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Furtos, brigas, trânsito e falta de banheiros marcam bloco da Bola Preta

Dezenas de ocorrências foram registradas na 5ª DP

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Para quem já está acostumado a frequentar os blocos de rua no Rio de Janeiro, a largada oficial do carnaval 2014 começou do jeito que o povo conhece: com desordem e falta de infraestrutura. Furtos em meio ao empurra-empurra da multidão, falta de banheiros químicos e diversas brigas: foi assim o clima no desfile do bloco mais tradicional da cidade, o Cordão da Bola Preta. Segundo a Riotur, 1 milhão e 300 pessoas lotaram a Avenida Rio Branco e suas adjacentes para prestigiar os 96 anos do bloco e os 449 anos da cidade, tema do Cordão da Bola Preta deste ano.

Embalados pelo som das músicas de Tim Maia, marchinhas tradicionais de carnaval de rua e sambas-enredo das principais escolas de samba do grupo especial, o bloco mais uma vez fez jus a sua fama. Contudo, para alguns foliões o clima não era de alegria.

>> Trânsito no Rio não dá trégua nem para o Cordão da Bola Preta

Na altura da Rua da Carioca, uma briga entre dois rapazes gerou um enorme tumulto. Uma mulher tentou separar os dois e acabou também sendo agredida por um deles. Um casal que estava próximo à confusão, com uma criança de 6 anos, entrou em desespero. A criança começou a chorar e o pai não sabia para onde correr. Foi então que os agentes de apoio do cordão de isolamento dispersaram os brigões e refugiaram a família dentro da ala especial de membros do bloco.

Para Isabele da Silva, de 31 anos, mãe da menininha, essa foi a última vez que a família se arriscou trazendo sua filha para um bloco. “Viemos pular carnaval achando que haveria alguma infraestrutura que suportasse o número de pessoas nesse desfile. Mas o que vemos aqui é o descaso com o folião. Não há segurança para trazermos nossos filhos pequenos. Ela [criança] está assustada. Seguiremos o bloco dentro do cordão de isolamento até a Cinelândia, pois não há condições de enfrentar essa multidão e as constantes brigas”, explicou.

Pelo alto-falante, membros do Cordão da Bola Preta tentavam amenizar a situação. “Aqui é um desfile de seres humanos, animais têm que ir para casa. Queremos paz nesse carnaval, nada de brigas”, afirmou um representante.

A aposentada de 61 anos, Ângela Quaresma, que há quatro anos desfila no Cordão da Bola Preta, também criticou a infraestrutura da cidade e as atuais ações do prefeito Eduardo Paes sobre o caos no trânsito do Rio. “Ele [prefeito] mandou os cariocas viajarem para desafogar a cidade. Mas ele só esqueceu que somos nós que moramos aqui, logo nós temos que ser a prioridade dele e não os turistas. Ele quer a cidade confortável para receber os estrangeiros, e nós? Eu sou carioca e não abro mão do meu carnaval para gringo ficar no meu lugar”, exclamou.

Enquanto alguns foliões constatavam a ineficiência da prefeitura no feriado carioca, outros optaram por não pensar nos problemas estruturais e curtir a folia. Um grupo de aproximadamente 40 amigos, por exemplo, se fantasiou de “homem das cavernas”. Corpo pintado de graxa, perucas com cabelos enrolados e tangas como roupas, foi assim que o grupo desfilou no Cordão da Bola Preta. Para a foliã Ana Santos, de 26 anos, a criatividade serviu para beneficiar o grupo no trajeto de Bangu, na Zona Oeste, até o Centro da cidade. “Pegamos o trem para fugir do trânsito e, como estamos lambuzados de graxa, ninguém se aproximou para não se sujar. Foi a viagem mais tranquila que já fizemos. Já desfilamos há 10 anos assim no Bola Preta e pretendemos continuar com essa marca registrada, assim evitamos confusões e coletivos lotados”, brincou.

Outro grupo, dessa vez vestidos de jogadores de futebol da seleção brasileira, aproveitaram o ano da Copa do Mundo no país para entrar no clima. Segundo Alexandre Wackr, de 43 anos, um dos membros dos "brasileirinhos", a falta de infraestrutura dispersou boa parte do grupo de amigos, que até no ano passado chegava a 60 foliões. "Hoje nosso grupo conta com 40 amigos. Muitos desistiram de desfilar em blocos de rua pelo desconforto que passamos, por falta de banheiro e segurança", explicou o folião.

Já no quesito banheiros químicos, que sempre é criticado pelos foliões por não comportar a demanda de pessoas, a prefeitura ganhou nota zero, segundo Cairá Thais, de 37 anos. A técnica de enfermagem ficou meia hora na fila de um banheiro químico privado, que cobrava R$ 2 pelo uso, já que os públicos estavam com filas gigantescas. “Entre perder a diversão do bloco inteiro na fila do banheiro, eu prefiro pagar e curtir meu carnaval”, explicou Thais.

Contudo, dez minutos após esta entrevista, o comércio no banheiro químico privado foi interditado por uma guarda municipal, que alegou que esse tipo de prática era ilegal. O dinheiro dos clientes que estavam na fila foi devolvido e os proprietários tiveram que encerrar o serviço.

Para um dos donos do banheiro químico privado, Bruno Leonardo, de 32 anos, esse tipo de serviço é apenas mais um comércio ambulante, como qualquer outro presente na Avenida Almirante Barroso. “Aqui tem tantas pessoas vendendo comida, bebida, nós estamos vendendo um serviço. Não temos culpa se estamos ganhando dinheiro pela ineficiência da prefeitura, mas vamos acatar as ordens para não gerar problemas”, explicou o comerciante.

Já na porta da 5ª Delegacia de Polícia (DP), na Lapa, mais de 50 pessoas estavam na fila para prestar queixa de furtos e roubos durante o bloco. De acordo com o morador da Ilha do Governador, Alexandre da Silva, de 21 anos, a volta para casa ficou por conta das amigas que o acompanhavam. “No meio do empurra-empurra, grupos mal intencionados aproveitam a confusão para roubar tudo. Levaram minha carteira, com todos os documentos e dinheiro, além do meu celular”, disse.

Já para as recém-amigas Taykne Andrade, de 29 anos, e Joana Dark, de 50 anos, que se conheceram na porta da delegacia, o bloco não serviu para diversão, apenas dor de cabeça. “Nos conhecemos aqui na fila da DP. Nossos maridos foram assaltados da mesma forma. Os bandidos rasgaram o bolso das bermudas deles e levaram tudo”, explicou  uma das esposas.

Segundo o inspetor da 5ª DP, Francisco Soares, até as 13h, 62 ocorrências foram registradas por foliões do Cordão da Bola Preta. “O bloco acabou de terminar. Quando o público dispersar mesmo que a situação aqui na delegacia vai piorar. No ano passado, 200 ocorrências foram registradas só pelo público deste bloco”, afirmou.

* Do projeto de estágio do Jornal do Brasil