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'Financial Times': Segurança privada do Brasil está na linha de fogo 

Jornal diz que precisa reforçar cultura de treinamento e apoio a estes profissionais

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Matéria publicada nesta quinta-feira (14) pelo Financial Times fala sobre a fragilidade do setor de segurança privada do Brasil.

Segundo a reportagem, nas primeiras horas da manhã de abril, moradores de Ciudad del Este, uma cidade na fronteira do Paraguai com o Brasil, despertaram com o som de um tiroteio e alarmes de carro. Em uma cena digna de Hollywood, uma gangue criminosa estava atacando um depósito de caminhões blindados pertencentes à Prosegur, uma empresa de segurança espanhola, usando explosivos e rifles de alto calibre. Depois de render os guardas, os ladrões cavaram um buraco no edifício com dinamite e invadiram os cofres, enquanto outros incendiavam carros nas estradas próximas para bloquear a polícia. Eles escaparam com US$ 40 milhões no que a mídia brasileira informou que foi o maior assalto na história do Paraguai, listando uma série de ataques de estilo militar contra caminhões e depósitos de segurança por gangues que operam no Brasil nos últimos dois anos.

O Times destaca que a grandiosidade e a violência desse ataque demonstarm o desafio que as empresas de segurança do setor privado enfrentam no Brasil. Em um país em que o assalto à mão armada é comum, os guardas de segurança privados enfrentam uma ameaça constante. Isso faz com que manter uma força de trabalho mental e fisicamente saudável e motivada seja uma prioridade particular para seus empregadores.

"Nossa atividade é de alto risco. É uma atividade altamente perigosa em que, em qualquer momento, você pode levar uma bala ", diz Mário Baptista de Oliveira, chefe do Grupo Protege, um concorrente da Prosegur. "Eles [nossa equipe] sabem disso".

Não há estatísticas nacionais disponíveis sobre assalto à mão armada, mas o Brasil tem uma das maiores taxas de homicídio no mundo, cerca de 29 por 100.000 pessoas em 2015, ou mais de 59.000 mortes. Os países usam critérios diferentes para compilar suas taxas de homicídio, mas para dar a esse número algum contexto, isso excede em muito os 4.9 assassinatos por 100.000 relatados nos EUA no mesmo ano, informa o Financial Times.

Embora grande parte dessa violência ocorra entre a chamada polícia militar do país - os oficiais de primeira linha encarregados de manter a lei e a ordem nas ruas - e as gangues de drogas, os guardas de segurança privados também estão na linha do fogo na guerra contra crime.

Ao longo dos últimos dois anos, ocorreram incursões semelhantes em grande escala em empresas de caminhões de segurança em Campinas, um importante centro industrial e tecnológico a cerca de uma hora de São Paulo, bem como nas proximidades de Santos, o maior porto da América do Sul e em Ribeirão Preto, capital da cana-de-açúcar no Brasil.

Mas os agentes privados de segurança estão constantemente sendo atacados em assaltos menores, às vezes em seus depósitos ou ao deixar as instalações dos clientes, ou mesmo enquanto dirigem as auto-estradas em plena luz do dia. Tais ataques podem ter um efeito devastador sobre os funcionários, tornando-os incapazes de trabalhar, de acordo com os sindicatos dos trabalhadores de segurança privados. Um membro do sindicato, Luiz Cláudio Antônio dos Santos, descreve um incidente no qual foi baleado enquanto dirigia uma unidade de escolta armada na Linha Vermelha. A rodovia, que liga o Rio de Janeiro ao seu aeroporto internacional, passa entre as favelas administradas por bandos de drogas e tornou-se tão notória por ataques que foi apelidada de "estrada da morte".

Para preparar os funcionários para uma profissão de alto risco, grandes empresas de segurança privada dizem que são rigorosas em relação ao recrutamento e oferecem aos funcionários cuidadosamente selecionados treinamento e benefícios generosos.

No Brasil, aqueles que desejam entrar no setor de segurança devem primeiro pagar seu próprio bolso para um treinamento obrigatório de segurança que é certificado pela polícia federal. A Protege possui uma rede de escolas que representam a metade daqueles treinados na cidade de São Paulo, de acordo com Baptista de Oliveira.

O treinamento é fornecido para funcionários em todos os níveis, de porteiros para guardas armados. Para aqueles que trabalham em veículos blindados, há treinamento adicional em segurança pessoal e técnicas de condução defensiva. "Isto significa, por natureza, que nossos recrutas não são apenas aquele cara que estava em uma extremidade solta fora e não tinha outras opções do que trabalhar em segurança", diz Baptista de Oliveira.

Outro aspecto crítico para as empresas de segurança é desenvolver uma cultura forte para que os funcionários compreendam o que se espera deles em qualquer situação, desde a disciplina operacional ao trabalhar no campo até a integridade pessoal. Vera Lúcia Tavares, diretora de recursos humanos da Brink's Brasil, um braço da empresa de segurança com sede nos EUA, diz que a empresa examina a equipe anualmente para verificar "seu compromisso com os valores da organização".

Na Protege, todos os funcionários, desde limpadores até gerentes, devem completar um curso de abertura sobre a integração na empresa. "Nenhum novo funcionário receberá uma passagem de entrada [para o portão da frente] até completar o módulo de integração obrigatório. A partir disso, o trabalhador conhecerá as regras, o histórico do grupo, os clientes do grupo e mais sobre o cargo para o qual ele ou ela foi contratado ", diz Baptista de Oliveira, acrescentando que existem mais de 100 módulos que os funcionários podem completar como suas carreiras progridem.

Fundada pelo pai de Baptista de Oliveira há 46 anos, a Protege hoje tem 18 mil funcionários espalhados por todo o Brasil. A empresa fez esforços para dar aos funcionários e suas famílias um senso de pertença, ajudando a manter o volume de negócios reduzido e a manter uma força de trabalho motivada.

A chave para isso é a seção de "desenvolvimento pessoal" da empresa, uma equipe de 20 pessoas que dirigem programas nas áreas residenciais dos empregados para promover habilidades entre os cônjuges dos trabalhadores e seus filhos. "Reunimos as salas de aula para promover a inclusão digital, ensinando-lhes [crianças de pessoal] como usar o Excel e o PowerPoint e similares", diz Baptista de Oliveira.

Quando um evento traumático, como um assalto ocorre, Protege e Brink dizem que têm psicólogos na mão para ajudar os funcionários e suas famílias a lidar. A importância de tais intervenções não pode ser subestimada.

Santos, o guarda armado disparado no Rio, diz: "O colega que estava comigo [durante o ataque] ainda está sofrendo psicologicamente. Eu também. Ainda estou traumatizado hoje. Se eu ouvir qualquer tipo de toque de som, acho que é um tiro. Fico ali colado no local, incapaz de me mover. "

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