ASSINE
search button

O Jornal Brasil continua

Compartilhar

Pouco depois da República, Rodolfo Dantas, conselheiro do Império, filho do Senador Dantas e intelectual importante, criou o JORNAL DO BRASIL. A ideia que o animava — a ele e a seus amigos, como o Barão do Rio Branco, Joaquim Nabuco e José Veríssimo — era a ressurreição da Monarquia. Foi extraordinária aventura, inclusive industrial, pois Dantas investira em máquinas e métodos revolucionários para a época. Pouco tempo depois, empastelado porque expressara luto pelo falecimento de D. Pedro II, o jornal passou para a responsabilidade de Rui Barbosa e para o lado da República. Também essa foi uma aventura efêmera, pois o Marechal Floriano colocou seus esbirros atrás do opositor. Durante muitos anos, então, esteve nas mãos dos Mendes de Almeida, e com eles instalou-se na Avenida Rio Branco, entre as Ruas Sete de Setembro e da Quitanda, onde o frequentei pelas mãos de Odylo Costa, filho. 

Tratava-se de uma aventura maranhense. Nos anos 20, o jornal tornou-se propriedade do conde Pereira Carneiro. Tornara-se um fenômeno, um jornal que era extremamente lucrativo, mas não tinha mais importância. Seu sustentáculo não era a indústria ou o comércio, mas os humildes que buscavam os classificados, que cobriam o jornal quase todo, a começar da 1ª página. O conde casara-se em segundas núpcias com uma filha do professor maranhense Dunshee de Abrantes, Maurina, a condessa Pereira Carneiro, que, ao enviuvar, resolvera transformar o jornal em coisa que importasse para a cidade e o país. Convocou Odylo. Com uma longa experiência — começara a trabalhar no “Jornal do Comércio” em 1930, aos 16 anos — e seu temperamento conciliador, Odylo conciliou a tradição de velhas figuras, como a colaboração de Aníbal Freire, com a renovação, trazendo Amílcar de Castro para fazer a arte gráfica e, para a redação, Wilson Figueiredo, Quintino de Carvalho, Araújo Neto, Armando Nogueira ao lado de muitos jovens, jovens mesmo. 

Fiz parte indiretamente desse grupo, como correspondente no Maranhão — e, por ordem da condessa, com um cabo da Western Co franqueado para meu uso. O JORNAL DO BRASIL, com a equipe de Odylo, rapidamente saiu de seu apagado papel de vendedor de anúncios classificados para competir, e logo ultrapassar em importância com os grandes jornais da capital e do país: o “Correio da Manhã”, “O Globo”, o “Diário de Notícias”, o “Diário Carioca”. Só “O Estado de S. Paulo”, ainda sob o comando de Dr. Júlio de Mesquita, foi, durante aqueles dias, seu par. A mudança introduzida por Odylo foi de forma e conteúdo, criando um paradigma de qualidade de texto, na exatidão da notícia, na apresentação, na profundidade dos temas, na separação entre notícia e opinião — e, aí, no assegurar a liberdade dos colaboradores. 

Aquele tempo ficou marcado na história do jornalismo brasileiro. O JORNAL DO BRASIL tornou-se o primeiro jornal do Brasil. Passaram-se mais de 50 anos, ele teve altos e baixos — e não posso deixar de mencionar dois grandes jornalistas que por muitos anos aí fizeram a melhor crônica política do Brasil, Carlos Castello Branco e Luiz Antônio Villas-Bôas Corrêa —, acabou deixando de ser impresso e passando a existir apenas no mundo virtual. Parecia seguir a tendência mundial. Agora ressurge. Numa época em que todos falam que vai acabar o jornal impresso, demonstra que há lugar para ele. O seu passado, sua história, a coragem do desafio, a esperança de que volte aquela época dourada impõe a todos que acompanhem atentamente esse recomeço.

*José Sarney, escritor e político, presidente da República entre 1985 e 1990