CINEMA

‘Cine, Registro Vivo de Nuestra Memoria’ destaca a importância da preservação audiovisual

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Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO

Publicado em 02/11/2021 às 12:19

Inés Toharia, diretora de 'Cine, Registro Vivo de Nuestra Memoria' Foto: El Grifilm Productions / Divulgação

O documentário foi selecionado para a Competição de Novos Diretores na 45ª edição da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, que termina na próxima quarta (3).

Através das vozes de renomados profissionais que têm contribuído para a sobrevivência e acessibilidade de imagens em movimento, o filme destaca a importância da preservação fílmica que nos permite assistir hoje a imagens que foram feitas há mais de 125 anos.

A cineasta Inés Toharia colheu depoimentos de arquivistas, técnicos e cineastas de diferentes partes do mundo explicando o que é a preservação audiovisual e as razões pelas quais ela é tão necessária.

O filme é uma homenagem a todos esses profissionais e ao seu trabalho, enfatizando a importância de evitar a perda de títulos e acervos e, consequentemente, de parte da memória histórica e cultural de cada povo.

Inés nasceu em Madri em 1975. Depois de concluir os estudos em literatura e cinema, especializou-se na preservação de filmes nos EUA. Estreou na direção em 2015 com “El Río que Suena, Reflejo del Tiempo: Joaquín Díaz”.

Inés falou ao Jornal do Brasil.

JORNAL DO BRASIL - Em face da importância do tema, esse é um filme que já deveria ter sido realizado há muito tempo. O que levou você a fazê-lo?

INÉS TOHARIA - Percebi que era um assunto pouco falado e que não se sabe o suficiente. E, no entanto, é um assunto que está perto de nós e desperta muito interesse. O que sabemos da história do cinema mundial é apenas uma fração de tudo o que foi filmado no passado, principalmente no período mudo. Antes do advento dos filmes falados, perdemos muitos títulos mudos: estima-se que entre 70% e 80% da produção mundial de filmes mudos desapareceram. E a porcentagem é ainda maior em países com climas quentes. As cinematecas e os arquivos cinematográficos e, sobretudo, os arquivistas são os responsáveis pelo esforço de sensibilização, muitas vezes desenvolvendo um trabalho que é pouco reconhecido. Mas sem essas pessoas não teríamos acesso hoje a tantos materiais e filmes; eles são como a espinha dorsal da história do cinema e permitiram que ele sobrevivesse e existisse.
Nosso documentário começou como uma homenagem a essas pessoas e ao seu trabalho.
Foi essa a intenção inicial para sensibilizar sobre o assunto e prestar um tributo a esses arquivistas que ao longo dos anos trabalharam para salvaguardar o nosso patrimônio audiovisual e nos permitir continuar aprendendo sobre tanta coisa.

Foi difícil conseguir imagens e entrevistas com arquivistas e cineastas de diferentes partes do mundo?

Foi difícil por causa da geografia e dos deslocamentos. Mas ao mesmo tempo foi fácil no sentido de que, uma vez lá, os entrevistados fizeram de tudo para ajudar. Arquivistas e cineastas estão cientes de que o campo da preservação de filmes foi negligenciado e alegremente dedicaram seu tempo e atenção a nós. Foi um prazer ver e vivenciar tudo isso e foi especialmente emocionante conversar com profissionais que trabalham nisso desde os anos 70. Ouvi-los foi uma honra e em cada entrevista aprendemos coisas novas. Nós tínhamos uma ideia preconcebida do que queríamos e eles nos deram mais três ou quatro, todas interessantes. E ficaram felizes por termos os incluído no documentário. Isso também nos incentivou a seguir em frente; receber o apoio e o interesse deles foi fundamental. Além disso, também ajudou na hora de conseguir imagens, o que é sempre um processo longo. Mas quando entenderam o uso que daríamos a elas ficou fácil.

A preservação fílmica é importante como identidade e soberania. Os muitos preservacionistas com quem você se conectou sentem que isso está presente na cultura de seus países?

Eles sabem que é muito importante e, se sua tarefa não for valorizada agora, será altamente valorizada no futuro. Podemos saber e aprender muito sobre o momento atual com o cinema (tanto em filmes de não ficção quanto de ficção). O cinema não só ajuda enormemente a gerar empatia e a conhecer o “outro”, mas também é uma verdadeira chave da identidade e da soberania de um povo: sem conhecer o passado é muito difícil construir um futuro sólido. As cinematecas são como guardiãs do patrimônio e da identidade de um país, que nos permitem saber mais sobre nossa evolução no futuro. É por isso que um governo tem o dever de salvaguardar esse patrimônio, é um dever com as pessoas que ele representa, é sua obrigação.

Você tem planos de continuar com esse trabalho?

Eu gostaria muito de poder continuar o trabalho. Temos procurado atingir todos os públicos, não só os cinéfilos ou já conhecedores do assunto, mas também fazer com que todos possam conhecê-lo. Existem tópicos que podem ser desenvolvidos e expandidos. Por sinal, houve muitos que foi difícil não incluir no filme na edição e seria bom poder retomar. Também houve testemunhos que não pudemos recolher por causa do covid-19 em locais para os quais não podíamos viajar.
Mas já fomos inclusive consultados se teríamos interesse em fazer uma minissérie sobre o assunto. O campo é fascinante e os profissionais de preservação têm algo de heróis anônimos. Nunca deixamos de aprender com eles e estou muito agradecida a todos.

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