ASSINE
search button

Neurose ou má educação?

Compartilhar

O ano chega ao fim, e a sociedade começa a se movimentar para atender aos apelos do comércio, que instiga a população a consumir. O resultado disso é o constante aumento de pessoas nas ruas, agitação no trânsito e gente apressada para cumprir os seus compromissos. E cresce a neurose coletiva a ponto de, quase sem perceber, deixamos de lado os princípios básicos que, se não norteiam a nossa conduta, pelo menos bem que poderiam ser rotina em uma sociedade civilizada.

Talvez a contundência do tema provoque resposta agressiva por parte de alguns leitores. Talvez surjam críticas contundentes por ser um deputado o autor destas palavras. Mas, sejamos sinceros, vamos colocar a face na vitrine, e que venham as pedradas!

Vamos a um shopping center ou a um mercado, e procuremos as vagas reservadas aos idosos. Ocupadas! Esperamos algum tempo e, para nossa surpresa, notamos que pessoas bem jovens, muito distantes da condição de idosos, estavam com seus veículos ocupando a vaga. Em seguida, a repetição, desta vez, na vaga destinada às pessoas com deficiência.

Circulamos pela cidade. A faixa de pedestres está bem pintada, nítida, mas o pedestre prefere cruzar entre os veículos. Corre dois tipos de riscos: ser atropelado por um veículo, ou ser atingido pelo motociclista em alta velocidade, passando entre os carros, confiante de ser ele o único dono das ruas, avenidas, praças e corredor entre as faixas de rolamento.

No carro ao lado, um som ensurdecedor. Talvez o jovem acredite que o som deva entrar no corpo pelos poros, nunca pelos ouvidos... E a qualidade da música? Não vamos ao ritmo, mas ao conteúdo. Conteúdo? Palavrões, seguidos de outros palavrões, numa cadência em que o chulo e o duplo sentido tomam o lugar da sensatez.

Na rua, na escola, no transporte coletivo, no trabalho, no estádio de futebol, no show artístico, na “balada”, nada é diferente. Desapareceu o saudoso hábito de ceder o lugar aos mais velhos, desconhece-se a elegância de dar preferência à mulher, e a mulher, por sua vez, talvez não tenha consciência disso. Aceita a deselegância, adota o palavrão, adere ao modismo, à deseducação, e não se faz respeitar.

Desapareceram os conceitos de autoridade, respeito, educação. As atitudes em família nem sempre são as mesmas nas ruas. O comportamento coletivo ignora o individualismo e, em grupos, ou em bandos, a agressividade predomina. E a consequência é que a família apenas percebe a gravidade dos fatos quando recebe a má notícia, e tem que ir a uma delegacia ou ao necrotério saber o resultado da omissão ou da falta de atenção para com os filhos.

Na verdade não sabemos, e não temos condições de provocar grandes mudanças. O que precisa mudar é o seio da família, mas ali não há como haver interferência. A família mudou, e os jovens ganharam direitos, sem contrapartidas. Sem deveres, vítimas de um consumismo desenfreado, à mercê de todos os tipos de tentações, temos que admitir que o quadro é desanimador. Sem berço, sem restrições, sem parâmetros, fica fácil entender o que vemos nas ruas.

Já sei, vocês vão dizer que estas são ideias, pensamento de uma pessoa idosa. Temos que concordar. E temos que dizer que muita coisa desandou, outras apodreceram, mas o pior é que, pelo andar da carruagem, a coisa tende a piorar. E muitos de nós, idosos, não estaremos aqui para conferir.

* Vitor Sapienza, deputado estadual (PPS) e economista, é presidente da Comissão de Ciência, Tecnologia e Informação da Assembleia Legislativa de São Paulo.- www.vitorsapienza.com.br