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A Europa ameaçada

O desespero das populações na Europa é que as conduz a atos de violência muito graves

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Tenho vindo a escrever sobre a situação da União Europeia, que vai de mal a pior. Basta uma palavra em favor do euro, do presidente do Banco Central Europeu, para que os mercados – essa entidade sem rosto – moderassem os seus ataques gananciosos, nomeadamente contra Portugal e Espanha. Mas a seguir a chanceler Merkel voltou a insistir na necessidade de sucessivos cortes, com vista à redução dos deficits e dos endividamentos públicos e privados dos Estados da zona euro – os outros 11 Estados parece não contarem – para que os mercados voltassem ao ataque.

 Num encontro bilateral que houve depois – entre a chanceler alemã e Sarkozy – em que os dois Estados parece terem-se entendido, a Alemanha arrastou a França, para que a proposta sensata do primeiro-ministro do Luxemburgo, Jean-Claude Junker, um europeísta convicto, que agradava à maioria dos Estados-membros da União, tivesse desaparecido ou pelo menos fosse retirada da agenda. Em que consistia? Em que a União Europeia criasse euro-bonds (obrigações), num fundo a que os países em dificuldades pudessem recorrer.

 A Europa vai de mal a pior, como afirmaram, sem papas na língua, Helmut Schmidt e Jacques Delors em duas inteligentes e bem informadas entrevistas publicadas, em simultâneo, no Le Monde, do passado 8. Na verdade, um lucidíssimo ex-chanceler da Alemanha, Helmut Schmidt, não poupou críticas à sua compatriota Angela Merkel, tendo denunciado a sua falta de visão europeia. Nem o reputado ex-presidente da Comissão, o francês Jacques Delors, deixou de advertir que “a política deve ser a última referência”. Por isso, deplorou que “os banqueiros façam tremer os governos da zona euro”, como tem vindo a acontecer, sem reação da União.

 Está o euro, a segunda moeda de reserva mundial, em risco de se afundar?

  Apesar de tudo, é impensável pensá-lo. Porque traria o caos à União Europeia que, muito provavelmente, se desintegraria. Uma catástrofe para todos os Estados europeus, da zona euro, e mesmo para os outros, para o Ocidente e para o resto do mundo.

  A chanceler Merkel, que demorou dois meses a perceber a gravidade do que se passava na Grécia, vai ser obrigada, de novo, a flexibilizar a sua concepção monetarista relativamente ao euro. É o simples bom-senso que a aconselha. Porque a Alemanha, apesar da sua força financeira e económica – graças ao volume das suas exportações – não pode ter a pretensão de comandar a Europa, pelo seu passado de responsável por duas hecatombes mundiais e pelo que deve à solidariedade europeia, que tanto a ajudou na fase difícil da reunificação alemã.

Se Portugal e, depois, a Espanha viessem a ser atacados, ao ponto de serem obrigados a sair da moeda única, logo depois seria atingida a Itália, país fundador do mercado único, e porventura a França. Seria uma desgraça também para a Alemanha, tanto maior quanto mais rica.

Insisto. A União Europeia tem de mudar de paradigma de desenvolvimento. A grande opinião europeia tem de pressionar os líderes europeus do momento, que não querem assumir a situação em que se encontram e os riscos em que incorrem. Entre eles o desespero das populações, que as conduz a atos de violência, que podem vir a tornar-se muito graves, como os que houve na Grécia, na França e agora no Reino Unido. A União Europeia precisa avançar no seu projeto político de paz e de bem-estar social para as populações, lutando contra o desemprego, a pobreza, e pela integração multicultural dos imigrantes, que nos enriquecem. Se assim não acontecer e o conservadorismo neoliberal obsoleto continuar a dominar os Estados europeus e as suas tristes instituições, entraremos numa decadência inevitável, como escreveu Felipe Gonzalez no seu Relatório de sábios.

O Prêmio Nobel e a cadeira vazia

 Foi uma jogada perigosa para a China ter proibido o Prêmio Nobel da Paz Liu Xiaobo, o dissidente do regime totalitário chinês, de sair do cárcere, onde se encontra, por delito de mera opinião, nem qualquer dos seus familiares de se deslocar a Oslo para receber o valioso prêmio.

Note-se que Liu Xiaobo é um pacifista, que repudia qualquer forma de violência, e só luta pela liberdade, como um direito humano inalienável, inscrito na Carta das Nações Unidas, aprovada em 10 de dezembro de 1948, há 62 anos e subscrita, naturalmente, pela China. Como é possível que a China que aspira a jogar um papel de primeira importância tenha podido cometer um tal erro, que tanto a diminui aos olhos de todos?