PEC da blindagem é resposta ao STF sobre emendas, diz cientista político

Para Thiago Trindade, trata-se do controle sobre o orçamento por parte dos deputados

Por POLÍTICA JB com Jornal GGN

O presidente da Câmara, Hugo Motta, em meme nas redes sociais. A cena da bebeção de uísque no gargalo é verdadeira

Por Carla Castanho - A chamada “PEC da blindagem” é mais do que uma tentativa de ampliar privilégios de parlamentares. Ela deve ser lida como parte do embate aberto entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), cujo centro é o controle sobre as emendas parlamentares.

“Todo o conflito hoje STF e Congresso, no centro dele, está a questão das emendas. É difícil saber qual movimento veio primeiro, mas eu sempre analiso esses embates STF-Congresso a partir dessa contenda em torno das emendas”.

A opinião é do professor do Instituto de Ciência Política da UnB e coordenador do Observatório das Metrópoles em Brasília, Thiago Trindade, em entrevista à TV GGN [confira abaixo]. Ele lembra que a decisão recente do ministro Flávio Dino, que bloqueou parte das chamadas emendas PIX por suspeita de corrupção, acirrou os ânimos. 

Embora a versão atual da PEC tenha suavizado partes do texto apresentado em agosto, ela preserva o ponto central ao determinar que qualquer investigação contra parlamentares dependa da autorização prévia da Câmara ou do Senado. Para Trindade, a medida equivale à blindagem. “É aquela história, quando um corpo profissional é responsável por investigar ele próprio, é óbvio que isso não vai acontecer”.

A disputa ganhou um novo capítulo nesta quarta-feira (17), quando Dino determinou que a AGU e o TCU apresentem, no prazo de 15 dias, um cronograma de fiscalização das emendas Pix utilizadas entre 2020 e 2024. O modelo de repasse direto para estados e municípios, embora mais ágil, é alvo de críticas justamente por reduzir a transparência e abrir brechas para uso político das verbas.

Adiar a anistia?
O professor destaca ainda uma leitura política sobre a manobra, com a possibilidade da PEC ser usada para empurrar com a barriga a votação da anistia aos golpistas do 8 de janeiro. “A Daniela Lima comentou que essa questão da PEC é uma tentativa do Hugo Motta de colocar o foco nesse tema para adiar o debate sobre a anistia. Estamos a ver se isso se comprova, mas a leitura é plausível”, avalia.

O movimento reflete também o cálculo dos parlamentares diante do Judiciário. “Nenhum deputado hoje, com bom senso, quer entrar em confronto direto com o STF. Então a PEC surge como uma saída para acalmar os ânimos, enquanto se ganha tempo em relação à anistia. Mas, no fim das contas, sempre voltamos para a questão das emendas, porque é aí que está o centro do conflito”.

Principais mudanças com a PEC da Blindagem
Entenda de que forma a proposta altera o andamento de processos criminais envolvendo parlamentares e reforça as garantias de imunidade.

Autorização para processo: Para que o STF inicie uma ação penal contra um deputado ou senador, é exigido o aval da respectiva Casa em votação secreta, com maioria absoluta. Se a autorização for negada, o processo é suspenso, e o prazo de prescrição é interrompido até o final do mandato.

Foro privilegiado ampliado: O julgamento de parlamentares no STF seria limitado a casos estritamente ligados ao exercício do mandato. Além disso, a proposta estende o foro privilegiado também para presidentes de partidos com representação no Congresso.

Inelegibilidade por condenação: Um parlamentar só se tornaria inelegível após a confirmação da condenação em um tribunal superior (segunda instância), e não mais automaticamente após a primeira condenação.

Imunidade de opinião: A proposta torna a imunidade material (para opiniões, votos e palavras) dos parlamentares absoluta, sem a possibilidade de responsabilização judicial.

Restrições à prisão: A prisão em flagrante de um parlamentar seria permitida apenas para crimes inafiançáveis, como racismo e terrorismo. Mesmo nesses casos, a prisão deve ser avaliada pela Câmara ou Senado em até 24 horas, que decide, por voto secreto e maioria absoluta, se a detenção será mantida.

Entrevista - Thiago Trindade