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A verdade sobre a recuperação fiscal do Rio de Janeiro 

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O Estado do Rio conseguiu o “feito” de se enquadrar, integralmente, nos requisitos exigidos para a adesão ao regime de recuperação fiscal da União. Que fique claro: a constatação não é um motivo de comemoração. Afinal, trata-se de um feito negativo, tamanha foi a irresponsabilidade dos governos Cabral e Pezão. Listo três cenários que eles alcançaram com surpreendente maestria, para desventura da população e, principalmente, dos mais pobres: 

1- Nossa receita corrente líquida anual é menor do que a dívida consolidada ao final do exercício passado;

2- O total das despesas liquidadas com pessoal (apuradas na forma do Artigo 18 da Lei Complementar 101/2000), com juros e amortizações, é inferior a 70% da receita corrente líquida aferida no ano passado;

3-O valor total das obrigações contraídas é maior do que as disponibilidades de caixa de recursos sem vinculação. 

Assim, depois de muito estudo e buscando material consistente para tratar com a devida responsabilidade esse assunto, preciso prevenir que o Estado do Rio, além de estar prestes a cair numa armadilha, vai piorar sua situação fiscal e financeira, a médio e longo prazo, e ainda vai inviabilizar totalmente as próximas administrações estaduais. 

Em primeiro lugar, a federação que aderir ao regime de recuperação fiscal deverá desistir de todas as ações judiciais que tenha contra a União ou de contratos de dívidas administrados pela Secretaria do Tesouro Nacional. O Estado do Rio não poderá, por exemplo, receber milhões de créditos relativos à compensação da Lei Kandir. Jogará dinheiro pela janela. 

Tão grave quanto isso é um outro absurdo que me leva a afirmar: a Cedae já está vendida. Sim, não há outra conclusão a fazer. Isso porque a adesão ao regime de recuperação pressupõe a autorização de privatização de empresas dos setores financeiro, de energia, de saneamento e outros, com vista à utilização dos recursos para quitação de passivos. 

No caso específico do Rio, a Assembleia Legislativa autorizou dar a Cedae como garantia de um empréstimo da ordem de R$ 3,5 bilhões. Pelos termos do plano de recuperação fiscal, essa transação poderá ser feita com uma instituição pública ou privada. Se não houver a quitação no futuro, a Cedae será transferida para o banco que emprestou o dinheiro. Ora, alguém tem dúvida que o estado não tem e não terá condições durante um bom tempo de saldar esse compromisso? 

Além disso, se for assinado, o acordo terá reflexos também em administrações futuras, pois os estados que aderirem ficarão proibidos de conceder reajuste a seus servidores;  de criar cargos que aumentem despesas; de realizar concursos  públicos; de criar qualquer despesa de caráter continuado. 

Não somente a forma de pagamento das parcelas que o estado deixará de honrar pelo período de três anos, com possibilidade de renovação por mais três, é draconiana. As outras medidas são uma verdadeira intervenção federal e uma decretação pública, por meio de lei, da falência do Estado. Por isso, é necessário, antes que esse acordo seja assinado entre as partes, que ele seja discutido pela sociedade organizada, pois o texto, guardado a sete chaves, vai muito além do que se tem dito até agora. A sobrevida dada às finanças públicas do Rio é mínima, não envolvendo sequer a garantia de pagamento  dos servidores estaduais no próximo ano. 

Estamos, portanto, diante de um típico caso em que é preciso pensar antes de agir. 

* ex-governador do Rio de Janeiro