CINEMA

Crítica - ‘Dr. Estranho no Multiverso da Loucura’: um filme de Sam Raimi travestido de Marvel

Cotação: três estrelas

Por TOM LEÃO

Publicado em 05/05/2022 às 12:31

Alterado em 05/05/2022 às 12:35

No novo filme, dirigido por Sam Raimi, Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch) percorre vários universos, tentando impedir a Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) de alterá-los, o que pode pôr fim ao em que vivemos Foto: divulgação

Um dos mais queridos diretores, egressos da cena indie americana, Sam Raimi, fez seu nome com os violentos e divertidos filmes da série ‘Evil Dead’ (três capítulos), ao longo dos anos 80. Nestes, além de inovar no uso de câmeras, deu um toque cartunesco e pastelão às cenas grotescas (muitas das quais, inspiradas nos curtas dos Três Patetas!), nos provocando medo e fazendo rir ao mesmo tempo. Depois, seguiu fazendo filmes inventivos, de pequenos orçamentos, como ‘Darkman’ (no qual criou um herói desfigurado original para a Universal), até que, eventualmente, fosse chamado para reviver o Homem-Aranha nos cinemas, antes que produções baseadas em quadrinhos de super-heróis virassem os filmes-evento de hoje em dia. E deu muito certo. Fez três filmes do aracnídeo, sendo que os dois primeiros são dos melhores do gênero.

Portanto, o segundo filme solo do personagem da Marvel Doutor Estranho (‘Doctor Strange in the Multiverse of Madness’, no original) é, antes de tudo, um filme de Sam Raimi. O que é muito bom. Porque certos diretores, quando vão fazer blockbusters atrelados a universos fechados, acabam apenas emprestando suas assinaturas ao produto, e fazendo filmes como o estúdio quer, sem toques autorais. Ainda bem que isso não ocorreu com esta sequência de Doutor Estranho. Porque, de outra forma, teria sido um desastre. Já que o roteiro é bastante deficiente. E muita coisa lá não vai fazer nenhum sentido pra quem não viu o filme anterior. E nem acompanhou a série em streaming da Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) - que é o nêmesis do herói -, no Disney+. O que salva mesmo é a mão de Raimi (inclusive, aquela mão que sempre sai de debaixo da terra está lá numa cena) e seu peculiar senso de humor. Ele arrumou até um jeito de enfiar seu ator-assinatura, Bruce Campbell (o herói Ash, dos ‘Evil Dead’), num trecho do filme, e na ceninha final, que dão um toque muito legal ao todo.
O roteiro básico mostra, mais uma vez, o Doutor Estranho (Benedict Cumberbatch) fazendo besteira (como aconteceu no último filme do Homem-Aranha com ele), ao invocar um feitiço proibido vindo de um livro amaldiçoado (e, de livros amaldiçoados Raimi entende, vide o Necronomicon, dos ‘Evil Dead’); e com isso abrindo portas para diversos universos paralelos, onde várias versões dele próprio habitam. Numa brecha dessas, Wanda Maximoff (a.k.a Feiticeira Escarlate) se aproveita para resolver uma questão pessoal pendente (que, quem viu a série de TV, saberá qual), bagunçando tudo e pondo em risco todos os universos (inclusive, o em que nós habitamos). Para ajudar Stephen Strange, entra em cena uma personagem que é recente nos quadrinhos, America Chavez (Xochitl Gomez), que sabe andar por entre os universos.

O que vemos é Strange e Chavez indo de um universo para o outro, tentando impedir a Feiticeira de bagunçar com tudo (ela quer viver para sempre no universo em que é uma feliz dona de casa com dois filhos, como visto em ‘WandaVision’) e, enquanto isso, surpresas agradáveis para os fãs dos quadrinhos Marvel vão aparecendo, aqui e ali, já dando a dica de que, em futuro próximo, certos personagens que ainda não adentraram o MCU (Marvel Cinematic Universe) o farão (não posso citar nenhum deles, para não estragar as surpresas). De quebra, Strange ainda tenta resolver um problema afetivo de seu passado, que envolve sua ex-noiva, Christine Palmer (Rachel McAdams).

Ou seja, o que não falta é caldo na sopa psicodélica de ‘Doutor Estranho no Multiverso da Loucura’ (cuja trilha sonora, assinada por Danny Elfman, é fantástica!); que, pelas mãos de Sam Raimi, escapou de ser algo sem pé nem cabeça, e ganhou até leves toques de terror. Além de abraçar, totalmente, o lado lisérgico que as aventuras de Strange tinha nos gibis (foi concebido no final dos anos 1960, no auge do movimento psicodélico). É a maior ‘viagem’ para os fãs.

 

_______

 

COTAÇÕES: ***** excelente / **** muito bom / *** bom / ** regular / * ruim / bola preta: péssimo.

Tags: