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O problema da saúde pública

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A saúde é direito de todos e dever do Estado. Precisa ser garantida através de políticas sociais e econômicas que reduzam riscos de doença e de outros agravos. E,  mediante ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. 

Isso é o que diz o artigo 196 da Constituição Federal de 1988. No entanto, alguns estados, especialmente o Rio de Janeiro, parecem desconhecer completamente esse item  e ignorá-lo. Quando entrei na faculdade de medicina em 1998, há mais de 20 anos atrás, a prestação da assistência e serviços de saúde pelo Estado do Rio de Janeiro aos seus cidadãos já era precária. E os hospitais estaduais, completamente desabastecidos de tudo. Sem recursos humanos em todas as áreas (enfermeiros, médicos de todas as especialidades, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas), sem o maquinário tecnológico, como tomografia computadorizada (é inadmissível que em pleno século 21 um hospital público não disponha de um tomógrafo), sem leitos de terapia intensiva para o tratamento dos casos de maior gravidade, sem remédios, equipamentos hospitalares e insumos básicos. 

Mas, naquela época, a população apresentava um sentimento de fé de que as coisas iriam melhorar. Afinal, não podemos ser pessimistas e achar que as coisas só podem piorar.  

Daquele tempo para cá, diversos governadores entraram e saíram do Palácio Guanabara. Fizeram todas as promessas possíveis e inimagináveis. Diziam que a saúde em geral e o tratamento nos hospitais iria melhorar. 

Lamentavelmente, nossa realidade, passados todos esses anos, piorou e parece um filme de terror. Um pesadelo.  

A situação é de calamidade pública, sem qualquer possibilidade de melhora, nem a médio ou longo prazo. A população carioca encontra-se abandonada pelo poder e pelas autoridades. 

Pacientes oncológicos que fazem quimioterapia antes de operar para a retirada de um órgão acometido pelo câncer, não conseguem fazer a cirurgia que deveria acontecer  imediatamente após o término da químio. O tratamento fica paralisado e demora muitos meses. Isso também acontece com a radioterapia. O resultado dessa combinação catastrófica se reflete na progressão da doença e na ocorrência de metástases. 

Na quase totalidade dos hospitais estaduais podemos encontrar trinta pacientes internados em uma área destinada a apenas quinze. 

Sem médicos de todas as especialidades clínicas e cirurgiões, remédios, materiais cirúrgicos, são suspensos milhares de procedimentos cirúrgicos e aparece a famosa fila de espera que ultrapassa 12 meses. 

No Hospital Universitário Pedro Ernesto, por exemplo, portadores de câncer da próstata em progressão deixam de receber, por falta de medicamento, um importante hormônio determinante para o controle da progressão da doença, o Zoladex. Pacientes transplantados de rim na mesma unidade hospitalar e que precisam ser tratados a longo prazo com medicação imunossupressora, do dia pra noite descobrem que a referida medicação deixou de existir nos centros de distribuição do Estado, e acabam perdendo o rim transplantado. 

A condenação vem sempre em cima de quem mais necessita de ajuda, a população carente. 

Carente de atenção, saúde, segurança pública, educação, e, no final de tudo, de uma política que seja voltada para os interesses sociais.  

Até quando seremos condenados a essa sentença mortal?

* Luiz Otávio Nazar é Diretor do Hospital Geral do Ingá, em Niterói, e especializado em Saúde Pública