CINEMA
‘Deus e o diabo na terra do sol’, de Glauber, na Salle Buñuel, em Cannes
Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO
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Publicado em 19/05/2022 às 18:47
Alterado em 19/05/2022 às 18:47
Othon Bastos na pele de Corisco, em 'Deus e o diabo na terra do sol' Foto: divulgação / Primeiro Plano
Único título brasileiro na 75ª edição do Festival, o filme teve sessão de gala nessa quarta (18), 58 anos depois de ter estreado no evento concorrendo à Palma de Ouro.
A sessão teve a presença da diretora Paloma Rocha, filha de Glauber e do produtor Lino Meireles, responsáveis pela restauração em copia 4K.
O filme é o segundo longa-metragem de Glauber Rocha, e considerado um marco do Cinema Novo.
A obra do consagrado cineasta inclui, entre outros, “Barravento” (1962), “Terra em transe” (1967), “O dragão da maldade contra o santo guerreiro” (1969) e “O leão de sete cabeças” 1970).
“Deus e o diabo na terra do sol”, um dos títulos mais celebrados do cinema brasileiro, mescla influências literárias de Graciliano Ramos, José Lins do Rego e “Os sertões”, de Euclides da Cunha. É um filme totalmente fora do convencional, rompe com a narrativa tradicional, é distante dos padrões da época e pleno de metáforas e simbolismo.
A história segue o vaqueiro Manuel (Geraldo Del Rey) e sua esposa Rosa (Yoná Magalhães) em fuga para o sertão depois que ele mata um coronel que tentou enganá-lo. No ermo, violento e assolado pela seca, eles encontram duas figuras inusitadas: Sebastião (Lídio Silva), que se diz divino, e Corisco (Othon Bastos), que se descreve como demoníaco. Tomam a trágica decisão de amarrar seus destinos com essas figuras, pois o mercenário Antonio das Mortes (Maurício do Valle) está em seu encalço.
A ótima trilha sonora, que ficou famosa, tem canções de Sérgio Ricardo e Glauber Rocha.
Não foi tão premiado, pelo menos como se esperaria em face do seu enorme sucesso – foi escolhido para representar o Brasil no Oscar, não tendo sido indicado –, mas foi e continua sendo aclamado pelos críticos nacionais e internacionais, e é certamente o filme brasileiro mais conhecido mundo afora.
Entre os prêmios, ganhou o da crítica no Festival de Acapulco (México), o Grande Prêmio do Festival de Cinema Libre (Itália), Grande Prêmio Latino-Americano no Festival de Mar del Plata (Argentina), entre outros.
Sobre a exibição em Cannes, Meirelles diz que é um ciclo completo para a restauração, tendo o filme sido reexibido pela primeira vez no mesmo local em que estreou. “Espero que seja um novo chamado de resistência cultural”, deseja.
Paloma, por sua vez, destaca que num país com a cultura tão depreciada e com a produção artística sofrendo ataques, foi um esforço de contracorrente. “Mas isso só foi possível porque o filme tem a força própria dele”, atesta.
É de fato um filme que tem força por si mesmo. Além do impacto que causou quando foi lançado em 1964, rendeu inúmeros estudos nas décadas seguintes e é um sucesso perene até os dias de hoje.