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‘O Amor dá voltas’, de Marcos Bernstein, estreia dia 22 nos cinemas

‘Nesse filme, conseguimos uma integração especial com nosso trio principal, a Cleo, o Igor Angelkorte e a Juliana Didone’, diz o diretor

Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO
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Publicado em 13/12/2022 às 09:21

Marcos Bernstein, diretor de 'O amor dá voltas' Foto: Rachel Tanugi

‘O Amor dá voltas’, do diretor Marcos Bernstein, estreia dia 22 nos cinemas. O filme, que tem produção associada do cineasta Cacá Diegues, segue André (Angelkorte), um jovem médico que, ao retornar ao Brasil, após mais de um ano cuidando de doentes e feridos num acampamento da organização Médicos Sem Fronteiras, descobre que havia trocado cartas de amor não com sua namorada, Beta (Didone), mas sim com a irmã dela, Dani (Cleo).

Enquanto passam por encontros e desencontros amorosos, eles tentam esclarecer o mal-entendido e buscar novos caminhos para suas vidas.

Como é usual em sua obra, o diretor referenda sua narrativa através do diálogo e, lembrando o cineasta francês Alain Resnais, com muitas cenas que, a uma primeira vista, podem parecer desnecessárias, mas trazem muitos pontos para reflexão.

Bernstein é detentor de vários prêmios e um dos mais importantes foi conquistado no Festival de Sundance/1996 onde ganhou, junto com João Emanuel Carneiro e Walter Sales, a primeira edição do NHK de roteiro com “Central do Brasil”.

Seguiram-se vários outros, entre eles, o C.I.C.A.E Award, no Festival de Berlim 2004, na prestigiada Mostra Panorama, para “O outro lado da rua”, estrelado por Fernanda Montenegro e Raul Cortez.

Bernstein também dirigiu o drama familiar “Meu pé de laranja lima”, (2012), com José de Abreu e Caco Ciocler; e os documentários “A era dos campeões” (2011) e “Um dia de praia com Roberto Damatta, que traz um olhar sobre o relacionamento entre a praia e os cariocas.

Como roteirista, além de “Central do Brasil”, é coautor de Chico Xavier”, “Faroeste cabloco”, “Terra estrangeira” e “Zuzu Angel”, entre outros.

Na televisão, junto com Carneiro, escreveu a série “A cura” e as novelas “Orgulho & Paixão” e “Além do Horizonte” para a TV Globo. Para a TV3 da Catalunha foi roteirista de minissérie “Descalço sobre a terra vermelha”.

No momento, está finalizando “Tempos de barbárie: Ato I: Terapia da Vingança”, com Claudia Abreu, Julia Lemmertz e Alexandre Borges, que tem lançamento previsto para 2023.

O cineasta conversou com o JORNAL DO BRASIL sobre a inspiração para ter realizado “O amor dá voltas”, falou sobre o viés que vem seguindo em sua obra e como se prepara para realizá-la.


JORNAL DO BRASIL - Há sempre muitas motivações para abordar determinado tema em um filme. Mas há sempre aquela que dá um impulso maior. No caso de “O amor dá voltas”, qual foi a principal inspiração?

MARCOS BERNSTEIN - Sempre gostei do gênero “comédia romântica”, desde os clássicos como "Aconteceu aquela noite", do Frank Capra, "O apartamento", do Billy Wilder, pra mim talvez o grande ícone desse gênero, até filmes mais recentes como os escritos pelo Richard Curtis, como "Quatro casamentos", "Notting Hill". Anos atrás estava no Benin, no Oeste da África, fazendo pesquisa para o roteiro de um documentário sobre o Pierre Verger, em que o Gilberto Gil faz parte, e o diretor, o Lula Buarque, ficava ouvindo a música "Gonna Give her All the Love I’ve Got" cantada pelo Marvin Gaye. Ela fala de um homem aparentemente na prisão que mantém seu amor, sua sanidade, através das cartas que troca com a amada. Comecei a pensar em como seria se a pessoa chegasse em casa e não fosse mais nada daquilo. Que ele não tivesse mais amada, apesar das cartas, e que confusão seria essa. Daí, fiz algo totalmente diferente da música, mas tinha aquele clima. Até por isso achei bacana usar a música.


Numa entrevista para o JB, quando do lançamento em Berlim de “O outro lado da rua”, você disse que estava numa fase que preferia abordar em seus filmes temas que envolvam sentimentos – solidão, relacionamentos, enfim, a interação entre as pessoas. Decorridos tantos anos e agora, com esse novo filme em mente, o que acrescentaria a essa declaração?

Acho que, pelo jeito, continuo falando dos mesmos temas e variando os gêneros base dos filmes e as gerações sobre as quais falo. Enquanto em "O outro lado" falava da terceira idade, em "Pé de laranja lima", de uma criança, falo aqui de jovens enfrentando as dores de virarem adultos. Mas de certo modo todos esses protagonistas vivem suas solidões desejando o contato com o outro, o afeto. Meu próximo filme, “Terapia da vingança”, dá para dizer que também lida com isso, mas ao contrário. Alguém que vai perdendo o afeto pleno que já tem e recebe até perder o afeto por si própria. Mas aí já é outra entrevista.


“O amor dá voltas” é uma comédia romântica que contempla, a meu ver, uma característica de suas obras: a ocorrência de mais de um gênero: romance, drama, um quê de humor, suspense às vezes... Poderia falar um pouco sobre isso?

É verdade. Nos filmes que escrevo (ou coescrevo) e dirijo fui percebendo que minha maneira de trazer o real, de trazer um pouco de “como a vida é” pra obras de ficção é não ficar restrito às regras de um determinado gênero. Creio que parto de uma expectativa básica, seja o suspense, seja o drama ou, nesse caso, a comédia romântica, e a partir disso navego, tal como é a vida, pelos outros “gêneros”, seja um momento de humor, outro drama, um romance... Creio que nossa existência é assim, não é? Estamos num momento de relaxamento, rindo de uma piada, e aí temos a notícia da morte de alguém querido que pode mudar o rumo que estávamos tomando. Podemos estar num enterro e logo em seguida conhecer alguém que trará amor ou desastre... Tento, dentro da trama que proponho e do chamado gênero ir colocando isso e tentando atingir o espectador em diversos níveis. Talvez seja mais arriscado, mais complexo e mais sujeito a más interpretações ou desentendimentos, mas, por outro lado, se bem realizado, quando tudo dá certo, acho que pode trazer outro olhar, outra experiência e satisfação. Em "O Amor dá Voltas", creio que mantendo as expectativas de uma comédia romântica, e se divertindo o espectador ganha de “bônus” um road movie, uma pitada de drama, um pequeno musical...


Você tem trabalhado com atores consagrados como Fernanda Montenegro, Raul Cortez, José de Abreu, Cleo, Laura Cardoso e outros... E muito do excelente desempenho se deve em parte ao talento deles e em parte ao fato de você também ser um excelente diretor de atores. Há algum método especial que você siga para conseguir sempre essa sintonia?

Fico muito feliz com essa sua pergunta que recebo como um grande elogio. Dirigir atores sempre foi um dos pontos que mais me entusiasmam na direção. Por isso, adoro cuidar disso pessoalmente, especialmente com atores talentosos como esses que você citou, além dos outros tantos que participaram de meus filmes. Normalmente faço uso de alguns de nossos excelentes preparadores de elenco apenas para não atores, ou atores infantis ainda em formação para me dar um apoio. De minha parte, difícil falar de um método. Fundamental é o processo de escolha, achar o ator certo para um personagem. Feito isso, tudo fica mais fácil. Na preparação, gosto muito de ler com os atores, trocar ideias, ir achando caminhos para deixá-los cada vez mais confortáveis (ou quando é um personagem controverso mais íntimo) com esses personagens. Perto das filmagens passamos as cenas mais próximas do que será no set, mas sem exaurir, porque há atores mais espontâneos que necessitam de espaço para a surpresa na hora do “ação”. E aí é buscar os detalhes para que a mágica aconteça; e tento fazer isso com cumplicidade, ao pé do ouvido do ator. Nesse filme, acho que conseguimos uma dinâmica, uma integração especial com nosso trio principal, a Cleo, o Igor Angelkorte e a Juliana Didone. Sinto que em cena eles passam a intimidade e o carinho (além do amor, claro) que esses personagens têm um pelo outro. Do medo que eles têm de se magoar. E como isso acaba os enredando em confusões ainda maiores, mais divertidas e mais difíceis de resolver.

 

Pode adiantar alguma coisa do próximo projeto?

Como você bem detectou em meus filmes, parto para outro “gênero base”. Nesse caso, o filme de vingança. Parte do título, "Terapia da vingança", até já denuncia isso. A partir daí, trafego pelo drama, pelo filme de ação, temos perseguições, emboscadas e, acho que posso dizer isso, quase pelo terror, já que a personagem principal, Carla, vivida pela Claudia Abreu, parte numa espiral de violência que ela mesma rejeita e despreza. O filme fala de uma mulher cercada de afeto que tem sua vida virada pelo avesso quando uma tragédia muito brasileira acontece com sua filhinha, e ela parte num processo de destruição e também autodestruição. Ano que vem nos cinemas.

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