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"Estamos reféns de uma violência que só aumenta", define moradora de Niterói

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Enquanto especialistas ainda estudam as causas do aumento de 40% no número de registros de roubos no Rio de Janeiro, a violência em Niterói, São Gonçalo e na Baixada Fluminense continua crescendo. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), o aumento foi percebido na comparação entre o 1º trimestre de 2013 e 2014. Agora, próximo ao período eleitoral, o governo estuda a possibilidade de reforço no policiamento em São Gonçalo e municípios da Baixada.

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Em entrevista ao Jornal do Brasil, o professor do Instituto de História da UFRJ e líder do grupo de pesquisa História do Crime, da Polícia e da Justiça, Marcos Bretas, comentou os dados do ISP. Ele disse que a migração do tráfico para Niterói e a Baixada Fluminense, “faz sentido, tem muita lógica, mas não parece ser essa a única questão”. Os prejuízos financeiros que o tráfico sofreu desde o início da instalação das UPPs pode ser a causa do aumento da violência urbana. Para Bretas, a “segurança no estado é basicamente UPP. As outras não são muito visíveis”.

Diante dos assaltos recorrentes em toda Niterói, a população já chegou a promover passeatas pela paz. No último domingo (7), mil pessoas se reuniram na Praia de São Francisco em um ato com adesão do Sindicato Estadual de Escolas Particulares (Sinepe/RJ) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/Niterói). O grupo vestiu roupas brancas e levou rosas da mesma cor, além de cartazes e uma faixa preta de 25 metros, simbolizando o luto pelas vítimas da violência.

Assaltos

Júlia Moraes já sofreu com a falta de segurança na cidade. Ela foi assaltada na rua de casa por um homem, que levou seu celular. “Ele surgiu do nada segurando alguma coisa escondida na calça. Realmente não sei dizer se ele estava armado ou não. Disse ‘passa o celular se não eu atiro’. Foi bem rápido. Eu dei meu celular e ele foi embora, andando normalmente”. Perguntada sobre a segurança da cidade, Julia diz: “Muitas vezes não me sinto segura. Esse assalto foi a uns 100 metros da minha casa. Ali sempre foi um local seguro”.

Tayane Moura também foi assaltada. Além do roubo, ela ainda teve que lidar com o descaso do policial que registrou sua ocorrência na delegacia. “Estudo no Campus da Praia Vermelha (Boa Viagem), mas saí para almoçar no Campus do Gragoatá com uma amiga. Quando estávamos voltando para a faculdade, bem pertinho da entrada da UFF, um cara veio do outro lado da rua e puxou a minha bolsa. Na hora eu não entendi muito bem o que estava acontecendo. A primeira coisa que eu fiz foi puxar minha bolsa de volta. Aí ele apontou uma faca pra mim e eu soltei na mesma hora. Ele pegou a bolsa da minha amiga também e correu para a um beco”.

A estudante conta que foi à faculdade e avisou a um dos guardas. A resposta dele foi “você é a terceira hoje”. Tayane confrontou o guarda e a decepção não foi menor. “Perguntei se ele não ia fazer nada e ele disse que já tinha ligado para a polícia e eles não fizeram nada. Pedi para ligar de novo e eles vieram. Me levaram para uma delegacia no Centro. A parte que eu tenho mais raiva é que o delegado, quando comecei a descrever o que aconteceu, ficou tentando adivinhar.  Ele me perguntou a altura do assaltante e eu respondi que seria em torno de 1m63. O delegado não me deu a mínimia e disse 1m75. Tentei dizer que não, mas fui ignorada. Desisti. Ele ficou criando frases do tipo “passa a bolsa”.

Marina Vieira também foi vítima da violência em Niterói. Ela foi assaltada duas vezes na Rua Miguel Couto, em Jardim Icaraí, onde mora. “O primeiro assalto foi por volta de 12h. Um homem de mais ou menos 18 anos se aproximou por trás de mim, disse que tava armado e mandou eu passar o celular. O segundo foi mais pesado, foi por volta das 20h. Estava chovendo e a rua estava deserta. O homem veio na minha direção. Eu sabia que seria assaltada porque ele estava descalço na chuva e parecia estar bem drogado (agitado e tal). Ele me botou contra a parede da Igreja Porciúncula e disse que se eu não passasse tudo que tinha, iria me estuprar ali mesmo”, recorda.

Ela também não se sente segura na cidade onde mora. “Tenho bastante medo, mas infelizmente não podemos parar de ter uma vida por causa disso. Hoje, não ando mais durante a noite a pé pela cidade... tenho que andar de taxi ou pedir para meu namorado me buscar. O fato de eu não ver policiamento algum e as ruas cada vez mais desertas só reforça esse medo. Estamos refém de uma violência que só aumenta”, relata Marina.

Casos emblemáticos

>> Niterói sofre com abandono e crescimento da criminalidade

Recentemente diversos casos tomaram conta da mídia e das redes sociais. Através do Facebook, niteroienses compartilham casos de assaltos, tiroteios e estupros na cidade. Algumas páginas dão relatos em tempo real de denúncias de moradores em diversas localidades de Niterói.

O medo afastou alunos da Escola Municipal Altivo Cesar, no Barreto. A freqüência caiu 30%. O bairro é foco de bandidos, principalmente durante a noite. Outro colégio que está na mira dos assaltantes é o tradicional Instituto GayLussac, em São Francisco. No final do mês de agosto, em período de duas horas, quatro pessoas foram assaltadas perto da unidade. Joias, celulares, carros e carteiras são o principal foco dos bandidos.

Bairro nobre de Niterói, São Francisco já foi alvo de assaltos em outras situações. No início de agosto, uma cafeteria foi assaltada durante a madrugada. Os bandidos, agressivos, bateram nos clientes e roubaram celulares, jóias e carteiras. Em seguida, fugiram, armados, e, direção à favela do Caniçal. O mesmo estabelecimento foi assaltado no dia 4 de julho, por bandidos com abordagem semelhante.

Moradores de Icaraí também têm motivos para reclamar. Um vídeo ganhou grande repercussão na internet em agosto. Imagens da câmera de segurança de um dos prédios da Rua Moreira César registraram um assalto que durou dez segundos. As imagens mostram três jovens andando por volta das 22h, quando são abordados por três rapazes armados, que saltam de um carro. Eles levam as mochilas dos estudantes e fogem.

No Ingá, um dos bairros mais movimentados de Niterói, um rapaz teve a mão esfaqueada em uma tentativa de assalto quando seguia para a casa de um amigo. Não foi o único de caso que terminou com as vítimas feridas. Também em agosto, bandidos armados realizaram uma série de roubos no Centro, Ingá, São Domingos, Icaraí e São Francisco. A bordo de um carro roubado, os criminosos trocaram tiros coma polícia na Praia de Icaraí, ferindo pelo menos duas pessoas. Contudo, nas redes sociais, moradores dizem que mais um homem teria sido ferido na mão durante o confronto.

Também no mês passado, no Fonseca, um homem tentou assaltar uma pessoa e usou de violência. Com uma Bíblia embaixo da blusa, simulando ser uma arma, o bandido se aproximou da vítima com um soco e pegou a mochila. Segundo a polícia, o assaltante estaria sobre efeito de drogas.