Hoje, em Genebra, na Suíça, os representantes diplomáticos de todas as nações com assento na 37ª Seção do Conselho de Direitos Humanos da ONU tomarão conhecimento das denúncias relacionadas à execução da vereadora carioca Marielle Franco.
Estarão em um documento endossado por mais de 60 ONGs e entidades defensoras dos Direitos Humanos, de diversas nacionalidades. Associarão o assassinato da vereadora e defensora dos direitos humanos à intervenção militar promovida pelo governo brasileiro no Rio de Janeiro.
O crime é inserido em um contexto de perseguição existente no país aos defensores dos direitos humanos.
“O mandato parlamentar de Marielle centrou-se no racismo estrutural e na violência policial sofrida pelos pobres, negros e jovens nas favelas e no empoderamento de mulheres negras e da comunidade LGBTI”, diz o texto, a ser lido ao meio-dia de hoje, em Genebra (8h em Brasília).
“Muitos que falam a verdade ao poder no Brasil enfrentam violência e estigmatização sem precedentes, já que o país está no topo das mortes dos defensores (dos direitos humanos)”, ressalta o documento.
Paralelamente, nos bastidores da reunião do Conselho dos Direitos Humanos da ONU, uma carta denunciando a situação de risco de ativistas leigos em comunidades carentes brasileiras, incluindo a Favela de Acari, que Marielle também denunciou, circula entre alguns conselheiros.
A carta foi encaminhada ao Relator Especial da própria ONU sobre a situação de defensores e defensoras dos Direitos Humanos, Michel Forst.
Houve até uma tentativa de se levar à Genebra a jovem Buba Aguiar, que, como o JORNAL DO BRASIL noticiou na edição de ontem, viu-se obrigada, junto com outros 14 adolescentes, a deixar a região em que residem com medo de se tornarem a “bola da vez”.
Por falta de passaporte, Buba não pode ir a Genebra. O caso dela e de seus companheiros de Acari, porém, ainda não será tratado publicamente.
Na reunião de hoje serão pedidas garantias à com panheira de Marielle, assim como para sua assessora, que estava no carro e conseguiu escapar dos disparos que vitimaram a vereadora e seu motorista, Anderson Gomes.
Para evitar que diplomatas brasileiros tentassem interferir para evitar a leitura das denúncias contra o Brasil, por conta do assassinato de Marielle, as entidades defensoras dos Direitos Humanos mantiveram o documento em sigilo. O documento, porém, foi adiantado em confiança ao JORNAL DO BRASIL.
Nele, denuncia-se também que o governo brasileiro vem cortando verbas destinadas aos programas de proteção aos defensores de Direitos Humanos, os quais, segundo a denúncia, se encontram “subfinanciados” e com valores “insuficientes”.
Havia, por parte dos representantes brasileiros junto ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, promessa de revisão dessas verbas, com a ampliação dos programas de proteção às pessoas perseguidas. Mas foram apenas promessas, jamais cumpridas.
A ÍNTEGRA DO DOCUMENTO PARA O CONSELHO DA ONU
Conselho de Direitos Humanos - 37º Período Ordinário de Sessões - Item 8 - Acompanhamento e implementação da Declaração de Viena sobre os Direitos Humanos Declaração conjunta de [....] *
Sr. presidente,
A proteção efetiva dos defensores dos direitos humanos é essencial para a implementação doméstica da Declaração de Viena.
A vereadora municipal Marielle Franco e seu piloto, Anderson Gomes, foram brutalmente executados no dia 14 de março no Rio de Janeiro, Brasil. O mandato parlamentar de Marielle centrou-se no racismo estrutural e na violência policial sofrida pelos pobres, negros e jovens nas favelas e no empoderamento de mulheres negras e da comunidade LGBTI.
Este ataque brutal ocorre no contexto de uma intervenção federal altamente militarizada no Estado do Rio, decretada pelo Presidente, contrários à vontade das comunidades locais. De fato, as preocupações sobre a intervenção foram destacadas pelo Alto Comissário em sua declaração durante esta sessão.
Muitos que falam a verdade ao poder no Brasil enfrentam violência e estigmatização sem precedentes, já que o país está no topo das mortes dos defensores. Marielle e Anderson foram mortos a tiros no carro, retornando de uma rodada de debate com mulheres negras. Marielle foi nomeada relatora de um comitê parlamentar para supervisionar os abusos da ação militar no Rio. O programa de proteção dos defensores permanece sub?nanciado e insu?ciente.
A força, o engajamento e o espírito de sororidade de Marielle devem servir de fonte de inspiração para o trabalho necessário para a promoção e proteção dos direitos humanos, em particular para os grupos mais marginalizados.
Instamos o governo brasileiro a assegurar uma investigação imediata, imparcial e independente, processando os responsáveis materias e intelectuais deste crime, com a competência e a abertura para a possibilidade de o assassinato te sido uma execução extrajudicial. Também instamos as autoridades a dar proteção efetiva aos sobreviventes desse ataque, como testemunhas-chave desta atrocidade.
Obrigado”.