CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Moçambique: elefantes pararam de desenvolver presas em resposta à ação humana, descobre estudo

Durante a guerra civil em Moçambique (1976-1992), exércitos caçaram elefantes até quase a extinção para coletar presas de marfim. Estudo mostra que a proporção de animais sem presas nascidos durante e após a guerra aumentou dramaticamente

Por JORNAL DO BRASIL
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Publicado em 25/10/2021 às 11:26

Alterado em 25/10/2021 às 11:26

Elefante na reserva nacional Masai Mara, no Quênia Foto: Sputnik / Fayed El-Geziry

Os elefantes africanos evoluíram para deixar de desenvolver presas em uma área onde eram intensamente caçados por marfim, descobriu um estudo sobre as características e a genética desses animais em Moçambique. Os resultados, publicados na revista científica Science na sexta-feira (21), podem ter implicações para a recuperação das populações de elefantes no país africano.

O comércio de marfim foi usado para financiar a guerra civil em Moçambique do final dos anos 1970 ao início dos anos 1990. A caça furtiva fez com que a população de elefantes no país caísse em mais de 90%, de mais de 2.500 animais para cerca de 200 no início dos anos 2000.

As fêmeas que sobreviveram simplesmente deixaram de criar presas, e essa característica genética foi passada de geração para geração. Antes dos conflitos, o cientista estima, apenas menos que um quinto dos elefantes não produziam a ferramenta, conta o biólogo Shane Campbell-Staton, principal autora do artigo, citada pela Nature.

"Os anos de incerteza armada mudaram a trajetória da evolução daquela população", disse o biólogo. Entre 1977 e 2004, a proporção de fêmeas sem presas saltou de 18,5% para 33%.

Característica letal para homens

Os pesquisadores ficaram intrigados: por qual razão a ausência de presas era uma característica limitada às fêmeas?

Mesmo em áreas com grandes populações de elefantes africanos, existem raros machos sem presas. Esse padrão sugere uma origem genética para a ausência de presas que está ligada ao sexo do elefante.

Depois de sequenciar os genomas de fêmeas com presas e sem presas, os pesquisadores identificaram um gene dominante que poderia ser responsável pela ausência de presas: Amelx.

O Amelx é transmitido de mães para filhos no cromossomo X. Os humanos também têm o gene. Se um homem herda um gene AMELX interrompido em seu cromossomo X, ele geralmente morre.

Os autores do estudo acham que poderia ser o mesmo com os elefantes africanos: se um elefante macho herda um gene Amelx interrompido, ele morre; mas o gene mutado resultaria apenas em ausência de presas em uma fêmea de elefante.

Embora a guerra civil de Moçambique tenha acabado há quase 30 anos, pode demorar um século para que a proporção de fêmeas sem presas volte aos níveis anteriores à guerra.

"Provavelmente levará cinco, seis ou sete gerações para voltar aos 2% que você esperaria sem qualquer pressão de caça", comenta Campbell-Staton. (com agência Sputnik Brasil)

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