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Será a inflação a saída da recessão?

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                Em 1948 foi ativado um organismo da ONU (um dos cinco regionais), com denominação Cepal (Comissão Econômica para America Latina, que inclui hoje Caribe), com sede em Santiago do Chile, cujo objetivo era contribuir para o desenvolvimento e o relacionamento econômico da região e delas para o resto do mundo, pelas suas particularidades econômicas regionais. Suas teses tiveram grande impacto acadêmico até o período de 1970. Nós jovens acadêmicos nos debruçávamos sobre estas teses. As maiores expressões foram Celso Furtado, que publicou uma série de obras com base em suas pesquisas. Nesta mesma linha Raul Prebisch, este argentino. Também neste ambiente estudou FHC, quando exilado político em 1964.

                Os dois primeiros cada um à sua maneira defendiam uma teoria particular para a América Latina, em termos de desenvolvimento econômico, na época superatrasada em relação aos EUA e mesmo à velha Europa, esta saindo de uma guerra arrasadora.

                Face à inexistência e à dificuldade de formação de capitais, —  sem maiores detalhes, — foi sugerido que a inflação seria um indutor forçado na formação de capital privado e público para o continente. É evidente que seria através de uma inflação controlada. Assim, como os empresários detinham o poder de fixar seus preços, uma vez que mercado não existia, permitia uma acumulação forçada, à custa dos salários represados. Esta acumulação capitalista, embora socialmente injusta, seria o embrião para formação do capitalismo da América Latina. Por este viés, os países aplicaram esta doutrina, nos quais seus PIBs cresceram significativamente neste período (1950 a 1980).  

                Como o dólar neste período estava assumindo hegemonia mundial, com uma estrutura forte e bem administrada, sugeriu-se que este meio era o único capaz de estabelecer todo o processo de controle da economia. Isto é, só uma moeda forte permitiria o desenvolvimento harmônico e consistente. Seria o instrumento básico para formulação de todas as políticas macroeconômicas. Tese absorvida pelo FMI.

                Assim, estava-se diante da questão da teoria estruturalista, que aceitava uma inflação controlada, e a teoria monetarista rígida, defendida pela Escola de Chicago, sendo seu maior expoente Milton Friedman, defensor do laissez faire e do mercado livre. Este confronto de Chicago com os pensadores da Cepal dura até hoje nos círculos acadêmicos.

                A inflação —  de maneira flexibilizada — tem suas “virtudes” de alavancar a economia, em que usaremos apenas o aspecto psicológico. Num período de inflação é comum os vendedores, ao oferecerem seus produtos, preverem o crescimento dos preços para o mês seguinte (por hipótese), induzindo o comprador a decidir pela compra agora para aproveitar os preços baixos, antes que subam no próximo mês. Ora, este processo acelerativo faz com que a produção sempre tenha pedidos em carteira. Isto permitia alavancar o PIB e manter as taxas de desemprego baixas. O grande perigo é as autoridades monetárias perderem as rédeas, e os empresários perderem a confiança no governo. 

                Como qualquer recessão atua nas taxas de desemprego, aqui se invoca a “Lei de Okun”, de que no período dos maiores níveis de inflação da America Latina ocorreram as maiores taxas de crescimento do PIB e por efeito baixos níveis de desemprego.

                A resistência dos meios financeiros internacionais sempre foi ferrenha contra qualquer hipótese inflacionista. Para surpresa geral, vemos agora, com a paralisia americana e europeia, ser sugerido por um Prêmio Nobel de Economia, Robert Engle  (2003), uma inflação controlada ou mais flexibilizada, para saírem do atoleiro em que se meteram. “Um pouquinho de inflação seria benéfico, porque ajudaria a elevar os preços dos imóveis e estimular o setor imobiliário” — disse, recentemente, Engle, durante um congresso da BM&F/Bovespa.  

                Como os países desenvolvidos, particularmente os EUA, caíram na “armadilha da liquidez“, isto é, não tem mais como baixar as taxas de juros para estimular o consumo, a única saída que se vislumbra é apelar para a velha fórmula, da emissão de dinheiro, para estimular as pessoas a comprarem mais.

                Talvez Friedman agora na outra dimensão, junto a nosso Deus cristão, reveja seus conceitos sobre o deus mercado que tanto defendeu.  

Sergio Sebold é economista e professor