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Há um século, muitas mãos e projetos ergueram o novo Patrimônio Mundial

Aterro do Flamengo teve participação do prefeito Pereira Passos a Burle Marx

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Não é de hoje que a cidade do Rio de Janeiro se prepara para ganhar o título de Patrimônio Mundial pela Unesco. Para se chegar às belas paisagens do Aterro do Flamengo, ao calçadão da praia de Copacabana e às modificações no Forte, localizado no Posto 6, na Zona Sul do Rio, foram necessárias diversas intervenções urbanísticas, algumas das quais iniciadas há mais de um século, entre 1902 e 1906, no governo do prefeito Pereira Passos.

O então prefeito foi influenciado por uma viagem a Paris, onde se encantou com a arquitetura da cidade de responsabilidade do engenheiro Haussmann. Pereira Passos decidiu derrubar o morro do Castelo e abrir grandes avenidas cortando o centro da cidade, da Praça Mauá à Avenida Beira Mar; surgiu a Avenida Central, hoje Rio Branco. Mais tarde, em 1950, houve o aterro da orla da Baía de Guanabara, na área que abrange o Aeroporto Santos Dumont e a enseada de Botafogo.

São do mesmo período os projetos de urbanização da área, criando um parque. Mas eles só foram ser desenvolvidos no governo de Carlos Lacerda (1961 - 1965), com o secretário de Obras, o engenheiro civil Enaldo Cravo Peixoto. Affonso Reidy e Burle Marx como responsáveis pela arquitetura e paisagismo do Aterro do Flamengo, logo, foi nas pranchetas deles que começou a ser desenhado o título agora concedido pela Unesco.

O aterro tinha como objetivo resolver o problema viário no Rio de Janeiro, evitando desapropriações para abrir novas avenidas.

- A ideia era tomar áreas do mar para facilitar a circulação. São projetos que seguem uma visão modernista - conta o vice-presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil, Pedro da Luz, lembrando ainda que a realização da construção do parque de sete quilômetros de extensão e 1.301.306 metros quadrados teve participação da arquiteta Lotta Macedo Soares.

Para o doutor em Urbanismo, Pedro da Luz, a vista atual do parque apreciada por cariocas e turistas se confunde com uma paisagem natural. Para obter esse resultado, restos do morro Santo Antônio foram jogados ao mar, formando o aterro e as Praia do Flamengo e parte da enseada de Botafogo. Do morro foram preservados a igreja e o mosteiro de Santo Antônio Na área em que foi devastado localiza-se o Largo da Carioca.

- São áreas que hoje em dia o carioca enxerga como uma paisagem nartural, mas tanto o Aterro como o calçadão são frutos de intervenções humanas.

Por combinarem bem, Luz lembra que “muitas vezes a autoria do projeto é deixada de lado. Estamos perdendo o protagonismo do projeto”, destaca o arquiteto que defende ainda a importância da visibilidade, apresentação e debate com a sociedade destas espécies de intervenções.

“São projetos que precisam ser debatidos na cidade, principalmente no ponto de vista dos custos e benefícios para a população”, diz, citando dois casos atuais e conhecidos: o Projeto Porto Maravilha, que mereceu ampla discussão, e a reforma do Maracanã, sem qualquer debate.

Calçadão de Copacabana

Quem hoje vê o calçadão com quiosques e ocupando o cargo de cartão postal da cidade nem imagina que o cenário há algumas décadas não contava nem com uma calçada. A nova paisagem de Copacabana teve sua obra concluída em 1970 após diversas intervenções.

As pedras que formam o desenho de ondas em preto e branco surgiram em Portugal criadas por um oficial que queria dar trabalho para os presos. O historiador Milton Teixeira conta que nesta época surgiu a profissão de calceteiros. As primeiras calçadas no Brasil compostas pela calcita branca e pelo basalto negro foram da Avenida Central em 1905.

O bairro de Copacabana só ganhou calçadas em 1919 quando a Avenida Atlântica, construída em 1908, com quatro metros de largura, foi ampliada. Os desenhos em formato de ondas eram idênticos aos que existem em Lisboa, chamado de "mar largo". Segundo o historiador, o símbolo significa as ondas do mar e as cores que são as principais etnias que formam o povo brasileiro.

- Copacabana é um caos organizado. É um lugar maravilhoso, pois a praia é um espaço muito democrático. Antes das intervenções o acesso a todos era complicado. Até então, era restrito e limitado e, depois, Copacabana possibilitou o banho de mar para todos, criando uma relação íntima com os cariocas. Com certeza a intervenção humana foi importante nessa região – afirma Teixeira.

A obra final aconteceu em 1969, após a região sofrer com ressacas. Coube ao paisagista Burle Marx o novo desenho da Princezinha do Mar. Na calçada da praia foi mantida a imagem “mar largo”, nas calçadas centrais que dividem as pistas e nas localizadas junto aos prédios foram projetados desenhos abstratos. O objetivo é que o mosaico fosse visto pelos aviões que chegam ao Rio.

- A obra de Copacabana foi complicada, pois as ressacas eram recorrentes. Elas atingiam o novo calcadão, que na época nem tinha essa generosidade (tamanho) toda. Após o alargamento, que mudou inclusive o mar, as ressacas deixaram de afetar a calçada e foi construído um corredor de esgoto. Além do embelezamento, ganhamos outros benefícios - lembra o vice-presidente do IAB, Pedro da Luz.

Localizado na mesma praia, o Forte de Copacabana mudou completamente sua arquitetura desde que foi construído. Da obra original restaram apenas os canhões e a imagem de Nossa Senhora de Copacabana, transferida para a Igreja da Ressurreição. A santa ficava na capela do Forte construída em sua homenagem.