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A estratégia chinesa

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Em artigo anterior sobre o tema China (O perigo amarelo), publicado neste JB em 24/08 último, temos demonstrado que a longo prazo estaremos sob o domínio deles, ao menos no terreno econômico. Um trabalhador chinês quando é convidado, através de entidades nacionais que catam no interior do país, operários para as indústrias das grandes cidades, as famílias se despedem como se ele fosse prestar um grande serviço à pátria. Ele parte, com as bênçãos da família, pois para ela está garantida uma renda, que para aquelas plagas a vida também não é tão fácil assim. E quando retornam, durante minguadas férias de duas semanas, retornam como heróis que vieram de um campo de batalha.

Esta é a força moral de uma grande nação. É verdade que lá a lei é duríssima para quem dela se desvia. Dura lex, sed lex (A lei é dura, mas é a lei). A condenação à morte não está muito distante de certos delitos, dos quais aqui no Brasil até fazem chacota. Se para os sociólogos o poder político da China tem características totalitaristas, por sua vez é de se convir que manter em ordem social coesa e pacífica uma massa de 1 bilhão e 300 milhões de gafanhotos humanos é uma tarefa hercúlea e descomunal. Talvez o modelo de conciliar o regime comunista com o modelo de “capitalismo autoritário”, que estão praticando, tenha sido a única forma para garantir a integridade do Estado-nação. Trazer um país do estágio bárbaro (tecnologicamente - não em termos culturais), com os pés mergulhados no Terceiro Mundo, para o século 21 em menos de um século, somente por uma filosofia chinesa de solidariedade e ética consagrada em milênios, seria possível.

Muitas empresas nacionais do Ocidente na impossibilidade de competir acharam que a melhor estratégia para vencê-los era instalar-se, diretamente, no terreiro do inimigo. Ledo engano. Foram para lá gerar emprego para eles, ao preço de nossa desindustrialização. Para os empresários empreendedores foi uma excelente saída, mas para seu país foi uma tragédia econômica. Assim, por falta de espírito de união, onde a solidariedade somente aparece  em casos de tragédia natural de escala, o espírito inescrupuloso da competitividade, como a única forma econômica de sobrevivência, está levando ao colapso do mundo ocidental. Não há espírito de valor patriótico, — com o jargão de que capital não tem bandeira, —  empresas ocidentais ganham rios de dinheiro, comprando dos chineses por centavos e vendendo para nós a “preços de mercado”, que pode chegar a centenas de dólares. Apenas interessa o lucro imediato e a qualquer preço. Usando a expressão de Luciano Pires, profissional de comunicação, é o que se pode chamar de “estratégia preçonhenta”.  O desemprego, na visão de certos empresários irresponsáveis, “não é um problema nosso, é uma estatística que os governos terão que resolver”. Vale lembrar uma frase do saudoso papa João Paulo II: “...o desemprego, para os governos é uma mera estatística, mas para a sociedade e para quem está nessa estatística é uma tragédia”.

Enquanto empresários ocidentais buscavam na terceirização um modelo de redução de custos para melhor competirem entre si, ganhando a curto prazo, a China procurou assimilar essas táticas, criando grandes empresas industriais de alta performance, para a longo prazo  gerarem o domínio do mercado mundial. Infelizmente, este longo prazo está chegando mais rápido do que se pensava. A criação artificial de estereótipos em marcas, símbolos, grife etc, instigando os jovens ao consumo de massa, passando aos chineses a produção física de bens necessários ao nosso conforto, está levando ao desmantelamento de todo o parque industrial ocidental.  Já não haverá fábricas de tecidos, calçados, tênis etc (grandes absorvedores de mão de obra) no mundo ocidental. Só haverá na China.

Assim, num futuro não muito distante, quando o domínio se concretizar, poderemos ter uma situação como foi o choque do petróleo, pela Opep. Os preços serão administrados diretamente por eles, de onde se terá então o “choque das manufaturas”. Aí será tarde demais. Nesse momento se perceberá que se alimentou um enorme dragão (por coincidência chinês), e acabamos sendo reféns dele mesmo.

* Sergio Sebold  é professor e economista