COISAS DA POLÍTICA

Como explicar o ódio à solidariedade geral

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Publicado em 12/05/2024 às 06:02

Alterado em 12/05/2024 às 08:10

Bolsonaro, durante a tragédia das chuvas na Bahia, não deixou o jet ski; Lula, com as enchentes de agora no Rio Grande do Sul, já esteve em Porto Alegre três vezes Fotos: reproduções

Na comoção nacional com a tragédia climática do Rio Grande do Sul, que se prolonga pela segunda semana seguida, com nova onda de chuvas e o frio que agrava a precária situação de 465 municípios, onde há quase 350 mil desabrigados, mais de 70 mil instalados em abrigos de emergência e as mortes que se aproximam de 130 pessoas, e dano de infraestrutura e patrimoniais incalculáveis e possivelmente irreparáveis, no caso de veículos e maquinário e instalações agrícolas que ficaram submersos, assim como os aviões taxiados no aeroporto Salgado Filho, dois sentimentos opostos afloraram.

De um lado amplamente majoritário, a empatia e a solidariedade, o verdadeiro sentimento de brasilidade de um só povo e uma só nação, uniram quase todo o povo brasileiro, mobilizado voluntariamente em ajuda ao bravo povo gaúcho.

Mas em meio a essa corrente de amor ao próximo e à solidariedade geral, surgiu um rancor inexplicável. Um sentimento de ódio buscando espalhar “fake news” para jogar a população vitimada contra as autoridades federais, estaduais e municipais que se irmanaram e vêm envidando todos os esforços para minorar o sofrimento dos irmãos gaúchos.

Como explicar a ação de desunião que pode ser comparável, por seu caráter vil, à atuação criminosa de bandidos que aproveitaram a fragilidade da população atingida para rapinar os pertences de quem está absolutamente desamparado?

Só Porto Alegre, que tem 1,322 milhão de habitantes - a cidade que tem mais de 20% da população com mais de 65 anos -, conta com quase 270 mil de idosos. Pois quem espalha boatos absolutamente mentirosos nas diversas redes sociais causa tanto impacto quanto os bandidos. A ação tem justamente o objetivo de minar a confiança na ação das autoridades e das equipes de socorro que afluíram de vários estados brasileiros por parte de quem resiste a deixar suas casas e propriedades tomadas pelas águas da enxurrada que parece não dar trégua.

Só Freud explica tanto ódio

As investigações preliminares da Polícia Federal e da Advocacia Geral da União (AGU) sobre PIX falsos, que visam se aproveitar da boa-fé nacional para desviar recursos em proveito próprio, e sobre a disseminação de “fake news”, encontraram o mesmo DNA dos disparos maciços feitos nos movimentos preparatórios do frustrado golpe de 8 de janeiro de 2023. Há investidas contra a FAB e o Exército, as duas armas onde houve resistência democrática à mobilização dos golpistas e obediência à Constituição Federal de 1988. Para ser mais preciso, a maioria tem impressão digital da brigada bolsonarista.

Uma visita ao passado, fora o negacionismo do bolsonarismo durante a pandemia da Covid-19 - cujo maior paroxismo foi a frase sem qualquer empatia do então presidente, encontra várias pistas: quando lhe pediram uma declaração [de conforto], com o país registrando a milésima morte, Jair Bolsonaro rebateu: “E daí, não sou coveiro”.

Mais de 700 mil brasileiros perderam a vida pela resistência do governo Bolsonaro em seguir as medidas recomendadas pelos cientistas, agravadas pelo descrédito que tentou lançar contra as vacinas (os reflexos estão aí na resistência a planos de vacinação para as mais diversas doenças que já estavam erradicadas, como a varíola).

Uma segunda pista foi o descaso com que agiu o então presidente nas férias que passava no fim do ano de 2021, em São Francisco do Sul, litoral de Santa Catarina, com as chuvas torrenciais que começaram a cair no litoral sul da Bahia na primeira dezena de dezembro. As televisões mostravam cenas impressionantes de inundações, mas Bolsonaro não se dignou a interromper seus passeios de “jet sky”. As chuvas de dezembro, que avançaram para janeiro e fevereiro, já atingindo dezenas de municípios do norte de Minas Gerais, causaram pelo menos 26 mortes (duas pessoas não foram encontradas) na Bahia, onde 165 municípios declararam estado de emergência; em Minas Gerais, as chuvas deixaram 435 municípios em estado de emergência, com 30 mortes. Mas Bolsonaro continuou curtindo a vida adoidado, e voltou a Brasília fazendo apenas um sobrevoo sobre a região, sem prestar solidariedade aos milhares de atingidos.

O preço do descaso ele conheceu nas eleições de outubro de 2022. Perdeu a reeleição no 2º turno, em 30 de outubro, por 2,1 milhão de votos, para Luís Inácio Lula da Silva. A diferença veio de pouco mais dos 100 mil votos com os quais Lula o superou em Minas e dos mais de 3,5 milhões de votos na Bahia.

Lula demonstra dor e empatia

Compare-se, ao contrário, os movimentos de solidariedade que Lula (quando não estava em viagens oficiais ao exterior) expressou pessoalmente no chão das cidades inundadas. Na primeira semana de seu terceiro governo (a posse foi no domingo, 1º de janeiro de 2023), houve um excesso de chuvas que inundou várias cidades do interior de São Paulo.

Para prestar assistência federal, ele viajou no sábado, 7 de janeiro, e estava em Araraquara (SP) quando irrompeu a invasão dos golpistas bolsonaristas na Praça dos Três Poderes, seguida da depredação das sedes do Legislativo (Congresso, com vandalização da Câmara e do Senado), a depredação do Palácio do Planalto (Executivo) e do Judiciário, na invasão e destruição de parte das salas do Supremo Tribunal Federal). Da prefeitura de Araraquara, Lula comandou, em articulação com o então ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, a reação federal, sem recorrer à Garantia da Lei e da Ordem - GLO, que daria o controle às Forças Armadas, como sonhavam os golpistas que começaram a ser presos na manhã seguinte.

Agora, na tragédia gaúcha, o presidente Lula já esteve três vezes em Porto Alegre, e os ministros de seu governo estão em força tarefa permanente com as autoridades locais. O tiro das “fake news” saiu pela culatra. A população brasileira se uniu e os índices de aprovação do presidente Lula, que vinham em queda, estancaram e devem dar uma subida nas próximas pesquisas.

Bolsonaro amarga fiasco de Ramagem

Não bastassem a desdita de nova internação por erisipela – só Freud explicaria por que os sintomas que se manifestaram após a derrota em 30 de outubro de 2022, voltaram agora, em abril/maio de 2024 – quando o presidente Lula se entende com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o candidato escolhido pelo ex-presidente para concorrer pelo PL à Prefeitura do Rio de Janeiro patina das pesquisas.

Com seu jeitão sem papas na língua, Bolsonaro está pessimista em relação à candidatura do seu protegido, o deputado federal Alexandre Ramagem (PP-RJ), que nomeou diretor geral da Agência Brasileira de Informações (Abin) e escolheu para competir com a candidatura à reeleição do prefeito Eduardo Paes (PSD-RJ). Ele foi curto e seco sobre sua decepção com o candidato que não sobe nas pesquisas: “Durão e sem traquejo político”.

Sem PPI, combustíveis caem mais que sobem

Sempre critiquei o excesso de conservadorismo do Banco Central. Para mim (e só o tempo vai dizer quem tem razão), os quatro diretores e mais o presidente Roberto Campos Neto, que votaram pela redução de apenas 0,25 ponto percentual na taxa Selic, que caiu para 10,50% ao ano, ignorando o clamor nacional por juros mais baixos (10,25% ainda seriam muito), ficaram muito impressionados com o pessimismo na reunião de primavera do Fundo Monetário Internacional, na primeira quinzena de abril. De lá para cá o ambiente se desanuviou um pouco e até o Banco da Inglaterra iniciou a baixa dos juros. E a inflação caiu no Brasil em 12 meses, de 3,93% para 3,69%.

Um dos temores do Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) era a alta do petróleo. O óleo do tipo Brent continua em queda e, em função disso, a Petrobras anunciou dia 10 novas reduções adicionais de até 10% no fornecimento de gás natural para as distribuidoras estaduais. As novas modalidades comerciais podem ampliar o movimento de queda do preço médio da molécula de 25% para até 35% de redução acumulada desde 2023. Era a promessa de Paulo Guedes, que não poderia ser cumprida na vigência do PPI.

Para os consumidores livres, a Petrobras ofertará uma nova carteira de produtos de venda em condições mais customizadas e competitivas. Desta forma, a Petrobras intensifica sua atuação no processo de abertura de mercado, visando a expansão e fortalecimento de um mercado livre mais líquido, competitivo e diversificado.

Em 1º de maio, os preços do gás natural já haviam sido ajustados, com redução, em média, de 1,5% em reais por metro cúbico (R$/m³) da molécula vendida às distribuidoras, em relação ao início do trimestre fevereiro-março-abril de 2024. A queda de preços também refletiu a redução no preço do petróleo Brent e a apreciação do dólar, conforme indicadores de referência previstos nos contratos.

Sem PPI, preços mais estáveis

Quando o PPI estava em vigor, de fins de 2017 até maio de 2023, qualquer oscilação para cima do petróleo tipo Brent se espraiava aos combustíveis e era repassada ao mercado doméstico com a atualização do dólar. Com a forte indexação ainda reinante na economia brasileira, havia contaminação geral da inflação nos movimentos de altas, mas quase nunca havia reversão equivalente na baixa. O Banco Central tenta combater a inércia com os juros altos, que geram pernicioso efeito colateral na vida das famílias e empresas endividadas.

A nova política de preços da Petrobras mostrou suas vantagens nas escaramuças entre Israel e o Hamas e com o Irã. Há 50 dias houve grande pressão, inclusive do Ministério das Minas e Energia, para a Petrobras reajustar a gasolina e o diesel quando o Brent passou de US$ 90.

A Petrobras foi cautelosa (usa o petróleo do pré-sal, extraído a US$ 30) e preferiu esperar a reversão dos preços. Sexta-feira, 10, o barril caiu mais 1,24%, cotado a US$ 82,86 para entrega em julho. Estava tão correta a estatal que na mesma sexta-feira, a Acelen, do fundo Mubadala, dos Emirados Árabes Unidos, que comprou a refinaria Landulpho Alves na Bahia, reduziu em 7,3% o preço da gasolina e em 4,3% o litro do diesel.

Se conselho fosse bom...

Imagine se a Petrobras segue o açodamento do ministro Alexandre da Silveira? Em vez de a inflação subir 0,38% em abril, sendo 0,08% causado pela alta de 1,50% na gasolina, pelo efeito da alta de 4,56% no Etanol na gasolina comum (o álcool anidro entra em 27% na mistura), o IPCA teria subido acima de 0,50% e dado razão à cautela do Banco Central na baixa dos juros da taxa Selic.

Como se vê, a Petrobras virou agente anti-inflacionário mais eficaz que o Copom, cuja parcimônia na baixa dos juros penaliza toda a economia. Os investidores sócios da Petrobras (43% deles acionistas estrangeiros ou brasileiros com registro em paraísos fiscais) vão reclamar por eventuais quedas dos lucros, que reduzem os gordos dividendos.

Mas a Petrobras foi construída pelo povo brasileiro, que ainda é seu controlador, pela União, e está atuando em benefício maior dos seus verdadeiros “stakeholders”.