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Sítio Roberto Burle Marx, um legado para a humanidade

Preocupado com a preservação do seu acervo, Burle Marx doou o sítio ainda em vida para o governo federal, em 1985, nove anos antes de morrer

Por Jornal do Brasil
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Publicado em 19/04/2021 às 11:44

Burle Marx comprou a propriedade em parceria com o irmão, Siegfried, em 1949 e fez dela um laboratório para conhecer o comportamento da flora brasileira Tânia Rêgo/Agência Brasil

O Sítio Roberto Burle Marx, onde morou e fez experimentos o mais famoso dos paisagistas brasileiros, é candidato a entrar para a lista do patrimônio mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) este ano.

Localizado em Barra de Guaratiba, na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, o sítio abriga uma coleção de mais de três mil e quinhentas espécies de plantas de regiões tropicais e semi-tropicais.

Burle Marx comprou a propriedade em parceria com o irmão, Siegfried, em 1949 e fez dela um laboratório para conhecer o comportamento da flora brasileira, até então pouco valorizada nos projetos paisagísticos. A partir dessas experiências, ele criou o jardim tropical moderno, que representou “uma mudança de paradigma no paisagismo, uma grande contribuição para a humanidade”, explica a diretora do sítio, Claudia Storino.

Boa parte das plantas que podem ser vistas no sítio hoje veio das excursões que Burle Marx fazia pelos diversos biomas brasileiros. O arquiteto e paisagista José Tabacow participou de várias delas, primeiro como estagiário e depois como sócio de Burle Marx. Ele relembra que a única situação que deixava o amigo irritado durante as viagens eram os flagrantes de destruição do meio ambiente.

O auxiliar em preservação e defesa ambiental, Sinval Pereira Filho, que começou a trabalhar no sítio aos 20 anos, ainda sob o comando de Burle Marx, conta que nessas expedições o paisagista chegou a descobrir cerca de 50 novas espécies, muitas batizadas com o seu nome, como o orthophytum burle-marxii.

Na visita ao sítio também é possível apreciar como o paisagista aproveitou materiais de prédios demolidos em calçamentos, cascatas, portas e fachadas na propriedade. “Ele foi precursor em muitas coisas”, diz a educadora Suzana Bezerra, que apresentou o espaço à equipe do Caminhos da Reportagem, da TV Brasil, e ressaltou a genialidade do artista.

Na casa onde Burle Marx morou são preservados alguns objetos pessoais, como óculos, roupas e calçados, assim como um vasto acervo de obras do paisagista, que era um artista de múltiplas faces: pintor, escultor, designer de joias e até cantor de ópera. A professora de História da Arte da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Vera Beatriz Siqueira, avalia que tanto no paisagismo quanto na pintura a produção de Burle Marx mantém vínculos com as nossas tradições culturais, com a nossa realidade e com a nossa paisagem mesmo quando se apresenta na forma abstrata. “Ele cria uma espécie de ambiente que eu chamo de ecologia da forma moderna”, explica a professora.

As salas também abrigam a enorme coleção de arte popular que Burle Marx adquiriu ao longo da vida. A auxiliar de serviços gerais, Maria Goreti Ferreira de Lima, que começou a trabalhar na casa durante os preparativos para a festa de 80 anos do paisagista, diz que limpa as peças com mãos de seda e zela para manter viva a memória do Seu Roberto, como se refere a ele.

“Se eu procurei compreender o jardim aplicado à nossa natureza, vamos dizer, à nossa natureza humana e sobretudo às necessidades brasileiras, é porque eu não quero fazer apenas jardins para uma casa de milionários. Eu gostaria de fazer jardins que o povo pudesse participar”, eternizou Burle Marx, em entrevista ao programa "O Mundo Mágico", da mesma emissora.

Preocupado com a preservação do seu acervo, Burle Marx doou o sítio ainda em vida para o governo federal, em 1985, nove anos antes de morrer. Hoje o espaço está sob a responsabilidade do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan. Carlos Alberto Moreira da Silva, coordenador da manutenção do acervo botânico, conta que o desafio dos funcionários mais antigos agora é preparar os mais novos para cuidar desse presente deixado pelo paisagista. “As pessoas precisam saber disso aqui pra dar o valor que o sítio tem e merece”, afirma.

Herdeira do escritório de paisagismo criado por Burle Marx, a paisagista Isabela Ono comemora a candidatura do sítio a patrimônio mundial. No fim de 2019, ela e os dois sócios criaram o Instituto Burle Marx com a finalidade de tornar público também o acervo de projetos, croquis, fotos, maquetes, entre outras peças, que pertencem ao escritório. “Estamos na torcida. Só junta forças pra celebrar esse legado tão importante e tão grande que o Burle Marx deixou pra nós”, diz Isabela.

Por conta da pandemia, a reunião do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco será realizada online este ano, entre os dias 16 e 31 de julho.(com Agência Brasil)