Nos últimos anos temos presenciado a quebra de recordes históricos de
temperaturas em diversas partes do mundo, com registros de picos de altas e
baixas temperaturas. O mesmo pode-se dizer dos índices de umidade relativa do
ar, que colocam municípios em estado de alerta devido ao ar muito seco. Estes
são alguns dos fenômenos que terão sua frequência e intensidade aumentadas com
o avanço das alterações climáticas derivadas de ações humanas, ao qual
denominamos de clima antropogênico.
A onda de frio que atingiu o Brasil no mês de julho, mesmo
tendo um caráter natural, já que fenômenos semelhantes têm ocorrências comuns
durante o inverno, provavelmente teve sua intensidade aumentada devido às
alterações nas correntes atmosféricas, alteração esta ocasionada pelo
aquecimento global. O mesmo pode-se dizer da onda de calor que está causando
mortes e prejuízos na Europa e na Ásia.
Quando uma região sofre por alguns dias com temperaturas
muito maiores ou menores do que a média para a época, a população sofre com desconfortos.
No entanto, quando esse quadro se instala por tempo maior, os danos refletem-se
diretamente na falta de estrutura para suportar tais condições, causando
prejuízos econômicos (principalmente relacionados à agricultura), de saúde e
até mesmo mortes. Se as diversas previsões feitas sobre as consequências do
aquecimento global se concretizarem, como está acontecendo, é este cenário
preocupante que se instalará em diversas regiões do planeta.
As alterações climáticas proporcionam ainda a ocorrência de
outros fenômenos naturais que afetam a sociedade humana, como o derretimento
das calotas polares - que está diretamente relacionado ao aumento do nível dos
oceanos. A combinação destes fatores ocasionará consequências catastróficas
relativas aos ecossistemas naturais deles dependentes, mas também irá obrigar
milhões de pessoas a migrarem de suas casas, cidades e mesmo países em busca de
condições apropriadas de sobrevivência - exigindo que medidas sejam adotadas
para suprir as necessidades básicas desses refugiados ambientais que, segundo a
Organização Internacional para as Migrações da ONU, em 2050 haverá até 1 bilhão
destes refugiados.
Estima-se que o aquecimento global ocasionará ainda impactos
diretos e indiretos na saúde. Morbidade e mortalidade ocasionadas pelas ondas
de calor e de frio e pela redução drástica da umidade, por exemplo, são
consequências diretas do aquecimento global. O aumento da intensidade de
enchentes – relativo ao aumento da temperatura em certas regiões do planeta -
poderá significar elevação na intensidade de doenças infecciosas, especialmente
aquelas com ciclo de transmissão dependente da água. Outros exemplos são a
possibilidade de aumento da incidência de desnutrição, devido às perdas de
produtividade na agricultura, e aumento de casos de estresse pós-traumático em
pessoas que presenciaram a ocorrência de eventos extremos.
Mas, diante de todas essas perspectivas negativas
relacionadas à saúde e sobrevivência humana, o que pode ser feito? Uma das
diretrizes do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, na
sigla em inglês) sobre as mudanças climáticas, além da redução das emissões de
gases de efeito estufa, é a adaptação. Precisamos nos preparar para sobreviver
às condições climáticas que ajudamos a instalar. Isso significa que as
previsões de alterações devem ser levadas em conta em todas as políticas
públicas, desde as relativas à saúde pública, passando pelas de moradia e
suprimento de necessidades básicas, até aquelas referentes à produção agrícola.
Há ainda um agravante: como em diversas outras situações, as
consequências do aquecimento global não serão distribuídas equitativamente mas
concentradas em regiões do mundo com altos índices de pobreza, como em certos
países em desenvolvimento no Pacífico Sul, e atingirão principalmente a parcela
mais pobre da população, residente em áreas de risco e com acesso a sistemas de
saúde, alimentação e moradia precários.
Sendo assim, a adaptação às novas condições climáticas será
efetiva quando tiver um caráter intersetorial, que permita uma visão holística
da situação, considerando todos os possíveis riscos, ações de mitigação para os
mesmos e enfoque nas regiões que mais sofrerão com as alterações. Deverá ainda
se preocupar com os movimentos migratórios e com o suprimento de serviços
básicos aos refugiados, tendo em vista uma distribuição mais igualitária de
recursos e insumos, em que as diferenças sociais sejam menos exacerbadas. Assim
esperamos.
* Marina Dall’Anese, gestora ambiental pela USP, é analista de negócios da www.neutralilzecarbono.com.br e consultora da www.greendomus.com.br.