N ão importa que a emoção causada pelos hits dos anos 60 e 70 seja de, digamos, segunda mão.
Não importa o preço dos ingressos e a infame área vip (aqui apelidada de “pista prime”).
Não importa que, no fundo, tudo não passe de um espetáculo inflado, exibicionista e populista.
O que importa: Paul McCartney, o homem que se encarrega de manter a chama da tocha acesa há quase 50 anos pelos Beatles, está entre nós e realizou um dos mais empolgantes e emocionantes shows de rock da atualidade.
Retomando sua turnê brasileira (iniciada no começo do mês em Porto Alegre), Macca cumpriu duas datas no estádio do Morumbi, nas noites de ontem e anteontem.
Pelo visto e ouvido no show de domingo, assistido por cerca de 64 mil pessoas, Paul não apenas mantém o domínio completo do idioma pop, ao recriar as músicas dos Beatles e um punhado de seus sucessos solo; o cantor também parece tão jovial (aos 68 anos) quanto de sua primeira visita ao Brasil, em 1990.
Voz em for ma (mas evitando os excessos), sorridente, tão esguio e ágil quanto possível para um senhor de sua idade, o eterno Beatle faz um espetáculo grandioso e nostálgico, mas sem saudosismo e cheio de vitalidade.
Nos telões que ladeiam o palco, uma montagem de fotos ilustrando a carreira dos Beatles e o cenário musical dos anos 60 é a senha para a entrada do homem.
O setlist é mais do que conhecido, mantido quase sem alterações desde o começo da turnê Up and Coming.
Ainda assim, chega a ser surpreendente a abertura com o resgate de Venus and Mars e R o ck s h o w , duas músicas da fase Wings (de 1976), que boa parte da audiência não deve recon h e c e r.
O delírio causado pela aparição do cantor, entretanto, independe do repertório.
Quarenta e sete anos depois do início oficial da beatlemania, apenas a visão de Paul ainda é capaz de causar histeria.
Quando ele emenda Jet (1973), primeiro sucesso da noite, aí é que a coisa explode.
Ao chegar o primeiro resgate do repertório dos Beatles – a ancestral All my loving (1963) – não há mais retorno para a comoção.
O Paul safra 2010 é um Paul roqueiro.
Eternamente lembrado pelas baladas, o cantor privilegiou as guitarras na formação de sua banda.
Ladeado por Rusty Anderson, capaz de recriar à perfeição os riffs e solos de George Harrison e de Denny Laine (guitarrista original dos Wings), e Brian Ray, que se reveza na guitarra, no baixo e no violão, Macca também se concentra nas seis cordas, em vez das quatro com as quais se notabilizou.
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