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Justiça do Rio busca soluções para o combate à discriminação

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Magistrados, autoridades governamentais e lideranças de movimentos sociais participaram nesta terça-feira, dia 30, do seminário “Discriminação Zero”, para discutirem formas de combate à discriminação, com o objetivo de lutar pelo direito da sociedade a uma vida com dignidade, independente da origem, orientação sexual, identidade de gênero ou raça.

Promovido pela Associação de Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj), em parceria com o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e a Organização das Nações Unidas (ONU), através da UNAIDS, programa das Nações Unidas criado para ajudar no combate à AIDS, o evento contou, ainda, com as participações da fundadora da Sociedade Viva Cazuza, Lucinha Araújo, da atriz e poetisa Elisa Lucinda e da cantora e atriz transexual Jane de Castro, que abriu o seminário interpretando o Hino Nacional.

Na abertura do encontro, o presidente do TJRJ, desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, destacou o fato de o Judiciário fluminense debater, simultaneamente, o combate à discriminação e à violência contra a criança, referindo-se ao Seminário Nacional Criança Sujeito de Direitos, realizado, também em parceria com a Amaerj, na segunda-feira, dia 29.

“Ontem discutimos a questão da violência contra a criança e hoje estamos debatendo sobre a discriminação. Os dois eventos se vinculam. Quem humilha, bate e ofende uma criança está atingindo toda a sociedade. E qualquer tipo de discriminação também atinge a todos”.

O presidente lembrou um trecho da música do cantor Cazuza, “Brasil mostra a sua cara”, para ilustrar a necessidade da sociedade continuar lutando contra as desigualdades e discriminações.

“Cazuza cantava ‘Brasil mostra sua cara’. Essas palavras são eternas, jamais perecerão, porque o Brasil continua até agora não tendo conseguido, em sua plenitude, mostrar a sua cara, representada por todos que estão aqui. Está representada na diversidade, na tolerância nos aparentemente contrários, é a cara do Brasil”.

O presidente da Amaerj, juiz Rossidélio Lopes, ressaltou a importância do seminário para trazer à tona a questão da discriminação no Brasil.

“A discriminação, a qualquer título, é abominável. É necessário uma tomada de consciência sobre as discriminações que existem no Brasil. O seminário busca discutir e desvendar essa questão. Temos que somar força para construção de uma sociedade mais justa”, disse.

A juíza Ana Beatriz Estrella concordou com o presidente do TJRJ, no sentido de o país mostrar sua verdadeira face, em relação à luta pelas igualdades.

“Nosso caminho ainda é longo. Como disse o presidente, queremos que o Brasil mostre sua cara. Queremos dizer não à discriminação aos casais homossexuais, às mulheres no mercado de trabalho, às pessoas que demonstram suas opções religiosas e às crianças com necessidades especiais que sofrem preconceito nas escolas”, afirmou.

“Diga não à Discriminação – Enfoque Jurídico Social e Cultural”

Após a sessão de abertura do seminário, a atriz e poetisa Elisa Lucinda atuou como mediadora da palestra que abordou o tema “Diga não à Discriminação – Enfoque Jurídico Social e Cultural”. Em sua intervenção, Lucinda demonstrou sua inquietação pela necessidade de realização de eventos discutindo o tema.

“É incrível que ainda tenhamos que promover eventos como esse para discutir, nos dias de hoje, as discriminações que enfrentamos. O fato desse encontro acontecer na casa da Justiça nos dá esperança. Não vejo outro caminho que não passe pela educação”, frisou.

Em seguida, a desembargadora Ivone Caetano ressaltou a discriminação sofrida pelo negro na sociedade. Lutando pelo direito ao respeito a todos, independente de raça, religião ou opção sexual, a desembargadora acredita que o debate é um dos caminhos para buscar a igualdade social.

“Onde quer que você esteja, sendo negro, você vai sofrer preconceito racial. Na história do Brasil poucas são as oportunidades de poder que o negro consegue alcançar. Temos que mudar esse quadro. Não exijo amor. Eu exijo respeito pela minha religião, pelo meu cabelo crespo, pelo meu nariz chato e pela minha pele negra”, afirmou.

Em sua intervenção, a juíza Keila Blank De Cnop abordou a questão do preconceito em relação às crianças autistas. Ela apresentou um panorama sobre como a sociedade encara a situação.

“Quando a mãe diz que o filho tem autismo, a vaga na escola some. Existem muito poucas escolas com propostas de inclusão. Além disso, os pais de filhos autistas têm que enfrentar a omissão do Estado em relação ao tratamento”, argumentou.

“Discriminação e Cidadania: Saúde, Educação, Discriminação de Gênero”

Abordando o tema “Discriminação e Cidadania: Saúde, Educação, Discriminação de Gênero”, a segunda palestra do seminário teve como mediadora a jornalista e apresentadora do SBT Irene Borges, que fez um relato breve sobre sua experiência profissional, apresentando várias matérias jornalísticas, denunciando diversas discriminações sofridas pela população.

A fundadora da Sociedade Viva Cazuza, Lucinha Araújo, em seguida, apresentou breve histórico sobre a criação da Fundação Viva Cazuza, que completou 25 anos, e chamou a atenção sobre a redução de campanhas de alerta e combate à Aids.

“Diferente do que acontecia no início da campanha, os pacientes soropositivos hoje, devido ao avanço das medicações, se apresentam com uma aparência saudável. Isso provocou um efeito inverso, com a pessoas se descuidando mais em relação à prevenção à Aids. Já temos dados de que pessoas na faixa etária de 17 a 24 anos voltaram a se contaminar. Temos que nos prevenir e intensificar as campanhas. A Aids não tem cara, mas tem cura”, alertou.

Para o coordenador especial da Diversidade Sexual da Prefeitura do Rio, Carlos Tufvesson, a luta pelas desigualdades sociais e contra as discriminações passa pelo Poder Judiciário.

“O Legislativo trata do poder da maioria. Cabe ao Judiciário resguardar os direitos das minorias. Como pode as pessoas do mesmo sexo que se unem não terem os seus direitos garantidos pelo Estado? Eu só acredito no futuro de uma nação melhor através do Judiciário. Nos últimos 12 anos não tivemos qualquer avanço no Poder Legislativo”, destacou.

A coordenadora do UNAIDS no Brasil, Georgiana Braga Orillard, fez coro com o presidente da Amaerj em relação à necessidade de união de forças para o combate às discriminações. Ela também questionou a redução da maioridade penal.

“Precisamos unir nossas forças em vários setores. A ideia é fazer um movimento ao contrário dessa onda de discriminações, levando amor e respeito a todas as pessoas. E isso deve começar já na educação das crianças. Mas, infelizmente, divulga-se a falsa ideia de que o jovem é maduro para ter responsabilidade penal, enquanto que, paradoxalmente, defendem que os mesmos jovens não tem maturidade para receberem orientação sexual nas escolas”, disse.

O coordenador do Programa Estadual Rio Sem Homofobia, Cláudio Nascimento, criticou a postura conservadora das instituições que, cada vez mais, explicitam seus preconceitos.

“A homofobia, nos últimos dois anos, saiu do armário. No Congresso Nacional tramitam três projetos que objetivam ampliar a discriminação: o que discute o Estatuto da Família, definindo família apenas aquela formada por homem e mulher; o que criminaliza a discriminação contra os heterossexuais e o que instituiu o Dia do Orgulho Heterossexual, ambos com intenção clara de atingir as lutas da comunidade LGBT”, avaliou.

A juíza Maria Daniella Binato de Castro abordou a violência contra a mulher e destacou os avanços alcançados, citando a Lei Maria da Penha e a qualificação do feminicídio.

“Hoje o Brasil está com os olhos atentos para a mulher vítima de violência doméstica familiar. Mas é preciso buscar saídas para todos os tipos de violência e discriminação”, afrimou.

O seminário foi encerrado com a apresentação do grupo Afroreggae.