CINEMA

O bom cinema que vem da Romênia

Radu Jude fala sobre seu novo filme concorrente ao Urso de Ouro em Berlim

Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO
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Publicado em 03/03/2021 às 21:21

O diretor Radu Jude Foto: Silviu Ghetie

“Bad Luck Banging or Loony Porn”, de Radu Jude, estreou nessa terça feira (2) na 71ª edição do Festival de Berlim.

O cineasta romeno está de volta à Berlinale, onde em 2015, na 65ª edição do festival, ganhou o Urso de Prata de melhor direção com Aferim!, que aborda a escravidão dos ciganos no século 19.

Os filmes de Jude, por sinal, têm tido ótima aceitação da crítica e público, como aconteceu com “Everybody in our Family”, em que os espectadores se sentem tão presos quanto o personagem; com o drama de humor negro “A Film for Friends”; e com o mordaz “The Happiest Girl in the World”, sobre o tédio adolescente.

É importante lembrar também que o cinema da Romênia está cada vez mais conquistando admiradores, desde o sucesso e talento de nomes como Cristian Mungiu (“4 meses, 3 semanas e 2 dias”), Cristi Puium (“A Morte do Senhor Lazarescu)” e Corneliu Porumboiu (“Polícia, Adjetivo”), apenas para isso citar alguns.

O novo filme de Jude segue Emi (Katia Pascariu), uma professora que vê sua carreira e reputação ameaçadas quando vaza, em um site para adultos na Internet, uma fita de sexo com seu marido. Forçada a enfrentar pais furiosos exigindo sua demissão, Emi se recusa a ceder à pressão e entra em conflito com o grupo.

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A protagonista do filme, Katia Pascariu (Foto: Foto: Silviu Ghetie / Micro Film)

De forma não convencional, o filme oferece uma mistura de humor irreverente e comentários mordazes sobre a hipocrisia e o preconceito da sociedade atual. Como definiu Carlo Chatrian, diretor artístico da Berlinale, “o novo filme de Radu Jude oferece um realista raio x da Romênia contemporânea”.

O JORNAL DO BRASIL participou da conferência de imprensa com Jude, organizada por empresa especializada em marketing – a Berlinale não está propiciando coletivas nesta edição –, quando o diretor falou sobre “Bad Luck Banging...”, sua motivação para realizá-lo e as referências com a história do seu país.

Qual foi sua principal motivação para fazer esse filme?

A ideia não veio da história em si, porque já houve outros casos semelhantes na Croácia e na França. Para mim, o filme começou em uma conversa com amigos. Chegamos a esse tópico e a discussão ficou calorosa, verbalmente violenta, e prosseguiu por várias horas. Achei que o assunto merecia ser mais explorado e fui pesquisar o que está ao redor dessa história, e como poderíamos conectá-la a realidades maiores.

Em que momento da trama você decidiu integrar a pandemia em seu filme? Ela estava originalmente no roteiro?

Nós já tínhamos realizado parte do filme, veio o lockdown e nós ficamos decidindo se esperaríamos ele acabar para dar continuidade à produção. Esse foi um tempo de espera. Mas nossos produtores nos apoiaram para terminar o filme logo. Então resolvemos continuar, reduzindo ao máximo os riscos para toda a equipe Eu decidi, inclusive, pelo uso de máscaras para os atores em cena, o que gerou algumas reclamações da parte deles. Mas eu não me arrependo da decisão, acho que esse fator ficou até bem integrado ao filme.

Em todos os seus filmes você faz referências à história do seu país. Você tem a impressão de que ela está sendo reescrita?

Eu procuro traços de histórias e ideologias que ainda permanecem, que se reformulam, enfim, eu busco sempre uma genealogia dessas ideias que ainda perduram. Eu vejo muito hoje em dia como o nacionalismo e o puritanismo do meu país e suas ideologias antigas retornam e se fazem presentes.

Por que falar sobre sexo é um tema tão ligado a falar sobre política na Romênia?

Acho que isso acontece em todos os países. Essa questão conservadora não é exclusiva dos romenos. Os corpos femininos são políticos e muito ligados a afirmações políticas. Historicamente, na história da sexualidade na Romênia, vemos vários fatores interessantes. As pessoas lá são muito reprimidas e não sabem como lidar com sexo, não sabem como reagir a ele publicamente, e acho que isso passa por essas ideologias que ainda existem no país.


TINA TURNER COMO NUNCA VIMOS ANTES

Outro destaque dessa terça feira (2) foi “Tina”, de Dan Lindsay e T. J. Martin, exibido na Berlinale Special. O documentário é sobre o ícone da música Tina Turner, que nos convida para entrar em seu mundo privado de uma forma completamente inédita.

O filme tem muitas entrevistas com a própria Tina, realizadas em sua cidade natal, Zurique, na Suíça e com pessoas mais próximas a ela, junto com imagens, fitas de áudio e fotos pessoais que jamais foram mostradas ao público.

“Tina é a celebração definitiva de uma superstar global, o retrato íntimo de uma mulher que superou adversidades para definir sua carreira, sua identidade e seu legado”, definiu Jonathan Chin, cofundador da Lightbox, que produziu o filme.