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A inutilidade de aprender a escrever

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Quando eu era jovem queria muito aprender a escrever, para quem sabe um dia tornar-me um escritor. Bem... este sonho já abandonei há bastante tempo, pois descobri que além de escrever faz-se necessário talento, e isso não se aprende. Ou a pessoa tem, ou não tem. Agora, com o passar dos anos, me pergunto: para que precisamos aprender a escrever? Em tempos de internet, poucas são as expressões que precisamos conhecer para nos comunicarmos, basta publicar em um determinado micro blog algo como @cariocasumare #umidiotaem140caracteres e, se obtivermos como resposta alguma coisa semelhante a \ô/\ô/\ô/\ô/, kkkkkkk ou asussausuausuausas, quer dizer que conseguimos nos comunicar. (Seja lá o que signifique o que foi dito ou entendido)

Mas saber escrever é inútil, e tal inutilidade já foi vista até pelo principal fabricante de softwares do mundo, pois hoje compramos um micro computador relativamente bom, com processadores de última geração, com uma invejável velocidade de emulação, mas principalmente, e o mais importante, com a plataforma do maior fabricante já instalada, por aproximadamente mil reais, inclusa na instalação a importantíssima e gratuita ferramenta de navegação na internet. Todavia, como escrever é pura vaidade de uns poucos mortais, para se obter o editor de texto deste mesmo fabricante, na sua versão mais completa, teremos que desembolsar outros mil reais. Estão certos, já dizia o poeta “... navegar é preciso...”. Escrever não é preciso.

Tenho pena dos jornalistas que todos os dias executam um árduo trabalho para escrever seus artigos, informar sobre fatos ocorridos no mundo ou em suas cidades, procurando sempre diversificar o vocabulário, temas etc, para não parecerem monótonos ou repetitivos, usando das técnicas de redação que aprenderam nas faculdades ou na prática da redação de um antigo jornal. Cada vez menos terão público para entender o que foi passado como mensagem, seja contextual ou subliminar.

Profetizo com certa tristeza o fim dos literatos, pois quem restará para entender seu linguajar prolixo, as nuances de suas minuciosas descrições de fatos ou personagens, a sutileza dos temas, a profundidade do enunciado? Entristeço-me quando vejo as letras de musicas que substituíram nos rádios as do Noel Rosa, que primavam pelo humor, a poesia complexa de Caetano Veloso e Gilberto Gil, a música crítica de Gonzaguinha e Chico Buarque, bem como a cornisse refinada de suas letras ou da maestria da cornisse do mestre Cartola, hoje substituídas por letras simples em rimas pobres de uma cornisse explicita e sem graça, cantadas em versos desconexos, que forçadamente se juntam sem fazer o menor sentido.

Ainda me ressinto dos professores de minha juventude, que, diga-se de passagem, eram excelentes, pois naqueles tempos ser professor na maioria das vezes era vocação e não falta de opção. Eles insistiram para que eu aprendesse a ler e escrever, contrariando a veia boêmia que então existia em mim. Eles fracassaram em ensinar-me a escrever, mas mataram o boêmio e o transformaram em um cínico de humor mordaz e duvidoso, com o qual hoje sou obrigado a conviver e que volta e meia me enfia em confusão por ter sido mal entendido. Também... Bem feito! Quem mandou se meter a escrever?!

José Geraldo Pires de Almeida, vice-presidente de Eventos AABB de Sumaré (SP), é membro do Conselho Municipal de Cultura do respectivo município. E-mail carioca13@uol.com.br