Áudios indicam que gastos de Michelle eram pagos em dinheiro, o que preocupava Mauro Cid
Conversas interceptadas pela PF e obitdas pelo UOL atestam que o ex-ajudante de ordens temia que prática fosse comparada a rachadinha
Conversas interceptadas pela Polícia Federal (PF) revelam trocas de mensagens realizadas entre o ex-Ajudante de Ordens da Presidência de Jair Bolsonaro (PL), o tenente-coronel Mauro Cid, e duas assessoras de Michelle, que revelam a existência de uma orientação para o pagamento em dinheiro em espécie das despesas da ex-primeira-dama.
De acordo com a transcrição dos áudios de WhatsApp que constam na intercepção e foram obtidos pelo portal UOL, Cid temia que a prática fosse caracterizada como um esquema de rachadinha, porque não havia comprovação da origem dos recursos. O ex-ajudante foi preso na semana passada por suspeitas de fraude em cartões de vacinação.
Conforme reportagem do UOL, a PF analisou as transações financeiras de Mauro Cid e chegou a indícios de um esquema de desvios públicos para pagar as despesas de Michelle Bolsonaro.
O relatório de análise da PF revela a existência de uma "dinâmica sobre os depósitos em dinheiro para as contas de terceiros e a orientação de não deixar registros e impossibilidades de transferências".
A investigação ainda detectou que a primeira-dama usava um cartão de crédito vinculado à conta de uma amiga sua, Rosimary Cardoso Cordeiro, que era assessora parlamentar no Senado.
Ao realizar quebras de sigilo bancário de Mauro Cid e outros funcionários do Planalto, a PF detectou depósitos em dinheiro vivo para Rosimary com o objetivo de custear as despesas com o cartão de crédito, tentando ocultar a origem dos recursos.
Por isso, duas assessoras da primeira-dama, Cintia Borba Nogueira e Giselle dos Santos Carneiro da Silva, conversaram entre si e com Mauro Cid manifestando preocupação sobre irregularidades no pagamento de despesas de Michelle.
Veja a troca de mensagens
Nos áudios, as duas assessorias conversam com Cid sobre as irregularidades no pagamento das despesas de Michelle. Elas queriam convencer Michelle a parar de usar o cartão de crédito vinculado a sua amiga, mas sem sucesso.
"Então, hoje é essa situação do cartão realmente é um pouco preocupante. O que eu sugiro para você é o seguinte. No momento que você for despachar com ela, é esse assunto. Você pode falar com ela assim sutilmente, né? (...) Mas eu acho que você poderia falar assim: dona Michelle, que é que a senhora acha da gente fazer um cartão para a senhora? Um cartão independente da Caixa. Pra evitar que a gente fique na dependência da Rosy. E aí a gente pode controlar melhor aqui as contas. (...) Pode alertá-las o seguinte, que isso pode dar problema futuramente, se algum dia, Deus o livre, a imprensa descobre que ela é dependente da Rose, pode gerar algum problema”. disse Cintia Borba Nogueira, no dia 30 de outubro de 2020.
Eis que Giselle Carneiro acionou o Coronel Cid quase um mês depois, no dia 25 de novembro:
"Coronel, bom dia. Ontem eu conversei com a senhora Adriana para saber se ela tinha falado com a dona Michelle né. Ela falou que conversou. Explicou, falou todos os problemas, preocupações, né. (...). Mas então o resultado foi que a dona Michelle ficou pensativa. Segundo a dona Adriana, ficou pensativa, mas que vai continuar com o cartão. E ela falou que tem, tem os comprovantes assim, né? Que esse cartão já era bem antes do presidente ser eleito. Mas de qualquer maneira, a dona Adriana falou que ela ficou pensativa, né? Ontem mesmo já fizemos uma compra, mas foi em outro cartão. Então eu estou vendo que realmente tá sendo de pouco uso o da Caixa. Mas por enquanto é isso. Obrigada", disse.
Após ouvir o relato de Giselle, Mauro Cid afirma que a situação das despesas da primeira-dama poderia ser alvo de investigações por sua semelhança com um esquema de rachadinha (desvio de recursos públicos). Cid compara com o caso do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente que foi denunciado sob acusação de peculato pelo Ministério Público do Rio.
"Giselle, mas ainda não é o ideal isso não tá? O Cordeiro conversou com ela, tá, também. E ela ficou com a pulga atrás da orelha mesmo: tá, é? É. É a mesma coisa do Flávio. O problema não é quando! É como deputado, rachadinha, essas coisas", respondeu Cid, ao continuar:
"Se ela perguntar pra você ou falar alguma coisa ou comentar, é importante ressaltar com ela que é o comprovante que ela tem. É um comprovante de depósito, é comprovante de pagamento. Não é um comprovante dela pagando nem do presidente pagando. Entendeu? É um comprovante que alguém tá pagando. Tanto que a gente saca o dinheiro e dá pra ela pagar ou sei lá quem paga ali. Então não tem como comprovar que esse dinheiro efetivamente sai da conta do presidente. O Ministério Público, quando pegar isso aí, vai fazer a mesma coisa que fez com o Flávio, vai dizer que tem uma assessora de um senador aliado do presidente, que está dando rachadinha, tá dando a parte do dinheiro para Michelle", concluiu.
Em janeiro, uma reportagem do portal Metrópoles apontava o ex-ajudante como o responsável por pagar as contas do clã presidencial em dinheiro vivo, e a tentativa de apurar se Cid operava uma espécie de “caixa paralelo” por meio de saques de recursos dos cartões corporativos. À época, o esquema foi é negado por Bolsonaro.