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Criador do Museu de Inhotim é condenado por lavagem de dinheiro

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O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) obteve a condenação do empresário Bernardo de Mello Paz e de sua irmã Virgínia de Mello Paz pelo crime de lavagem de dinheiro. Bernardo Paz foi condenado a 9 anos e 3 meses de prisão, em regime fechado; Virgínia, a 5 anos e 3 meses, em regime semiaberto.

Até 2010, o empresário era o proprietário do conglomerado Itaminas, composto por 29 empresas, a maioria na área de mineração e siderurgia. Naquele ano, o grupo foi vendido para uma empresa estrangeira.

Na denúncia oferecida no ano de 2013, cujo teor foi confirmado agora por sentença, o MPF afirmou que, entre 2007 e 2008, Bernardo e Virgínia Paz praticaram lavagem de ativos de suas empresas, dissimulando a origem e a natureza de recursos provenientes da sonegação de contribuições previdenciárias.

Conforme reconheceu a sentença a partir da documentação encaminhada pela Receita Federal e pela Procuradoria da Fazenda Nacional, o comportamento habitual de Bernardo Paz era o de "não cumprimento de obrigações fiscais e previdenciárias, revelando completo descaso das empresas em relação ao Fisco", com dívidas milionárias inscritas em dívida ativa, algumas já em fase de execução à época dos fatos.

Naquele período, segundo relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, foram detectadas movimentações irregulares, efetuadas especialmente pela BMP Participação e Empreendimentos – que era a controladora de todas as empresas que compunham o grupo Itaminas - e pela Horizontes.

Ilhas Virgens - A Horizontes foi criada por Bernardo Paz com a finalidade de manter o Instituto Cultural Inhotim a partir de doações de suas outras empresas. Ocorre que a maior acionista da Horizontes, a Vine Hill Financial Corp, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, é uma empresa cujo endereço é o mesmo de diversas pessoas físicas e jurídicas acusadas de cometer crimes de lavagem de dinheiro.

Entre 2007 e 2008, a Horizontes recebeu o valor total de US$ 98,5 milhões de um fundo denominado Flamingo Investiment Fund, sediado nas Ilhas Cayman.

Esses valores foram recebidos a título de doações e/ou empréstimos para o Instituto Cultural Inhotim, mas logo depois foram repassados, de diversas formas, "para o pagamento dos mais variados compromissos de empresas de propriedade de Bernardo de Mello Paz, tendo sido constatados diversos saques em espécie nas contas do grupo sem que se pudesse identificar o destino final dos valores", relata a sentença, acrescentando que "ficou claramente constatada existência de enorme confusão patrimonial e contábil entre as diversas empresas do Grupo Itaminas. Tanto Bernardo de Mello Paz, (...) quanto as testemunhas de defesa, por diversas vezes, afirmaram que todos os compromissos das empresas do grupo eram pagos com dinheiro oriundo da BMP Participação, pois evitava-se a utilização de contas correntes em nome próprio das pessoas jurídicas do Grupo, a fim de impedir eventual bloqueio judicial de valores devido ao não pagamento de obrigações fiscais, trabalhistas etc.".

Ainda segundo a sentença, ficou demonstrado que "a conta da Horizontes S/C não visava unicamente à manutenção do Instituto Cultural Inhotim, mas também servia de conta intermediária para diversos repasses às empresas do Grupo Itaminas".

Operações dissimuladas - Com relação aos saques em espécie, na boca do caixa, foi apurado que as pessoas que sacaram os valores o fizeram a pedido de Bernardo Paz. Para o Juízo Federal, tais operações, "longe de configurarem uma simples retirada em espécie, foram verdadeiras operações financeiras dissimuladas, visando induzir a erro no tocante ao destino final dos valores, já que o beneficiário de tudo foi Bernardo de Mello Paz".

O Juízo Federal reconheceu que a sistemática era a prática de sonegação previdenciária, "seguida da ocultação e dissimulação dos valores, que retornavam através de transferências oriundas de paraíso fiscal à conta da Horizontes, que, por sua vez, repassava à BMP Participação, e esta última pulverizava os valores entre todas as empresas do Grupo Itaminas, inclusive sendo destinadas a repasses em espécie a Bernardo de Mello Paz".

Com relação ao empresário, a sentença registra que, "na qualidade de principal acionista e proprietário das empresas do Grupo Itaminas, era a pessoa que possuía o poder decisório e o total controle sobre os negócios das empresas do grupo".

Também não há dúvida da culpa de Virgínia Paz na dissimulação dos valores vindos do exterior. Lembrando que "não se pode conceber que uma movimentação financeira, a qual chegou a 1.419% acima da renda declarada, tenha passado desapercebidamente pela ré", o Juízo da 4ª Vara Federal considerou que “(...) ainda que possuindo participação societária menor, caberia à ré tomar conhecimento, regularmente, da situação da empresa em que é sócia. Além disso, a ré prestou-se a efetuar todos os pagamentos relativos ao Museu de Inhotim em sua conta pessoal, sabendo que tais transações eram oriundas da empresa Horizontes Ltda, chamando para si a confusão patrimonial e ajudando na dispersão dos ativos”.

Recurso – O MPF também havia denunciado Gustavo Luis Kahey Machado, Marco Túlio Kahey Machado e Leila Kahey Machado, responsáveis na época pelo Posto Divino Padrão Ltda, pessoa jurídica que também recebeu dinheiro das empresas de Bernardo Paz.

A Justiça Federal, no entanto, absolveu os acusados, por considerar que não houve comprovação de que as transferências efetuadas entre a BMP e o Posto Divino Padrão, embora vultosas, tenham tido conexão com a lavagem de dinheiro proveniente da sonegação previdenciária.

O MPF recorreu da absolvição, alegando que o posto era um dos maiores beneficiários de depósitos provenientes da BMP, e que, de acordo com o Coaf, apresentou movimentação financeira incompatível com suas atividades e negócios normais. Gustavo e seu irmão Marco Túlio teriam aceito cheques, em elevadíssimos valores, de caminhoneiros a serviço das siderúrgicas do Grupo Itaminas, os quais eram descontados, com o pagamento em espécie de valores a título de "troco".

O Ministério Público Federal também pediu o aumento das penas impostas a Bernardo e Virgínia, pois “os sentenciados tinham plena consciência da ilicitude de seus atos, caracterizados por grande reprovabilidade, especialmente pelo meio e pela repercussão que teve o crime, pela complexidade e alto vulto dos valores movimentados”.