animar o mercado ante os sucessivos fracassos em suas promessas – zerar o déficit público em 2019 com a reforma da Previdência e a privatização de R$ 1 trilhão em estatais e outro tanto com a venda de imóveis da União (nada disso foi alcançado) -, o ministro da Economia, Paulo Guedes, prometia um choque de redução de 30% a 50% nos preços do gás natural, com a aprovação do Marco Regulatório. Com menor custos do insumo, Guedes previa uma revolução na indústria e nos transportes.

Deu xabu. Hoje, a Petrobras informou que “a partir de 01/05/2021, os preços de venda de gás natural para as distribuidoras terão aumento, de 39% em R$/m3, com relação ao último trimestre. Medido em US$/MMBtu, o aumento será de 32%”.

Trata-se de reajuste trimestral, acompanhando a alta de 38% no petróleo de janeiro a março. Em dólar subiu 32%, o resto veio pela desvalorização do real. Mas pode vir mais por aí. A Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) disse que o aumento será repassado ao consumidor sem que exista “qualquer ganho decorrente desse aumento”.

Mas observa que ”em média, 17% do preço do gás pago pelo consumidor chega às distribuidoras, correspondendo a investimentos em expansão de rede e remuneração pela prestação dos serviços. Outros 59% do valor equivale ao preço da molécula acrescido da tarifa de transporte, enquanto 24% são tributos federais e estaduais”. É aguardar para ver o tamanho do choque em maio.

Todas as vênias à China

Quem alerta é o diretor do Butantan, Dimas Covas. Para ele, o Brasil devia reconhecer a grande contribuição que a China está dando para a vacinação no país, porque as duas vacinas que estão neste momento sendo empregadas (a CoronaVac, do Butantan, e a AztraZenaca, da Fiocruz) usam largamente matéria-prima (Insumos Farmacêuticos Ativos – IFAS) produzida na China.

Por sinal, com a defenestração de Ernesto Araújo do Ministério das Relações Exteriores, o Brasil, através do Itamaraty, pode dar uma guinada de 180 graus na estúpida orientação anterior, que nos relegou à condição de pária mundial.

Hoje, na reunião do G-24 (as mais importantes economias desenvolvidas e dos países em desenvolvimento no Fundo Monetário Internacional e no Banco Mundial), o Brasil se alinhou à Índia, África do Sul, México, Egito, Irã, Nigéria no pedido da quebra das patentes das vacinas contra a Covid-19 para os países em desenvolvimento.

Este foi um primeiro movimento importante. Em outubro do ano passado, por orientação de Ernesto Araújo, o Brasil votou no BRICS (reunião de Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), contra a proposta conjunta de Índia e África do Sul pela quebra das patentes nas vacinas contra a Covid-19.

Logo o Brasil que teve papel decisivo na quebra das patentes de antivirais como o HIV, em 2010. Sentida, a Índia atrasou e fez restrições (priorizando o atendimento de sua imensa população – 1,38 bilhão – e dos vizinhos) em vez de suprir o Brasil de IFAs, dos quais é o maior produtor mundial. O Brasil teve de recorrer à China. Por isso, Dimas Covas pede vênia aos chineses.