Candeia, 45 anos sem a chama que não se apagou

'A chama não se apagou/Nem se apagará/És luz de eterno fulgor, Candeia/O tempo que o samba viver/O sonho não vai acabar/E ninguém irá esquecer Candeia' (Luiz Carlos da Vila)

Por LUÍS PIMENTEL

Antonio Candeia Filho (1935-1978) ao violão no qual fazia os seus acordes

Antonio Candeia Filho é samba e resistência. Nasceu em 1935 (17 de agosto) e morreu há 45 anos, em 1978 (dia 16 de novembro). Viveu pouco, apenas 43 anos, mas criou intensamente e deixou uma obra e uma história de vida que só enchem de orgulho seus pares e seguidores. Mito da resistência cultural brasileira – a criação da escola de samba Quilombo, em meados da década de 70, é o exemplo maior de sua identificação e militância nessa área –, o compositor é até hoje um dos grandes nomes no panteão da Música Brasileira.

Candeia começou a fazer músicas ainda na adolescência, por inspiração caseira. Seu pai tocava flauta e carregava o pequeno Antonio para as rodas de samba e de choro que ferviam em Oswaldo Cruz e Madureira. “Meu pai eu só vim a entender quando tinha uns 12 para 14 anos. A princípio, sentia uma certa frustração. Nos aniversários não tinha nada desses aniversários normais com bola, sorvete, chocolate, um bolozinho que a mãe da criança fazia. No meu aniversário meu pai fazia uma tremenda feijoada e quem vinha eram somente adultos. Ainda jovem começou a frequentar a Portela, virou compositor da escola e, em 1953, antes de completar 18 anos, viu a agremiação de Madureira desfilar com um samba-enredo de sua autoria, “As seis cartas magnas”.

O Candeia participativo e contestador desponta na segunda metade dos anos 70 quando, graças à abertura política, os movimentos populares retomaram sua organização, entre esses movimentos a luta dos militantes pelos direitos dos negros. É dessa época a criação do Centro de Estudos Afro-Asiáticos e do Instituto Popular de Cultura Negra, órgãos importantes para a retomada dos movimentos negros no Rio de Janeiro. Muito ligado aos dirigentes e militantes do Centro e do Instituto, Candeia funda o Grêmio Recreativo de Arte Negra e Escola de Samba Quilombo, com duas premissas básicas: a “valorização das culturas negras em tudo o que se refere às suas aspirações” e também a “valorização da manifestação da arte popular, há muito banida das escolas de samba”.

Candeia ficou um pouco esquecido, para voltar a brilhar em 1995, quando o parceiro Martinho da Vila gravou o disco “Tá delícia, tá gostoso”, no qual incluiu um pot-pourri chamado “Em memória de Candeia”, incluindo vários sambas do compositor. No ano seguinte foi a vez de Zeca Pagodinho incluir no belo CD “Deixa clarear” a regravação, juntamente com a Velha Guarda da Portela, de um samba que tinha a cara e a marca de Candeia (apesar de não ser de sua autoria, e sim de Alcides Malandro Histórico), por ter sido por ele gravado com enorme maestria, “Vivo isolado do mundo”. Esse samba foi registrado por Candeia no melhor disco de sua carreira, “Axé”, de 1978.

Candeia foi um homem valente, que enfrentou algumas adversidades na vida com determinação e força. Viveu os seus últimos anos (mais de 10) preso a uma cadeira de rodas, em decorrência de um tiro na coluna vertebral – depois de uma discussão no trânsito, no final da década de sessenta. Policial Civil, Candeia se aposentou por invalidez após o acidente e pôde, então, se dedicar mais à música, aos movimentos musicais e às causas sociais de seu povo.