CADERNOB
‘Esperando Godot’, de Gardenberg e Martinez, reabre o Teatro Oficina
Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO
redacao@jb.com.br
Publicado em 14/12/2021 às 16:30
Alterado em 14/12/2021 às 16:30

“Esperando Godot”, de Monique Gardenberg e José Celso Martinez Corrêa, traz de volta os eventos no Teatro Oficina e homenageia os 63 anos da companhia mais antiga em atividade ininterrupta no Brasil.
Para essa celebração, a cineasta e o diretor teatral retornam à peça teatral do dramaturgo irlandês Samuel Beckett, 20 anos depois de uma primeira montagem no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro. Desta vez, além de produtora, Monique é também diretora de uma versão audiovisual da peça, que está sendo exibida on-line na plataforma Sympla.

Marcelo Drummond interpreta Estragon ou Gogo, e Guilherme Calzavara vive Vladimir ou Didi, os dois palhaços-mendigos que se encontram num parque e esperam pela chegada de Godot, que eles não sabem quem é. Enquanto aguardam, a dupla se encontra com personagens que passam pela estrada: em cada um dos dias consecutivos (em dois atos) em que se passa a ação, aparecem Pozzo (Pascoal da Conceição) e seu escravo Lucky (Danilo Grangheia); e o Menino Mensageiro (Raphael Moreira), que traz notícias inquietantes que podem determinar a perpetuação da inércia ou a libertação da paralisia.
O eixo principal é o absurdo da eterna espera. Estamos todos esperando por algo que nunca chega. Os personagens perdem um pouco a noção do tempo, tendo como referências o pôr-do-sol, o crepúsculo e a lua.
O desempenho dos atores é excelente e na medida certa. A encenação se passa no interior do Teatro Oficina, estendendo-se para o parque ao lado.

Em entrevista exclusiva para o Jornal do Brasil, Monique contou como surgiu a ideia para realizar “Esperando Godot”, e como vê a similaridade da peça de Beckett com os dias de hoje.
JORNAL DO BRASIL - Que fator teve maior influência na escolha da peça para homenagear os 63 anos do Teatro Oficina?
MONIQUE - Tudo aconteceu por acaso e de forma muito espontânea. No meio do primeiro ano de pandemia, Zé Celso me ligou para conversar. Era clara sua frustração com a imobilidade, isolamento e impossibilidade de trabalhar. Contei a ele que vinha ensaiando e filmando pequenas peças de forma remota ou filmando com todos os protocolos de segurança. Zé se animou com essa possibilidade e logo lembramos de Godot, peça que havia montado em 2001 no CCBB do Rio de Janeiro. Vinte anos depois, ela ganharia uma nova versão, no Teatro Oficina.
Beckett receava que na adaptação para as telas o espírito da peça fosse perdido na linguagem fílmica. O que não acontece com sua filmagem e, por sinal, também não aconteceu na adaptação de Michael Lindsay-Holl em 2001. Foi difícil essa transposição?
O Teatro Oficina oferece a possibilidade de você penetrar na cena, diferentemente de um palco italiano. As câmeras podiam se aproximar ou se afastar inteiramente de Gogô e Didi. Reforçar sua solidão ou captar seus breves encantamentos. Havia uma troca muito grande entre as câmeras e os atores, elas estavam vivas, atuando com eles. Nesse sentido, deixou de ser uma peça filmada para virar mesmo um filme. Procurei posicionar as câmeras de forma a servir à encenação do Zé Celso, em todas as suas explorações daquele espaço magnífico criado por Lina Bo Bardi. Às vezes parava e pensava: meu Deus, aqui reunidos, diante dos meus olhos, Zé, Lina e Beckett.
Esperando Godot parece estar cada dia mais atual. Qual similaridade você vê entre a ficção e a nossa realidade nos dias de hoje?
Esperando Godot fala dessa espera eterna do homem por algo extraordinário que nunca acontece. Estávamos esperando a vacina. O Governo Federal tinha acabado de dispensar a Pfizer, nosso presidente pregava o oposto do que precisávamos para proteger as vidas das pessoas. Estávamos no grau máximo do desamparo. Éramos todos Gogô e Didi.