ASSINE
search button

Levantamento aponta que RJ teve média de 14 tiroteios por dia em 2017

"Situação é ainda pior do que aparenta", diz a ONG Rio de Paz

Compartilhar

De acordo com um levantamento feito pelo aplicativo “Fogo Cruzado”, dá Anistia Internacional no Brasil, o estado do Rio de Janeiro registrou média de 14 tiroteios por dia no período entre 1° de janeiro e 30 de junho. Os combates, em sua maioria entre traficantes e policiais, resultou na morte de civis, policiais, e até mesmo crianças dentro de casa e dentro da escola. Algumas trocas de tiros duram horas. Para evitar multiplicação dos casos, a equipe do aplicativo faz o registro das ocorrências manualmente.

>> Veja o levantamento

Segundo o app, o local com mais tiroteios é São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. Nos seis primeiros meses do ano foram 217 registros. Na sequência do ranking vêm as comunidades do Complexo do Alemão, com 106 notificações de tiroteios.

A presença do bairro de Copacabana, na Zona Sul da capital, na sexta posição, com 51 ocorrências, chama a atenção. O bairro é um dos principais destinos de turistas que vêm visitar a “Cidade Maravilhosa”. Outro bairro considerado de classe média alta que aparece no levantamento é a Tijuca, na nona posição do ranking, com 42 registros.

Ao todo, nos seis primeiros meses do ano foram registrados 2649 tiroteios. O mês mais violento foi junho, com 650 ocorrências, seguidos de março (554) e maio (478). Só durante os dias 26 e 27 de junho, foram notificados 89 trocas de tiros no estado.

Para a doutora em sociologia e pesquisadora da Diretoria de Análise de Pesquisas Públicas da Fundação Getulio Vargas (DAPP-FGV), Maria Isabel Couto, a implantação do sistema de UPP com o intuito de pacificar as comunidades, inicialmente teve sucesso, porém, talvez por desinteresse da política das UPP, o sistema começou a ruir.

“Tivemos, durante um período, uma política de segurança pública que foi muito bem-sucedida em conter a violência e reduzir indicadores. A partir de um certo momento, porém, essa política começou a ruir. Em um determinado ponto houve um descompromisso da política das UPPs, que era abrir mão da cultura de enfrentamento e da guerra de drogas e pensar em uma mudança na cultura do policiamento, na relação com as comunidades e em investimentos sociais”, explicou.

Na capital, alguns casos chocaram a população, como a morte da menina Maria Eduarda, de apenas 13 anos, que, no dia 30 de março, foi atingida por três tiros dentro da escola onde estudava, na Zona Norte do Rio. O caso, inclusive motivou um pedido de estudo de caso para a atuação da PM nas comunidades.

>> Violência: a face cruel da crise no Rio, que deixa um rastro de vítimas e desalento

>> Violência provoca queda de R$ 320 milhões no turismo do Rio de Janeiro

Segundo informações da ONG Rio de Paz, a situação da segurança no Rio de Janeiro é ainda pior do que a apontada pelos dados do aplicativo, pois os registros são feitos através de denúncias da população, e, em muitos casos, a população tem medo de denunciar a situação das comunidades. A ONG deu como exemplo a comunidade do Jacarézinho, onde existem confrontos diários, e a região sequer aparece no levantamento realizado pela Anistia Internacional.

“A situação é muito mais assustadora do que os dados do aplicativo estão mostrando. Por exemplo, a ONG presta serviços na comunidade do Jacarézinho. Lá, o confronto é diário, e o nome da comunidade não apareceu no levantamento. Acredito que o medo dos moradores é o motivo por essa ‘omissão’. Se a população faz a denúncia a relação e o cotidiano na comunidade fica instável. Nesta madrugada, a nossa escola de música na comunidade amanheceu inteira metralhada, destruída por bombas, tiros, uma cena de guerra”, disse a ONG.

Ao ser questionada sobre as razões do aumento da violência, a ONG Rio de Paz creditou à situação calamitosa em que se encontra a política e economia no estado. Sem dinheiro para investimentos em áreas como saúde, educação e segurança, a violência aumentar é conseqüência óbvia.

>> Moradores de favelas pedem paz em ato na orla de Copacabana

>> Secretário de Segurança admite que operações da PM têm que ser aperfeiçoadas

“Acreditamos que o problema está na maquina pública. Vivemos uma crise econômica e política. Faltam investimentos em todos os setores, educação, saúde, segurança, e o resultado de uma falta de investimento é isso que estamos vendo no Rio, a máquina pública está ruindo. Precisamos manter a esperança, pois ela é o nosso combustível diário. Acredito que uma reforma política bem feita poderia ajudar, acabando com partidarismos e passando a ações mais humanitárias”, comentou.

Sobre a questão das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), a ONG elogiou a teoria do projeto, mas lamentou a falha na execução. O projeto que previa uma ação conjunta entre população e polícia, não funcionou, e os confrontos voltaram a fazer parte da rotina das comunidades.

“A UPP não funciona como deveria. A ideia da implantação desse serviço era ótima, investimentos sociais, trabalho conjunto entre polícia e população, mas não deu certo e fica errado insistir nela. Os policiais, talvez por medo ou despreparo, entram nas comunidades usando a força, e com isso os confrontos acontecem. Sem o apoio da população a UPP não vai conseguir ir para frente, infelizmente, pois a ideia inicial era boa. Volto a dizer, a situação é ainda pior do que é divulgado”, explicou a ONG Rio de Paz.

No dia 28 de junho, uma intensa troca de tiros entre policiais e traficantes na comunidade do Pavão-Pavãozinho, em Copacabana, deixou um morto e cinco pessoas feridas. O porteiro, Fábio Franco de Alcântara, de 39 anos, morreu atingido por uma granada, durante o confronto.

>> Cresce número de roubo de cargas na Baixada Fluminense

>> Roubo de rua em maio deste ano aumenta 39% com relação a 2016, diz ISP

Dados do aplicativo mostram também que houve 197 operações policiais durante o primeiro semestre do ano. No total, 294 civis e 117 policiais ficaram feridos. Até o dia 30 de junho, 86 policiais foram mortos.

Ao ser questionada sobre os números, a secretaria estadual de Segurança Pública questionou os números e disse que os dados oficiais são divulgados mensalmente pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), e que, é através desses dados que o planejamento policial é montado.

Veja a íntegra da nota

"As estatísticas oficiais de criminalidade do Rio de Janeiro são provenientes dos registros de ocorrência lavrados nas delegacias de Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro e divulgadas mensalmente pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), de forma sistemática e transparente. Estes dados abastecem o planejamento estratégico para o monitoramento e combate à mancha criminal. Nos primeiros cinco meses de 2017, 19.876 pessoas foram presas pelas polícias e 3.666 armas foram apreendidas, sendo 212 fuzis. Ou seja, em 2017, 24 armas de fogo por dia foram apreendidas pelas polícias.

A Secretaria de Estado de Segurança (Seseg) tem como prioridade a preservação da vida e a redução de índices de criminalidade no estado. Por isso, investe desde 2007 no processo de pacificação nas comunidades e implantação do Sistema de Metas e acompanhamento de Resultados (SIM), dentre diversas outras iniciativas.

Mesmo em um cenário econômico antagônico, sem custos aos cofres públicos, a SESEG criou medidas estruturantes como o Grupo Integrado de Operações de Segurança Pública (GIOSP), no Centro Integrado de Segurança Pública (CICC), e a delegacia especializada para o combate ao tráfico de armas, a Desarme, para atacar as causas da letalidade violenta."