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Ex-presidente da Funai quer Museu do Índio em pé

Tribo Maracanã, que habitou e construiu imóvel, deu nome ao rio e estádio

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Ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) e autor de diversos livros e estudos sobre a questão indigenista brasileira, o antropólogo Mércio Gomes entrou na briga em defesa do antigo prédio do Museu do Índio, vizinho do Maracanã. Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ele destacou a importância do imóvel, 'que exalta e exulta o indianismo do Brasil'. 

Segundo o professor, que elaborou um laudo antropológico sobre o imóvel (O reconhecimento do valor do “Museu do Índio”para os índios que vivem no Rio de Janeiro), o governador Sergio Cabral, "que decidiu pela demolição do prédio com explicação fajuta", demostrou "alta de sentimento e conhecimento histórico".

"Aquele prédio, erguido em 1862, é o alicerce do indianismo rondoniano. Marechal Rondon recebia os índios ali. Naquele local o indianismo começou a ser pensado", lembrou Mércio, que visitará os índios na próxima segunda-feira (22/10). "Ao decidir pela demolição, o governador evidencia sua falta de sentimento histórico e de lealdade com os índios. Esta é a falta de patriotismo mais profunda".

Amigo pessoal de Darcy Ribeiro, que completaria 90 anos no próximo dia 26, Mércio, num exercício de imaginação, disse que com o político e antropólogo vivo, a situação do Museu do Índio seria outra.

"Darcy era amigo de Dilma Rousseff e Aldo Rebelo. Ficaria pu... da vida com a possibilidade de demolição", afirmou o antropólogo. "Inclusive, enviei uma carta para Rebelo, relembrando este vínculo e destacando a importância daquele prédio. Infelizmente, não recebi resposta até o momento".

Além da importância histórica do prédio, Mércio destacou a função atual do imóvel. O antropólogo também sugeriu possíveis destinações e alternativas para o espaço, onde pretende fazer o lançamento de seu próximo livro Índios e o Brasil, da editora Vozes.

"Desde o século retrasado aquilo é a porta de entrada para índios que vêm viver no meio urbano. É o porto seguro, onde mantêm viva sua cultura", disse. "Por quê em vez de demolir, não transformar o imóvel em um centro de cultura indígena? A cultura indígena é uma marca do Brasil, atrai milhões de pessoas em todo o mundo. Seria uma grandiosa atração para torcedores e turistas da Copa do Mundo e das Olimpíadas. Melhor do que dar ingresso de graça, é criar essa instituição que prorporcione dignidade aos índios que vivem no Rio".

Ainda sobre Darcy Riibeiro, Mércio lembrou de uma história contada pelo amigo. 'Leigo e avoado' em relação ao futebol, o ex-senador pelo Rio de Janeiro estava no prédio do Museu do Índio no dia mais triste da historia do futebol brasileiro."O Maracanã foi construído sob olhares dos índios", disse. "Darcy contava que estava reunido com índios no prédio quando uma multidão aos prantos começou a passar. O maracanazzo aconteceu diante dele e dos índios, que não sabiam o que acontecia", contou, referindo-se à derrota brasileira para os uruguaios na Copa do Mundo 1950.

História do prédio

O prédio é um imóvel centenário que foi sede do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), criado pelo Marechal Rondon, e deu origem à Fundação Nacional do Índio (Funai). Mais tarde, o prédio histórico abrigou, também, a primeira sede do Museu do Índio, fundado por Darcy Ribeiro, posteriormente transferido para Botafogo. No entanto, como não foi tombado por nenhum órgão, embora todos reconheçam o seu raro valor tanto para a história quanto para a cultura indígena e da cidade do Rio de Janeiro, o local encontra-se hoje em ruínas.

Desde 2006 o imóvel está ocupado por índios de diversas etnias. Segundo eles, a "Aldeia Maracanã" tornou-se uma referência nacional para o indígena que chega à cidade. Os cerca de vinte índios, que moram na área onde construíram casas de barro e ocas, reivindicam a criação no local de um pólo de cultura para a preservação dos usos, tradições e costumes do povo indígena.

A manutenção do edifício é importante para eles, não só pela sua relação histórica com os índios, mas também por ter sido construído e habitado pela tribo Maracanã, que dá nome ao rio que passa nas imediações e ao estádio, cuja reforma pode vir a ser a causa da expulsão definitiva dos indígenas.