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Brechas na lei podem dificultar punição de responsáveis por desabamento no Rio

Comissão criada pelo Clube de Engenharia enviará projetos para a Câmara dos Vereadores

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O desabamento do Edifício LIberdade e de outros dois prédios, no Centro do Rio de Janeiro, pode terminar em pizza. Graças ao limbo legislativo que regula a execução de obras em edifícios, pode haver dificuldade em responsabilizar criminalmente uma pessoa ou empresa pelo acidente. A conclusão é do engenheiro Manoel Lapa, que chefia a comissão formada pelo Clube de Engenharia para avaliar os desmoronamentos. O incidente matou 23 pessoas. 

De acordo com o especialista, a lei hoje não obriga uma pessoa a contratar um engenheiro para realizar obras internas num prédio. Além disso, nenhum órgão público requer das construtoras as plantas estruturais de prédios em construção. O documento é o único que indica a localização dos pilares estruturais, responsáveis por sustentar as construções. A ausência de um profissional especializado e de uma planta que forneça as informações estruturais tornam a execução de qualquer reforma uma roleta russa. 

"Nós procuramos, mas não achamos a planta estrutural do Edifício Capital, que seria fundamental para apontar a causa exata do acidente. Estamos descobrindo mais detalhes sobre o prédio nos escombros", disse Manoel Lapa, que vê dificuldade na responsabilização criminal pelo acidente. "A polícia tem meios de fazê-lo, mas realmente é difícil. O que a minha experiência nesta área diz é que a verdade sempre aparece". 

O engenheiro Gilberto do Valle, que também integra a comissão que investiga o incidente, disse que a falta de dados torna impossível a conclusão de um relatório bem baseado a respeito do desabamento. 

"Não há plantas estruturais disponíveis, e o prédio inteiro veio abaixo. Não há nenhum dado que possibilite fazer um laudo bem baseado. Mesmo se aparecesse uma testemunha com informações a respeito do prédio, um juiz não poderia se basear inteiramente no relato dela para julgar o caso", apontou Gilberto. "Há uns 70 anos, a apresentação de uma planta estrutural do prédio em construção era obrigatória. Hoje, não é mais". 

Apesar de ainda não ter chegado a uma conclusão definitiva a respeito do incidente, a comissão aponta uma intervenção em um dos pilares estruturais como a causa mais provável do desabamento. A maneira como o prédio desabou e os relatos de testemunhas corroboram para essa teoria. 

"Ao atingir um pilar estrutural, a área dele que sustenta o edifício fica menor. Quando isso acontece, o pilar pode ceder de uma hora para a outra, e o barulho é semelhante ao de uma explosão, como a que algumas testemunhas relataram", explicou Manoel Lapa. "E um prédio não cai de uma hora para outra por problemas estruturais, especialmente os mais antigos. Se um edifício não cai nos primeiros anos após a sua construção, as chances disso acontecer são mínimas, só se alguma intervenção abalar sua estrutura. É o que nós acreditamos que aconteceu". 

Projetos de lei

A Comissão formada pelo Clube de Engenharia para avaliar o desmoronamento dos prédios na Cinelândia enviou à Câmara dos Vereadores o primeiro de três projetos de lei que contemplam a fiscalização de obras no município. A primeira sugestão da entidade é a obtenção de uma certificação de inspeção predial a cada cinco anos. O certificado poderia ser fornecido por um engenheiro ou empresa registrados no Conselho Regional de Engenharia (Crea-RJ). 

Os outros dois projetos de lei que a entidade deve enviar nos próximos dias pedirão a obrigação de contratar engenheiros para realizar obras internas em edifícios e a criação de um banco de dados digitalizado com as plantas estruturais dos construções do município. 

"De 2002 para cá, caíram quatro prédios no Rio de Janeiro. Essas pessoas não podem morrer em vão. Só no último acidente, foram 23 vítimas", protestou Lapa.