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Família de menino morto no Alemão embarca para o Piauí

Eduardo de Jesus, de 10 anos, morreu com um tiro de fuzil na porta de sua casa

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A família de Eduardo de Jesus Ferreira, morto nesta quinta-feira (2) com um tiro de fuzil na porta de sua casa no Complexo do Alemão, embarcou para o Piauí na manhã deste domingo (5) para enterrar o corpo. A mãe, Teresinha de Jesus, acusa um policial pelo disparo. O Estado comprou as passagens aéreas e terrestres dos pais e de duas irmãs e informou que vai custear todas as despesas com translado e sepultamento.

Antes do embarque, o pai de Eduardo, José Maria, pediu justiça e destacou que sua mulher conseguiria reconhecer o rosto do policial militar que fez o disparo contra o menino. De acordo com ele, a família deve retornar ao Rio de Janeiro em 10 dias para colaborar com as investigações.

O voo saiu do Rio em direção a Teresina, de onde a família seguiria de ônibus para o município de Corrente, no interior. De acordo com o governo, a equipe da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos teria se colocado à disposição para oferecer todo tipo de amparo psicológico à família. O governo do Estado do Rio se reuniu com a família neste sábado (5).

No encontro entre a família e representantes do governo, o delegado Rivaldo Barbosa disse aos pais de Eduardo que a Polícia Civil não medirá esforços para punir os responsáveis pela morte. "Vamos nos empenhar ao máximo para chegar aos culpados. Não vai ter proteção a ninguém. É preciso definir quem atirou e punir os responsáveis."

O menino morreu com um tiro de fuzil, quando estava na porta de sua casa com um celular na mão. A polícia chegou a alegar que ele estava armado no momento, e não com o aparelho telefônico, mas voltou atrás em sua versão. A mãe de Eduardo, Teresinha Maria de Jesus, contou ao G1 que viu o rosto do PM que atirou em seu filho e que, quando foi cobrar explicações, o policial apontou uma arma para ela também. “Eu marquei a cara dele. Eu nunca vou esquecer o rosto do PM que acabou com a minha vida. Quando eu corri para falar com ele, ele apontou a arma para mim. Eu falei ‘pode me matar, você já acabou com a minha vida’.”

Teresinha havia anunciado seu desejo de se mudar para sua terra natal. "Quero justiça e depois eu vou embora para a minha terra [o Piauí]. Não quero ficar nesse lugar maldito, eu vou sair daqui", disse à Folha de S. Paulo.

Vídeos com imagens de Eduardo morto no chão circularam nas redes sociais e mobilizam a sociedade contra a violência com os moradores de comunidades. Um protesto foi convocado para a próxima quarta-feira (8), do Largo do Machado até o Palácio da Guanabara, na Zona Sul do Rio de Janeiro, contra as mortes e pelo fim da guerra na periferia da cidade

Na manhã deste domingo (5), um ato foi realizado na Praia de Copacabana. A ONG Rio de Paz, que promoveu a manifestação, lamentou a pouca adesão dos moradores da Zona Sul, mesmo depois de o caso ter ganhado repercussão nacional. Cerca de 20 pessoas participaram do ato. Um dos organizadores, Nelson de Castro, se queixou: "O que precisa acontecer para pessoas saírem de casa?"

Na manhã de sábado (4), moradores do Complexo do Alemão e pessoas sensibilizadas com as trágicas mortes realizaram uma caminhada na comunidade clamando pelo fim da violência. Foram centenas de pessoas marchando pela paz. A mãe de Eduardo, a diarista Terezinha Maria de Jesus, participou do início do ato, mas teve de ser retirada, ao passar mal em revolta à presença de policiais. "Eles estão matando os inocentes. Esta polícia assassina tirou a vida do meu filho. Esses covardes", protestou.

De acordo com informações do jornal O Dia, moradores do conjunto Alvorada relataram que PMs usaram gás de pimenta para impedir a população de descer e participar do protesto. O ato contou com a participação do deputado estadual Marcelo Freixo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), do ator Paulo Betti e da cantora Karina Buhr, que publicou no Instagram: "A PM tá em cima do morro jogando gás de pimenta pra galera não descer pro protesto na entrada da Grota".

Na ocasião, Freixo questionou a política de segurança do governo do estado. "Tem que ter uma solução para isso, porque estamos falando da vida das pessoas. O primeiro passo é ouvir os moradores. Isso nunca aconteceu, nem para construir o teleférico nem para pensar em um modelo de polícia. É preciso parar com o discurso da guerra. Tem que ter diálogo", disse o deputado.

O líder comunitário Rene Silva, criador do jornal Voz da Comunidade, citou o aumento da violência como a principal causa do protesto, e destacou a necessidade de alternativas ao reforço do policiamento: "O motivo da manifestação é a insatisfação das pessoas com esta violência, que já está desde o início do ano aqui no Complexo. Estamos há 90 dias sem deixar de ouvir tiroteios. A solução não é reforçar o policiamento. Passa por investimento em outras áreas, que não chegaram com a mesma força que a polícia chegou na comunidade, como as áreas cultural e social".

O presidente da Associação de Moradores da Palmeira, Marcos Valério Alves, conhecido como Marquinho Pepé, fez questão de ressaltar que o ato não era contra a polícia, mas pela paz e pelo respeito mútuo. "O nosso objetivo é pela paz e pela vida. Não somos contra a UPP. Só queremos é policiais comprometidos com a vida. Queremos um comandante que chame a população para conversar. Que haja o diálogo. Nós queremos o nosso direito de ser respeitados. Hoje não existe nem respeito nem tolerância dentro do Alemão", disse Pepé.

No dia anterior, na sexta-feira, os moradores realizavam um protesto pacífico quando foram reprimidos pela polícia, com bombas de efeito moral e gás de pimenta.

Chegaram a circular nas redes sociais e no Whatsapp fotos falsas de Eduardo, que apresentam um outro garoto supostamente armado. O deputado federal Jean Wyllys (Psol) comentou sobre o uso do caso: "As imagens apresentam um garoto supostamente armado (não tem como saber as circunstâncias em que a fotos foram tiradas) que não é Eduardo, numa tentativa desonesta e perversa de justificar sua morte e, ao mesmo tempo, fortalecer os discursos demagógicos e irresponsáveis que defendem a redução da maioridade penal. O cinismo, a perversidade e a má fé é tão grande que são capazes de difamar uma criança morta, de apenas 10 anos de idade". 

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