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Golpe como argumento? 

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Extensa leva de políticos sob suspeita, alguns já com bens bloqueados pela Justiça. Bancos e correios em greve. Instantes atrás, a Polícia Federal reivindicava deveres hierárquicos —  noblesse oblige — dos próprios patrões, sendo que a próxima cartada ninguém sabe ao certo quem dará. O rumo da situação em nada omite os burburinhos salteadores nas insatisfeitas berlindas cotidianas.

Mas a quantidade de fatos surgidos ultimamente nos noticiários brasileiros sobre equívocos de conduta política não assombram mais a população. Poderia ser diferente quando a mentalidade reinante nas elites intelectuais nativas defende uma justiça imediata, mas esquece dos fundamentos? “Ficamos no homem brasileiro e não atingimos o homem”, alertava Octavio de Faria nos anos 30. E o telurismo incutido nesta ideia barra o aparecimento de uma elite deveras aristocrata, pois o legítimo estadista só tem chance de larga atuação num ambiente propício para as grandes responsabilidades de alto calibre existencial.   

Podem aparecer ditaduras esquerdistas ou direitistas, para derrubar um governo ou para fortalecer absurdamente o controle do mando político. Mas ambas inexistem como consequências naturais de um governo solidamente embasado nos princípios.  Uma famosa frase de Lênin — “O Estado somos nós” — diz muito sobre a condição totalitária. Principalmente, quando confrontada com outra frase do próprio: “Uma mentira contada bem frequentemente se torna verdade”. Afinal, a desenfreada gana em busca do poder não mascara a frondosa vaidade estampada no semblante do luciferino ser.

Realmente, surgiu a República no país por meio de um golpe, em 1889.  E, infelizmente, repetiu-se tal ação com não pouca frequência no decorrer do século posterior. Na última ditadura, o estopim final foi o apoio de Jango à insurreição dos sargentos. Disciplina e hierarquia são pilares necessários para as Forças Armadas existirem soberanamente. E valores quebrados numa sociedade — o que dá margem para sutis manobras macunaímicas na disputa pelo poder — bastam para fomentar um tumulto que pode desencadear processos nada agradáveis em uma conjuntura política oscilante.

Na ditadura sob o comando de Floriano Peixoto, o “marechal de ferro”, o monarquista Eduardo Prado exerceu a sua liberdade de expressão e foi gentilíssimamente convidado a dar uma voltinha no exílio. Tempos depois, Gilberto Freyre afirmava peremptoriamente que o Brasil é católico de nascença, para esperneio geral dos niilistas de plantão. De fato, os Estados Unidos da América nasceram republicanos e protestantes, enquanto o Brasil nasceu monarquista e católico. Regimes distintos, mas ambos cristãos. E isso dá o que pensar.

 

* Roberto Muñoz é escritor.