Como acontece naturalmente em todo processo de crescimento e
desenvolvimento, o indivíduo tende a mudar seus traços, carregando consigo
algumas marcas do tempo relacionadas ao amadurecimento. Entretanto,
características determinantes em sua gênese podem necessitar de elementos
concretos e tangíveis para justificar mudanças de estilo e comportamento.
Dados recentemente publicados pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) apontam, surpreendentemente, o país num sentido
de desenvolvimento humano que, apesar de não acompanhar literalmente
semelhanças com outras nações de iguais características, nos dá um espírito
otimista numa perspectiva de aproximação nas diferenças regionais, favorecendo
o reconhecimento e inclusão de um grupo populacional marginalizado ao longo da
história.
O Brasil conseguiu, ao longo dos últimos 20 anos, melhorar
11,24% sua expectativa de vida. A Região Nordeste saiu dos piores indicadores
(58,25 anos em 1980) e chegou à margem de 71,2 anos em 2010. Em
termos gerais, houve um ganho de 12,95 anos.
Apesar de convivermos com a moléstia da dificuldade de
acesso nos mais diversos níveis de complexidade da assistência,
gerados pela longa história de poucos investimentos e mau gerenciamento, compartilhamos
hoje um cenário de carências de recursos humanos e estruturais na saúde que
impactam qualquer tentativa de melhora a curto e médio prazos, principalmente
quando falamos da maioria dos estados das regiões Norte e Nordeste, assim como
das periferias das grandes metrópoles. Ainda assim, tivemos melhoras
consideráveis no que diz respeito à taxa de óbito infantil até um ano de idade,
passando o Brasil dos seus 75,8 óbitos para cada mil crianças em 1980
para 16,7 óbitos nesse mesmo grupo em 2010.
Nesse quesito, a Região Sudeste apresentou a maior taxa de
redução percentual, enquanto a Nordeste a maior taxa em valores absolutos.
Alagoas mantém-se com valores aproximados de 30,2 óbitos por mil habitantes
entre 0 e 1 ano, enquanto Santa Catarina apresenta 9,2 (IBGE – 2010). Quanto
à expectativa de vida até cinco anos de idade, saímos do patamar de 84 mortes
entre mil habitantes para 19,4, o que representa uma redução de 76,9%. Na
Região Nordeste migramos de uma zona sombria de 120,2 mortes para 26 óbitos, apresentando
queda de 78,3%.
Fatores como melhora na escolaridade, saneamento básico
adequado, menor desnutrição infanto-juvenil, maior acesso ao sistema de saúde e
acompanhamento pré-natal favoreceram significantemente o quadro atual. Indicadores
relacionados à renda per capita também mostram tendências regionais distintas,
sendo a da Região Sul duas vezes em média maior que a do Norte e do Nordeste.
Convivemos com mais de 2 milhões de brasileiros em situação de miséria plena.
Programas governamentais como Brasil sem Miséria e Bolsa Família,
independentemente do quanto possam gerar críticas relacionadas ao planejamento,
execução e perenidade, têm sua importância no sentido de dar condições mínimas
de subsistência a um grupo populacional, retirando-os de uma linha crítica de
pobreza, favorecendo mesmo que de forma singular sua inclusão social.
Essa nova face do Brasil traz consigo uma intensificação das
marcas de senilidade. E um país com aumento da taxa de sobrevida. Logo, com um
número de idosos que atinge valores médios de 20 milhões de habitantes. Dados
do IBGE de 2010 reconheceram 449.129 indivíduos com idade superior ou igual a
90 anos. Apresentamos uma taxa média de longevidade de 73,4 anos, mas ainda
inferior a países latinos, como Argentina (75,8 anos) e México (76,89 anos),
assim como países desenvolvidos, caso do Reino Unido, Canadá e Japão, com
80,75, 80, 93 e 82,59 anos, respectivamente.
Segundo o IBGE, em 1980 tínhamos uma esperança de vida aos
60 anos de mais 16 anos, quatro meses e seis dias. Já em 2010, nessa mesma
idade a esperança de vida aumentou para 21 anos e seis meses. Também com base
nesses dados apresentamos divergências regionais, com menor expectativa no
Maranhão (68 anos) e maior no estado de Santa Catarina (75 anos). A
ampliação da esperança de vida verdadeiramente representa um grande progresso
para a sociedade, entretanto como nos preparamos para esse envelhecimento? Como
nos preparamos para receber esse novo fenômeno brasileiro? Já temos estratégias
de políticas públicas e de iniciativas privadas que equilibrem suas
consequências?
Países desenvolvidos, que já viveram ou ainda convivem com
esse contingente populacional reconhecem a grande vitória representada pela
melhora dos indicadores de qualidade de vida. Contudo, percebem outros
fenômenos intrínsecos dessa faixa etária, como a queda da renda familiar ou
individual, o isolamento, maior necessidade de assistência à saúde, maior
inatividade e dependência de terceiros. Consequências econômicas são facilmente
percebidas pelo aumento das demandas dos gastos públicos com aposentadorias,
redução da força de trabalho e crescimento econômico, mudanças nos perfis das
doenças prevalecendo as enfermidades crônicas e demenciais, com aumento dos
custos do financiamento à saúde.
Apesar dos inúmeros contrastes comuns ao Brasil e aos
brasileiros, temos que comemorar as etapas conquistadas e nos debruçarmos em
busca de novas ações que proporcionem a jovens e velhos, dependentes ou
independentes, vivam com dignidade no exercício pleno da cidadania.
* Pedro Félix Vital Jr. é coordenador do curso de
medicina da Faculdade Santa Marcelina (SP).