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Prefeitura anuncia qualificação de 40 áreas onde milhares de pedestres vivem martírio diário

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“Eu fico com muito medo toda vez que passo por aqui”. A frase é da massagista Eliane Santos quando caminha pela diminuta calçada da Avenida Martin Luther King, na Pavuna, Zona Norte, sob a passarela que une as estações de trem e de metrô do bairro. O sufoco é enorme. “Vêm ônibus, trem, caminhão e, como estou com carrinho de bebê, obrigo sempre alguém a ir para a rua, porque duas pessoas não conseguem ocupar esse espaço mínimo ao mesmo tempo. Eu temo por mim e pelos outros”, disse Eliane. O entorno das estações de trem e metrô da Pavuna é uma das 40 áreas escolhidas pela Secretaria municipal de Urbanismo para ser requalificada do ponto de vista do pedestre. O projeto, denominado Rio Conecta, será apresentado, hoje, pelo prefeito Marcelo Crivella na reunião com prefeitos de vários países no Velo-city, conferência internacional sobre mobilidade urbana. O encontro será no Museu do Amanhã, na Praça Mauá. 

A secretária de Urbanismo, Verena Andreatta, informa que haverá um concurso de ideias entre escritórios de arquitetura para fazer mudanças radicais nas 40 áreas. “O objetivo é mudar o ambiente que rodeia estações de transporte público, sejam elas de trem, metrô, BRT ou terminais de ônibus. Um estudo da nossa secretaria concluiu que 50% da população anda pelo menos 1km até chegar a alguma estação. É necessário dar mais qualidade a esse caminhar”, disse a secretária, acrescentando que parte da verba virá da prefeitura, mas que a administração municipal buscará parcerias com a iniciativa privada.    

Os critérios para a escolha dessas 40 áreas foram seis: densidade populacional, número de passageiros por estação (metrô, trem e BRT), ocorrência de roubos a transeuntes ou em transportes coletivos, índice de indicadores sociais intitulado Índice de Progressão Social (IPS) e número de equipamentos de saúde e educação. O peso maior para essa seleção, contudo, é o grande fluxo de pessoas.

Estações como as da Pavuna, onde o pedestre vai do trem ao metrô e vice e versa, atraem multidões. Esse é o famoso nó, na linguagem de quem estuda mobilidade. Essa passagem de um modo de transporte para outro é sempre feita a pé e é bom andar com fé para essa caminhada não falhar. Problemas como segurança, calçadas repletas de buracos e afeitas a tombos, passarelas com comércio ambulante a disputar o espaço com pedestre.  Na Pavuna, a passarela que leva ao trem está coberta de tendas azuis, com camelôs a vender todo tipo de mercadoria. 

Já na estação de trem de Madureira, o aglomerado humano é imenso também pela presença de uma estação do BRT. Ali,  a ligação de um modal para o outro é pouco amigável. E quem desce da estação de trem para a rua se depara com uma calçada tomada pelo comércio ambulante, enquanto, no asfalto, ônibus passam a uma distância  perigosa das pessoas.  

Outro grave problema à caminhada se vê na Estação do BRT da Nova Holanda, na Maré.  “Aqui temos cinco escolas municipais e mais um Ciep. É gente à beça caminhando, num lugar bem confuso, com calçadas ruins e com uma rampa para cadeira de rodas péssima”, disse Luiza Santos, mãe de uma aluna. 

A reportagem do JORNAL DO BRASIL  pediu à Secretaria de Urbanismo para que técnicos da pasta opinassem sobre os três dos 40 pontos visitados pelo JB.  Eles se limitaram a dois exemplos: “Na Pavuna, existe um grande fluxo de pedestres entre modais e municípios (o bairro da Pavuna é vizinho  da cidade de São João de Meriti, na Baixada Fluminense). Ali, a ligação entre  metrô e ônibus é desconfortável, insegura e não atende à demanda existente. Faltam acessibilidade, sinalização e ordenamento dos pontos finais de ônibus. Em Madureira acontecem os mesmos problemas. As pessoas transitam entre as estações (de trem e do BRT) por passarelas sem cobertura. Há  travessias de pedestres sem sinalização , e a largura das calçada não é suficiente ao número de usuários”. 

Entre as 40 áreas escolhidas, uma chama a atenção pela ausência na lista da prefeitura: a Central do Brasil, por onde passa mais de um milhão de pessoas por dia. O arquiteto Sidney Menezes, coordenador de Integração Metropolitana da prefeitura, explica o porquê. “A Central do Brasil tem o maior fluxo de pessoas a pé do país. Há poucos lugares no mundo com tamanha centralidade. Ali, a conexão intermodal é imensa. Vemos metrô, trem, VLT, dois terminais de ônibus, e o BRT da TransBrasil também vai passar pela Central”, disse o arquiteto.  Trata-se de uma escala metropolitana em alto grau, já que boa parte da população da Baixada Fluminense frequenta a Central do Brasil.  Menezes acrescenta que caberá à Câmara Metropolitana – grupo criado pelo governo do estado para gerir a Região Metropolitana – requalificar a Central do Brasil. Ele diz também que a câmara fez um convênio com a Agência Francesa de Desenvolvimento para enfrentar o desafio da Central, e esta contratou uma consultoria para levantar os problemas. Deficiente visual, Claudio de Souza já indica um deles. Ontem, ele caminhava no piso tátil no Terminal de Ônibus Américo Fontenelle  com a produtora cultural Thaiane Vitória. De repente,  ela o avisa que, no meio do caminho, havia uma canga com mercadorias.  A Central  reúne problemas dos três casos citados, e  muito mais. 

Os outros centros de conexão do pedestre com o transporte público estão nos seguintes bairros: Rocinha, Cosme Velho, Botafogo, Largo do Machado, Catete, Jardim Botânico, Ipanema, na Zona Sul;  Mangueira, Jacarezinho, Irajá, Del Castilho, Benfica, Ramos, Méier, Vicente de Carvalho, Engenho da Rainha, Penha, Cordovil, Bonsucesso, Guadalupe, Vila Kennedy,  Paciência, Irajá e Tijuca, na Zona Norte; São Cristóvão (Centro); Campo Grande, Barra da Tijuca, Santa Cruz, Inhoaíba, Guarativa, Bangu, Cosmos, Cidade de Deus, Taquara, Praça Seca, Senador Camará, na Zona Oeste.