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Estatal mineira cobra família de Aécio por obra feita na gestão do tucano

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Um relatório da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), obtido pela Folha de S. Paulo, aponta que uma obra em rede de energia elétrica que corta uma fazenda da família do senador Aécio Neves (PSDB) foi realizada quando o tucano era governador, sem cobrar os R$ 240 mil (avaliados na época) ao proprietário. Regras da estatal também teriam sido descumpridas. 

O documento é assinado por Eduardo Ferreira, superintendente de Auditoria Interna da Cemig. Ele trata de mudança no traçado da linha de distribuição de energia Cláudio/Carmópolis entre as torres 18 e 22, em 2007.

"Após a realização de apurações detalhadas e do levantamento de toda a documentação, foi averiguada pela auditoria uma falha de procedimento nessa obra, pois os proprietários não chegaram a ser cobrados pelo seu valor, apesar de serem responsáveis pela execução do desvio", disse a Cemig em nota à Folha.

Quando a obra foi feita, a Cemig era presidida por Djalma Morais, aliado do senador. A partir de setembro de 2015, a estatal passou a cobrar pela obra não paga. Na semana passada, a família do tucano pagou R$ 417 mil à vista para a empresa, em valores reajustados, conforme o recomendado pelo departamento jurídico da estatal. 

O valor foi pago, segundo a assessoria de Aécio, apenas para não haver "uso político" do caso. A família não reconhece a legalidade da cobrança.

Veja nota da assessoria do senador Aécio Neves em resposta à reportagem:

Em relação à matéria publicada pela Folha de S. Paulo, informamos que a fazenda, propriedade da família do senador Aécio Neves há mais de 100 anos, pertence ao espólio de D. Risoleta Neves, cujos herdeiros são seus três filhos. A CEMIG é uma empresa reconhecida por seu profissionalismo e adequação às normas que regem empresas de capital aberto. O governador Aécio Neves jamais interferiu em qualquer de suas decisões técnicas, assim como não participa da administração da fazenda.

O procedimento realizado na linha de distribuição entre os municípios de Cláudio e Carmópolis de Minas, que passa pela fazenda pertencente a familiares do senador há cinco gerações, atendeu ao planejamento da empresa, não tendo sido solicitado pelos proprietários nem tendo sido os mesmos comunicados previamente sobre a realização do serviço.

Da mesma forma, os proprietários nunca foram notificados sobre eventual equívoco na construção de benfeitoria, para que pudessem, inclusive, tomar qualquer providência para corrigi-lo. Para os proprietários, a demolição de uma cerca e de uma pequena construção de alvenaria seria muito mais econômico que o pagamento do valor cobrado pela Cemig.

Os proprietários da fazenda discordam da justificativa apresentada pela Cemig para a cobrança, embora devidamente paga, em razão de:

1 - As benfeitorias – construção de cercas e estábulo - foram feitas muito antes da mudança do trajeto da linha, que fez parte do Plano Emergencial de Obras do Sul e Oeste de Minas Gerais, concluído em fevereiro de 2007 e executado naquele mesmo ano. Se a mudança do trajeto tivesse sido consequência da implantação de benfeitorias, a fiscalização da Cemig teria tomado providências anos antes.

2 - O trajeto da linha de distribuição em questão foi alterado, inclusive, fora dos limites da fazenda, em área distante da localização da benfeitoria mencionada.

3 - A alteração do trajeto da linha da Cemig em nada beneficiou a propriedade, que é cortada também por outra linha pertencente ao governo federal. Pelo contrário, a propriedade continuou prejudicada uma vez que a existência de linhas de energia sempre interfere no planejamento de uso de propriedades rurais.

Sobre a divulgação à imprensa da pendência jurídica existente entre familiares do senador Aécio Neves e a Cemig, registramos que atende exclusivamente a interesse político, uma vez que o processo de cobrança pela estatal transcorria de forma absolutamente regular. 

A divulgação pretende forjar um privilégio político quando ocorreu o contrário: os proprietários da fazenda tiveram chances menores de contestação dos que as dadas a quaisquer outros contribuintes exatamente pelo parentesco que têm com o ex-governador.

A família foi informada da existência da cobrança no final de 2015. Foram estabelecidos diversos contatos com a empresa e, no dia 23 de julho, em reunião, foi acertado que o pagamento seria feito no último dia possível antes da incidência de novos reajustes. Em função do alto valor, o recurso permaneceu aplicado em instituição financeira, sendo que o banco foi avisado semanas antes da data marcada para o resgate.

Mesmo sendo a cobrança questionável do ponto de vista jurídico - o departamento jurídico da empresa deu parecer dizendo que a dívida não poderia ser cobrada judicialmente - os proprietários optaram pelo pagamento do valor cobrado, como forma de evitar a exploração política do fato, reservando-se o direito de avaliar, posteriormente, a possibilidade de requerer judicialmente o ressarcimento do valor pago.

Em resumo, a Cemig identificou uma cobrança contra uma propriedade da família do senador. A família questionou a legitimidade da cobrança uma vez que nunca foi notificada, nem teve a oportunidade de corrigir eventual erro na construção de benfeitoria, o que teria sido muito mais barato. A mudança no trajeto da linha em nada beneficiou a propriedade e fez parte de um conjunto de obras muito maior em toda a região.

O departamento jurídico da empresa atestou que a dívida não poderia ser cobrada judicialmente.  Ainda assim, a família optou pelo pagamento para evitar exploração política do assunto reservando-se o direito de questionar juridicamente a cobrança.